Onda de violência no Equador
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Onda de violência no Equador

Sequestros, invasões e terror generalizado. Na última terça-feira (9), o Equador teve novos episódios de violência extrema, marcados pela invasão a uma universidade em Guayaquil e a uma emissora de TV local por homens armados; ao sequestro de oito pessoas, sendo uma delas um brasileiro; e explosões na província de Esmeraldas. Os ataques fizeram com que o país decretasse Conflito Armado Interno  e o Ministério da Educação suspendesse as aulas até a próxima sexta-feira (12).

A onda de violência que está assolando o território equatoriano não é recente, mas está sendo marcada por episódios "ainda mais intensos", explica a professora de Relações Internacionais da FESPSP e pesquisadora do Observatório de Regionalismo, Flávia Loss de Araujo.

"Eu diria que são várias ondas de violência no país andino nos últimos anos: tivemos o assassinato de 43 presidiários pelo cartel Los Lobos em 2022; o assassinato do prefeito da cidade portuária de Manta, Agustín Intriago, em julho de 2023; em agosto, o então candidato à presidência, Fernando Villavicencio , foi morto pelos Los Lobos. Os episódios deste início de 2024 são ainda mais intensos", explica Araujo.

Em agosto de 2023, o país já começou a sentir sinais do que estaria por vir. Após o anúncio da antecipação das eleições presidenciais, que ocorreria apenas em 2025, devido à dissolução da Assembleia Nacional, o país foi tomado por motins em prisões. 

A situação escalonou até a morte do candidato à presidência, Fernando Villavicencio, às vésperas da votação.  Ele saáa de um comício quando foi morto a tiros à luz do dia.

A "fragilidade do Estado equatoriano" diante de ameaças é um dos pontos ressaltados por Araujo. Segundo a professora, casos como a morte do candidato demostram a falta de "investimentos em segurança pública que permitam a ação preventiva e de inteligência".

"Possivelmente seria possível prevenir e combater essa escalada da violência, mas faltam recursos. Além disso, existem indícios de envolvimento de forças de segurança com os criminosos, situação que agrava ainda mais esse cenário", afirma Araujo.

Disputa territorial

A intensificação dos ataques surgem dois dias após a fuga do líder do grupo Los Choneros — uma das facções criminosas mais temidas no Equador —, José Adofo Macías. Conhecido como Fito, o criminoso foi condenado a 34 anos de prisão em 2011  por crimes como narcotráfico e homicídio. Ele é considerado um dos criminosos mais perigosos do Equador e esta não é a primeira vez que ele foge da cadeia.

Segundo a professora, os últimos ataques em Guayaquil, de autoria do grupo Los Choneros, têm dois objetivos claros: "demonstrar força diante do  presidente Daniel Noboa e disputar espaço com os seus rivais do cartel Los Lobos".

A disputa territorial entre os dois cartéis acaba gerando um cenário de guerra no mundo das drogas. De um lado, temos Los Lobos, que é o braço equatoriano do grande cartel mexicano Jalisco Nueva Generación. Do outro, Los Choneros, que tem laços estreitos com o cartel mexicano Sinaloa.

"Os carteis querem controlar novas rotas de envio da droga para a Europa , negócio extremamente lucrativo. Houve um aumento do consumo de cocaína na Europa e as organizações criminosas estão respondendo a essa demanda."

Caminho do narcotráfico

O território andino tem sido de suma importância para a reorganização do narcotráfico. O caminho percorrido pela droga é a sua saída do México, passando por toda a América Central e desaguando na América do Sul.

"Os cartéis mexicanos encontraram terreno fértil no Equador e transformaram o país andino em um centro de processamento da cocaína e de distribuição para os EUA e a Europa. O Equador possui excelentes condições para essa atividade: baixa repressão das forças de segurança e posição geográfica privilegiada para o escoamento dos entorpecentes para os principais mercados."

Medidas do governo

A situação em que o Equador se encontra é reflexo das recorrentes crises no país. As organizações criminosas acabaram crescendo livremente, resultando no poder que têm atualmente.

"Os equatorianos enfrentaram uma crise política durante o governo de Guillermo Lasso [2021 até novembro de 2023], quando o ex-presidente convocou novas eleições; enfrentaram também uma severa crise sanitária durante a pandemia de Covid-19 e as consequências econômicas disso", exemplifica Araujo.

A mais recente crise acaba deixando o presidente equatoriano, Daniel Noboa, que está há dois meses no cargo, em "uma posição de fragilidade". Em um país em que 4,86 milhões de pessoas vivem na pobreza, com o nível de informalidade no trabalho sendo alta, o presidente acabará tendo "mais dificuldades e menos recursos para lidar com uma crise de segurança pública tão ampla, tendo só 1 ano e 4 meses para dar uma resposta".

Até o momento, o presidente emitiu um decreto de  estado de exceção no Equador, que tem prazo de 60 dias e restringe os direitos dos equatorianos de locomoção (toque de recolher entre às 23h e às 5h), reunião e privacidade de domicílio e de correspondência.

"O decreto autoriza que as forças armadas equatorianas executem operações militares para reestabelecer a ordem . Precisamos acompanhar qual será a estratégia adotada e os recursos mobilizados. Um ponto interessante é que o decreto estabelece que essas operações devem ser executadas respeitando os Direitos Humanos, mas não sabemos como isso será possível", explica a professora da FESPSP.

Papel do Brasil na crise equatoriana

Araujo explica qual o papel que o Brasil deve desempenhar neste momento , uma vez que é o maior país da América do Sul.

"A diplomacia brasileira sinalizou apoio. Essa ação é importante no nível simbólico, mas seria importante algumas ações práticas dos países sul-americanos, como apoio técnico e de inteligência para as forças de segurança equatorianas. Até mesmo dados sobre a atuação dos cartéis e das organizações criminosas são escassos nos países andinos. As reportagens de jornais locais mostram dados imprecisos, muitas vezes, e é difícil ter um panorama da situação e da profundidade da crise", finaliza.

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