Ex-presidente Donald Trump disse que não vai desistir de concorrer à Casa Branca com acusações contra ele
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Ex-presidente Donald Trump disse que não vai desistir de concorrer à Casa Branca com acusações contra ele

ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump se tornou réu pela terceira vez suspeito de tentar reverter os resultados das eleições de 2020, além de ser indiciado por incitar o ataque ao Capitólio, em janeiro do ano seguinte. Apesar das acusações, a legislação norte-americana não apresenta nenhum ponto que impeça alguém que esteja sendo processado ou que já esteja até mesmo condenado de concorrer à Presidência do país.

Já alvo de diversas investigações criminais, em novembro no ano passado, Trump anunciou sua pré-candidatura em um discurso feito de sua mansão em Mar-a-Lago, na Flórida. Em março deste ano, disse a jornalistas que não abandonaria a  corrida presidencial de 2024 mesmo se fosse indiciado em qualquer uma das acusações que enfrenta.

​​Pedro Gurek, advogado especialista em direito penal econômico e sócio do Sade & Gritz Advogados, explica que os requisitos que constam na Constituição dos Estados Unidos para que uma pessoa concorra à Casa Branca "são basicamente que o candidato precisa ter pelo menos 35 anos e ter nascido nos EUA ou residir no país nos últimos 14 anos".

O advogado ainda menciona que, caso, eventualmente, Trump seja condenado, ele não seria o primeiro na história do país a concorrer nas eleições nessa posição. "Isso já aconteceu nos EUA em duas ocasiões: em 1920, com Eugene V. Debs, e em 1992, com Lyndon LaRouche. Esses dois candidatos estavam presos e concorreram normalmente", afirma.

No caso de Debs, à época, com mais de 900 mil votos, ele deixou a cela onde cumpria pena de 10 anos de prisão por ter convocado resistência ao recrutamento compulsório para a Primeira Guerra Mundial dois anos antes. Ele teve a sentença comutada em 1921 e foi solto.

Já LaRouche, havia sido condenado a 15 anos de prisão por sonegação de impostos no fim dos anos 1980, mas concorreu às eleições de 1992 da prisão, angariando mais de 26 mil votos.

Autoperdão

No caso de Trump, Gurek diz que a Constituição norte-americana não deixa claro o que aconteceria caso ele fosse preso e vencesse as eleições.

Pesquisa do  New York Times  mostra Trump e o atual presidente dos EUA, Joe Biden, empatados em intenções de voto para a Casa Branca, com 43% em uma eventual disputa.

Como relatado pelo jornal, logo após as eleições de 2020, Trump sugeriu que deseja se autoperdoar. Fontes informaram ao noticiário que ele pediu a opinião de especialistas para saber se ele teria autoridade para levar a ideia adiante e foi avisado sobre potenciais consequências políticas.

"O artigo II, seção 2 da Constituição norte-americana prevê a possibilidade de ele perdoar terceiros. Esse cenário de ele perdoar a si mesmo é algo controverso, nunca aconteceu e algumas pessoas até questionam se isso seria possível, se é constitucional ou não", explica o advogado.

A possibilidade de essa estratégia ser adotada levantou discussões sobre o assunto no país, inclusive entre pesquisadores. Citando o professor Jonathan Turley, da The George Washington University, Gurek afirma que não teria problema nenhum Trump usar do aparato, porque o texto constitucional fala que ele pode perdoar quem ele quiser e não o limita de, eventualmente, conceder o perdão a si mesmo.

Ex-presidente Donald Trump se tornou réu pela terceira vez na última semana
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Ex-presidente Donald Trump se tornou réu pela terceira vez na última semana

No entanto, de acordo com o professor Laurence Tribe, da Harvard University, a ação seria imoral e ele não poderia ser o juiz da própria causa. "Até porque a Constituição diz que ele não poderia se livrar de um eventual impeachment, então, por comparação, ele também não poderia se autoperdoar de um crime", pontua Gurek.

"Porém, o autoperdão se aplica apenas a crimes de competência federal, não a crimes de competência dos estados. Então, por exemplo, o Trump também está sendo processado criminalmente na Geórgia, ele não poderia eventualmente se autoperdoar em relação a esse processo, caso seja condenado."

No caso de o republicano ser considerado culpado e não ter o poder de conceder o perdão a si mesmo, Gurek explica que não existe uma limitação específica na lei dos EUA que afirme que alguém condenado não possa ser o presidente do país. "Então fica essa questão em aberto: como ele governaria caso fosse condenado e não pudesse se perdoar?"

Suprema Corte

Considerando questões processuais, o advogado acredita que, caso Trump fosse condenado e não fosse permitido conceder o perdão a si mesmo, ele recorreria e adiaria o caso até chegar na Suprema Corte dos Estados Unidos, o mais alto tribunal constitucional do país, que tem maioria conservadora.

Estudo de mais de uma década publicado na PNAS, revista da Academia de Ciências dos Estados Unidos, indica que a corte "tornou-se muito mais conservadora do que o público americano" nos últimos anos.

"A distância entre a Suprema Corte e o público cresceu desde 2020, com o tribunal passando de uma posição bastante próxima do americano médio para uma posição mais conservadora do que a maioria dos americanos", afirma a pesquisa.

Caso seja eleito, Trump pode tentar levar processos à Suprema Corte, de maioria conservadora
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Caso seja eleito, Trump pode tentar levar processos à Suprema Corte, de maioria conservadora

Na possibilidade de uma vitória nas eleições do ano que vem, Trump poderia tentar passar o mandato questionando a condenação até chegar ao tribunal, para que o caso seja julgado pelos membros da corte.

"Como o Direito americano é baseado na Common Law, muitas questões não são codificadas igual aqui no Brasil, que existe lei para tudo. A própria Constituição americana é bem menor que a brasileira. Então lá, muitas vezes se recorre aos precedentes, aos costumes, para se resolver situações que não estão previstas em lei. Por isso se dá uma importância à Suprema Corte, porque essa discussão vai crescendo até chegar lá e os juízes definem qual interpretação que eles darão ao caso."

Outras acusações

Antes desse último caso,  Trump já havia sido indiciado por 37 acusações criminais por manter documentos secretos da Casa Branca em sua residência, na Flórida, após já ter deixado o posto. Ele se  declarou inocente em todas as acusações.

O republicano ainda foi indiciado no caso de um suposto suborno de US$ 130 mil que ele teria pago à atriz pornô Stormy Daniels durante a campanha presidencial em 2016, para esconder um caso extraconjugal que eles estariam tendo na época.

A acusação referente ao Capitólio, porém, tem grande peso para o processo eleitoral, já que é discutida a chance de Trump ter violado a 14ª emenda da Constituição. Segundo Gurek, a emenda trata da possibilidade de "desqualificar ao cargo alguém que, por insurreição ou rebelião, cometer algum crime contra os Estados Unidos".

Isso, no entanto, não o impediria de concorrer nas eleições. "A única limitação que ele teria, caso condenado, é de não poder votar, mas de ser votado e assumir o posto de presidente, não", afirma o advogado.

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