Liz Truss ficou apenas 45 dias no cargo de primeira-ministra
Reprodução: Twitter / @trussliz
Liz Truss ficou apenas 45 dias no cargo de primeira-ministra

A primeira-ministra do Reino Unido , Liz Trussrenunciou na quinta-feira (19) , depois de apenas 45 dias no cargo. Seu governo é o mais curto da história do país. As medidas econômicas propostas por ela foram mal recebidas pelo mercado e afundaram ainda mais o país em uma grave crise, a maior dos últimos 40 anos.

Liz assumiu o governo do Reino Unido alegando que apresentaria um plano econômico para salvar a economia da alta inflação. Desde o início, o plano foi repudiado tanto pelo Partido Trabalhista quanto pelo Partido Conservador, ao qual a primeira-ministra pertence. Ela previa o corte de impostos de cerca de 40 bilhões de libras e, para tapar o buraco das contas públicas, queria fazer um empréstimo, ou seja, endividar o Estado. Os cidadãos britânicos também sofreriam as consequências dessa política.

"No final, quem arcaria com essas contas seriam os trabalhadores", afirma o professor de Relações Internacionais James Onnig, da Facamp (Faculdades de Campinas). "Ao praticamente zerar os impostos, incentiva-se o consumo, mas é preciso pensar sobre como isso seria devolvido em serviços para a sociedade. Você soluciona o problema momentaneamente e a bomba explode depois."

Ao longo dos 45 dias em que esteve à frente do cargo, Liz tentou conter um pouco a crise, recuou em alguns anúncios e, em uma de suas investidas mais recentes, demitiu o ex-ministro das Finanças, Kwasi Kwarteng. O novo ministro que assumiu a função, Jeremy Hunt, criticou o plano de corte de impostos implementado por Liz e Kwarteng e antecipou que alguns impostos deveriam aumentar. No final, a primeira-ministra perdeu força de tal forma que ficou menos importante que os próprios ministros, o que tornou inviável a sua permanência no poder.

Em seu discurso de despedida, Liz falou sobre a crise econômica do Reino Unido e o cenário internacional como forma de justificar o fracasso de seu governo. Ela disse que chegou ao poder "em um momento de grande instabilidade internacional", quando "famílias e empresas estavam preocupadas em como pagar suas contas" e "a guerra ilegal de Putin com a Ucrânia ameaçava a segurança de todo o continente". Além disso, ressaltou que o Reino Unido "ficou para trás por muito tempo, pelo baixo crescimento econômico".

Como o Reino Unido entrou em uma crise tão grave?

Segundo o professor James Onnig, a crise que assola o Reino Unido vem de longa data, desde a época da ex-primeira ministra Margaret Thatcher, que governou o país entre 1979 e 1990. À época, ela adotou medidas que foram consideradas boas por parte dos britânicos, como ter "enxugado" o Estado e diminuído os gastos públicos. Apesar disso, o ritmo de reposição salarial passou a ficar muito menor do que o aumento da produtividade no Reino Unido, o que acabou gerando um grande endividamento do país.

A situação fica ainda mais complicada se analisada do ponto de vista macroeuropeu. Apesar de o Reino Unido fazer parte da União Europeia até pouco tempo atrás, o país não fazia parte da União Econômica e Monetária (UEM) e, portanto, não usava o euro, a mesma moeda que os demais países do bloco. Essa integração "parcial" é também uma das origens dessa crise, para o professor. Mas tudo ficou ainda pior com o Brexit, a saída do Reino Unido da União Europeia.

"Com essa separação, houve um grande isolamento do ponto de vista das rotas comerciais, uma vez que os trabalhadores e comerciantes não podem mais passar livremente pelas fronteiras. Acredito que esse isolamento que o Reino Unido propôs a si mesmo é uma das raízes mais profundas dessa crise", afirma.

Outra questão que levou o Reino Unido à crise, esta mais recente, é o custo da energia, que subiu muito nos últimos meses. Isso porque a Rússia, que declarou guerra contra a Ucrânia, é a principal fornecedora de gás e petróleo para os países europeus. A União Europeia tem um plano de contingência para garantir que não falte gás aos países do bloco, mas agora o Reino Unido não faz mais parte dele e não pode recorrer a essa ajuda.

Onnig lembra que o Reino Unido e outros países exploraram, por muitos anos, o Mar do Norte, uma região rica em petróleo. Após décadas de exploração, no entanto, as bacias começaram a se esgotar e as empresas petrolíferas britânicas resolveram abrir poços em outros lugares do mundo, na esperança de que isso resolveria o problema. Mas não foi isso que aconteceu. Em tempos de crise, como as reservas são poucas, as empresas sobem os preços, o que consequentemente também aumenta o custo de vida dos britânicos.

"O governo britânico não conseguiu saídas financeiras para isso, o endividamento aumentou e a crise financeira no Reino Unido explodiu", diz.

Como o próximo primeiro-ministro será eleito?

O próximo primeiro-ministro será escolhido a partir de uma eleição dentro do partido Conservador, que deve ser concluída até a próxima semana. De acordo com o professor, a oposição, bem como a sociedade civil, quer eleições diretas, mas os conservadores não darão o braço a torcer.

No Reino Unido, a única eleição realizada diretamente é aquela em que os cidadãos votam, a cada cinco anos, para escolher um representante do distrito em que vivem. Esses representantes fazem parte de um grande colegiado que forma o parlamento, composto por duas câmeras: a dos lordes e dos chamados "comuns".

A Câmara dos Lordes é composta majoritariamente por antigos fidalgos, nobres e pessoas com importância dentro do Reino Unido, mas pouco influencia nas questões da sociedade. Os membros da Câmara dos Comuns, por sua vez, são aqueles que efetivamente tomam as decisões e decidirão o próximo primeiro-ministro do país.

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