O secretário de Estado dos Estados Unidos, Antony Blinken, e o secretário de Defesa, Lloyd Austin em reunião com o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, em Kiev
Divulgação/Twitter Lloyd Austin - 25.04.2022
O secretário de Estado dos Estados Unidos, Antony Blinken, e o secretário de Defesa, Lloyd Austin em reunião com o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, em Kiev

Na véspera do Dia da Independência da Ucrânia, e do dia em que a guerra chega à marca de seis meses, autoridades ucranianas estão em alerta para o risco de possíveis ataques russos contra áreas urbanas. O governo dos EUA chegou a emitir um alerta para que todos os cidadãos americanos deixem o país imediatamente.

Através de comunicado emitido pela embaixada dos EUA em Kiev, na manhã desta terça-feira, o Departamento de Estado afirma ter “informações de que a Rússia está fazendo preparativos para lançar ataques contra infraestruturas civis e instalações do governo da Ucrânia nos próximos dias”, e que “ataques russos continuam a ser uma ameaça contínua a civis”.

O alerta também foi feito pelas autoridades ucranianas: em Kiev, atos públicos foram proibidos até quinta-feira, e o toque de recolher mantido entre as 23h e as 5h.

Em tempos de paz, a semana do dia 24 de agosto é marcada por grandes festividades ao redor da Ucrânia, marcando o dia da independência do país em relação à União Soviética, em 1991. Por ser a principal data cívica do país, autoridades acreditam, ao lado das americanas, que ela poderá ser usada pelos russos para uma nova ofensiva contra áreas como Kiev, que vem sendo relativamente poupada nas últimas semanas. A quarta-feira também marcará seis meses do início da invasão russa.

"Devemos estar cientes de que, nesta semana, a Rússia poderá fazer algo particularmente sujo, algo particularmente cruel. Assim é nosso inimigo. Mas em qualquer outra semana ao longo dos últimos seis meses, a Rússia fez as mesmas coisas o tempo todo, foi nojenta e cruel", afirmou, no sábado, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, em pronunciamento à população. "Uma das principais tarefas de nosso inimigo é nos humilhar, desvalorizar nossas capacidades, nossos heróis, espalhar o desespero, o medo e conflitos."

Nesta terça-feira, autoridades pró-Rússia em Donetsk, província parcialmente controlada por Moscou, afirmaram que edifícios da administração local foram atingidos por disparos ucranianos, deixando quatro mortos e 11 feridos. Elas afirmaram que os ataques foram realizados com armas fornecidas pelo Ocidente, que permitem atingir alvos mais distantes e com maior precisão.

'Julgamento espetáculo'

Citada pela Tass, uma representante da autointitulada República Popular de Donetsk, que reivindica o controle da província, com aval de Moscou, afirmou à Tass que o ataque “confirma a necessidade de um tribunal internacional para criminosos de guerra”, sugerindo que julgamentos públicos de forças pró-Kiev devem se multiplicar.

Esse tipo de processo, que por vezes não segue as regras básicas do Direito, como o acesso a defesa ou a garantia de um julgamento imparcial, vem sendo usado pelos separatistas pró-Moscou desde 2014, quando ocuparam partes do território ucranianos, e se repete agora que as forças russas estão no país. Os réus são colocados em jaulas, e raramente podem se pronunciar.

Em junho, dois britânicos e um marroquino foram condenados à morte por um desses tribunais, levando a duras reações internacionais — além do aspecto de propaganda, analistas veem que tais julgamentos também abrem caminho para eventuais trocas de prisioneiros no futuro. Oficialmente, os processos são organizados pelos próprios separatistas, de acordo com seu sistema legal não reconhecido internacionalmente.

Na semana passada, o Ministério da Defesa ucraniano afirmou que mais um desses julgamentos está prestes a acontecer, agora em Mariupol (Donetsk): foram publicadas fotos do que seriam as jaulas destinadas aos prisioneiros, capturados após o fim do cerco à usina siderúrgica Azovstal, um dos episódios mais marcantes da guerra.

“No dia da Independência da Ucrânia [24 de agosto], os ocupantes planejam realizar um julgamento dos defensores capturados de Azovstal, na temporariamente ocupada Mariupol”, afirmou o ministério. O “julgamento” deve acontecer no que restou da Câmara Filarmônica de Mariupol, que estaria sendo “remodelada”, segundo Kiev.

Para a ONU, os julgamentos e a forma como os prisioneiros estão sendo tratados podem constituir, por si só, um crime de guerra.

"Se os prisioneiros de guerra são acusados de um crime, têm direito a garantias processuais e a um julgamento justo", afirmou a porta-voz do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos, Ravina Shamdasani. "Não se pode ditar uma sentença ou castigo contra eles, a menos que isso seja feito por um tribunal imparcial e regularmente constituído."

Ela lembrou que as leis que regem conflitos armados impedem que combatentes sejam processados por terem participado de hostilidades, e também vetam a criação de tribunais dedicados exclusivamente a processos contra prisioneiros de guerra. Shamdasani sugeriu ainda que, caso essa política seja mantida, Moscou poderá ser responsabilizada.

No domingo, Zelensky afirmou que julgamentos similares aos de Mariupol podem barrar qualquer tipo de negociação entre russos e ucranianos.

"Não importa o que os ocupantes estejam pensando, o que estejam planejando, a reação de nosso Estado será clara. Se esse show desprezível acontecer, se nosso povo for forçado a participar desse espetáculo, violando todos os acordos e regras internacionais, esta será a linha depois da qual qualquer negociação será impossível", disse Zelensky. "A Ucrânia não vai tolerar isso."

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