O presidente da Conaie, Leonidas Iza, foi preso em 14 de junho de 2022, acusado de protestos violentos contra o movimento indígena.
Reprodução/Arquivo/El Comercio 15.6.2022
O presidente da Conaie, Leonidas Iza, foi preso em 14 de junho de 2022, acusado de protestos violentos contra o movimento indígena.

A Justiça do Equador ordenou na madrugada desta quarta-feira a libertação provisória do líder indígena Leonidas Iza, acusado de supostamente paralisar o serviço de transporte do país durante os protestos contra o governo. A detenção, na terça, deu mais fôlego às manifestações, que ingressaram no seu terceiro dia consecutivo em ao menos 11 das 24 províncias do país.

"Continuamos com a luta, não vamos tirar o direito de ninguém, esperamos apenas que nossos direitos que estão sendo violados também sejam ouvidos", disse Iza, que é o chefe da a poderosa Confederação de Nacionalidades Indígenas (Conaie). "Muita força, não vamos ficar desmoralizados", completou em uma transmissão por Facebook após ser liberado.

Por telefone à agência AFP, Raúl Ilaquiche, da equipe de defesa da Iza afirmou que “a juíza ordenou a libertação imediata e que ele se apresente periodicamente ao MP enquanto o julgamento começa”. Segundo a organização independente Observatório da Justiça, ele está proibido de deixar o país de deve se apresentar à Justiça todas as quartas e sextas até o início do julgamento, em 4 de julho.

“A juíza ordenou medidas alternativas (o comparecimento periódico ao MP e a proibição da saída do país) por suposta paralisação de um serviço público”, confirmou o MP pelo Twitter, ressaltando que o líder indígena foi “preso em flagrante” e referindo-se a um crime cuja condenação, pela lei local, pode lhe render até três anos de prisão.

Iza lidera as manifestações contra o governo do presidente conservador Guillermo Lasso, convocadas por tempo indeterminado, nas quais os indígenas exigem a redução do preço dos combustíveis e a renegociação das dívidas dos trabalhadores rurais com os bancos. Há três dias, bloqueiam estradas com pneus em chamas, toras e barricadas de terra e pedras — atos que o presidente chamou de "vandalismo".

Com exceção de alguns incidentes isolados, os protestos de segunda haviam transcorrido com alguns bloqueios que não afetaram muito o funcionamento dos serviços essenciais do país, onde cerca de 25% dos 17,3 milhões de habitantes são indígenas. A prisão, contudo, intensificou os protestos na terça-feira, com viaturas policiais incendiadas, jornalistas agredidos e o uso de gás lacrimogêneo contra grupos que demandavam a libertação de Iza.

Em Quito, os manifestantes queimaram um veículo de patrulha, enquanto na região da Amazônia, forçaram a paralisação das atividades nos poços da empresa chinesa PetroOriental, que calcula perdas de 1,4 mil barris por dia. Na madrugada desta quarta, as manifestações prosseguiam nos arredores da capital, cujo acesso estava bloqueado por uma longa fila de caminhões e alguns pneus em chamas.

Defesa rechaça acusações

Segundo a juíza Paola Bedón, a detenção de Iza foi legal, cumprindo com os requisitos constitucionais. Ele supostamente foi encontrado bloqueando o trânsito em uma rodovia. Isso, determinou a magistrada, teria prejudicado o direito de ir e vir e a livre-circulação dos cidadãos.

A defesa, por sua vez, rechaça as acusações, afirmando que sua detenção não aconteceu enquanto a via estava obstruída — a prisão, portanto, foi ilegal. A Conaie, que na terça havia caracterizado a detenção como "violenta, arbitrária e ilegal", comemorou a libertação:

“Depois de 24 horas de detenção ilegal e por pressão social no marco da paralisação nacional, a juíza ordenou sua liberdade imediata”, afirmou em um tuíte. “A mobilização segue com os 10 temas determinados. Obrigado por toda a solidariedade. Viva a luta social!”

Iza havia sido preso durante a manhã de terça no setor de Pastocalle, na província andina de Cotopaxi, no Sul do país. Não está claro se as outras quatro pessoas com quem ele foi detido também foram libertadas.

Em um primeiro momento, o engenheiro ambiental de 39 anos foi transferido para a Unidade de Flagrancia, localizada no centro de Quito, que acordou fortemente vigiada pelas forças de segurança. Algumas horas depois, foi levado de helicóptero para uma base militar em Latacunga, na província de Cotopaxi, onde aconteceu a audiência.

Solto cerca de uma hora após a decisão judicial, o líder foi recebido por alguns apoiadores, que seguiram em marcha até a sede do MP, com abraços e gritos de "viva a luta" e "viva a greve". Uma indígena se aproximou de Iza e fez uma "limpeza", que consiste em passar plantas consideradas medicinais sobre o corpo.

A Conaie


Fundada ainda na década de 1980, a Conaie é a maior organização indígena do país, e uma das mais antigas e importantes do continente. Um dos marcos da luta da organização foi a insurreição indígena de 1990, contra o então presidente Rodrigo Borja Cevallos, quando se estima que mais de um milhão de pessoas participaram das manifestações lideradas pela Conaie.

Sua força ficou ainda mais evidente ao longo da década e no início dos anos 2000, quando o país sofreu o retrocesso econômico mais severo da América Latina e a Conaie teve um protagonismo social importante, ajudando a derrubar diversos presidentes, como Abdalá Bucaram, em 1997; Jamil Mahuad em 2000; e Lucio Gutierrez, em 2005.

O grupo que reúne 14 povos originários liderou também, em 2019, mais de uma semana de manifestações violentas contra o governo que deixaram 11 mortos. Desta vez, propõe que os preços dos combustíveis sejam reduzidos para US$ 1,50 para o galão de 3,78 litros de diesel e US$ 2,10 para a gasolina de 85 octanos. Os indígenas também protestam contra a falta de emprego e a entrega de concessões de mineração em seus territórios. Eles exigem também o controle de preços dos produtos agrícolas.

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