Sede da Otan, na Bélgica
Divulgação/Otan 17.05.2022
Sede da Otan, na Bélgica

Apontada pelo presidente da Rússia, Vladmir Putin, como uma das principais causas da invasão à Ucrânia, a Otan voltou a ser uma das principais siglas do noticiário internacional.

Criada depois da Segunda Guerra Mundial para, em tese, garantir a segurança de seus países-membros, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) pode contar, em breve, com mais dois países signatários: Finlândia e Suécia. Mas por que isso seria um problema?

O iG conversou com Gustavo Glodes Blum, internacionalista e doutorando na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), para esclarecer alguns pontos da mais recente - e polêmica - questão internacional.

A Otan foi criada depois da Segunda Guerra Mundial, quando uma competição ideológica, econômica e militar entre os EUA e a extinta União Soviética (URSS) se desenhava. Anos depois, com o fim da URSS, esse contrabalanceamento se tornou desnecessário, a Aliança tomou rumos diferentes, mas ainda sim, fortalecendo seus membros.

"[A partir de então] Ela começa assumir um caráter mais brando, com a luta pela democracia, compartilhamento de tecnologia e inteligência, desenvolvimento de sistemas de espionagem ou também a criação de um grande espaço geoeconômico, em que os países produzem armamento e equipamentos bélicos com a mesma tecnologia, compartilhando entre si a produção desses equipamentos, até que vem essa guerra em 2022, e constitui uma retomada da natureza inicial da Otan", explica Blum.

Nos últimos anos, pouco ouviu-se falar na Aliança, pois, segundo o especialista, os Estados Unidos se concentraram nas divergências econômicas com a China.

"O alvo preferencial dos Estados Unidos passou a ser a China, e em questões econômicas. Tanto que no governo Trump, a gente ouviu falar das guerras comerciais, em que havia acusações de evasão fiscal, de uso de mão de obra barata, pirataria. Essa expansão da Otan em direção ao leste europeu, no entanto, reaviva, de pouquinho em pouquinho, as ameaças militares e não-econômicas."

Ucrânia na Otan não é novidade

A primeira menção ao país hoje comandado por Volodymyr Zelensky foi feita pelo ex-presidente norte-americano George W. Bush, em 2008. Desde então, governos de diferentes ideologias caminharam em direção ou contra a ideia.

"A Ucrânia se torna independente nos anos 1990 como uma República Federativa, muito próxima do formato que temos no Brasil, e em 2004 é aprovada uma mudança constitucional para que não haja mais autonomia nacional, mas sim que todo país seja controlado pelo parlamento na capital Kiev. Isso acaba afetando majoritariamente regiões do leste, como Donetsk, Luganski, e a península da Crimeia, que tinham certos graus de autonomia", conta o especialista.

"Em 2010 essas reformas são retiradas por um presidente eleito com apoio dessa parte oriental, e em 2013, quando ele tentará a reeleição, ele é derrubado por um golpe que retoma as mudanças constitucionais de 2004. E 2008 [ano do convite de Bush] está no meio dessa bagunça".

Blum lembra que o tratado da Otan estabelece que nenhum país que esteja em um conflito pode entrar na organização, impedindo a anexação da Ucrânia. Esse não é o caso, por exemplo, da Finlândia e da Suécia, que anunciaram nesta semana o abandono da posição de neutralidade e o início do processo de adesão.

Ele afirma que se trata de uma manobra muito mais política, visando questões econômicas, do que militar, mesmo que o Artigo 5 do Tratado - o ataque a um dos membros significa um ataque a todos - seja constantemente lembrado.

"É a consequência natural de um processo que aconteceu nas últimas décadas, de uma aproximação muito profunda, principalmente de caráter econômico, de Suécia e Finlândia", pontua.

De olho em Erdogan

Na segunda-feira (16), o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, afirmou que vai vetar a entrada dos dois países na Organização. Segundo ele, o motivo seria o abrigo dado por ambos a membros do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK, em curdo), considerados terroristas pelo governo turco.

A justificativa, na concepção do analista, pode estar por trás da versão oficial.

"A posição do Erdogan, mais do que impeditivo para a entrada da Suécia e Finlândia, é uma forma de barganhar dentro da Otan alguns benefícios que ele não teria em condições normais. Qual o argumento principal dele, o fato de a Suécia e a Finlândia não só consideram organizações de curdos válidas, como dão suporte de várias maneiras para a sua luta. Me parece que essa posição do Erdogan - típica dele, de fazer declarações públicas cada vez que barganha algum benefício -, acaba sendo mais uma forma chocar para ter mais liberdade para negociar, do que uma posição definitiva, de impedir a entrada dos países".

Segundo a política da Otan, qualquer país pode solicitar adesão desde que atenda a critérios e todos os membros existentes concordem.

Finlândia e Suécia já cumprem muitos dos requisitos, e receberam apoio dos Estados Unidos e da Alemanha, bem como do Reino Unido.

A Rússia reagiu. Porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov disse que a "a expansão da Otan não torna o mundo mais estável e seguro". Já Sergei Ryabkov, vice-ministro das Relações Exteriores russo, disse nesta segunda-feira (16) que a medida seria um "erro" com "consequências abrangentes".

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** Filha da periferia que nasceu para contar histórias. Denise Bonfim é jornalista e apaixonada por futebol. No iG, escreve sobre saúde, política e cotidiano.

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