Madeleine Albright, primeira mulher a ser secretária de Estado dos EUA, morre aos 84 anos
Reprodução 24.03.2022
Madeleine Albright, primeira mulher a ser secretária de Estado dos EUA, morre aos 84 anos

Madeleine Albright, que fugiu dos nazistas quando criança na Tchecoslováquia durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), tornou-se a primeira mulher secretária de Estado dos EUA e, em seus últimos anos, um ícone feminista da cultura pop, morreu nesta quarta-feira, aos 84 anos, informou sua família.

"Estamos com o coração partido em anunciar que a dra. Madeleine K. Albright, a 64ª secretária de Estado dos EUA e a primeira mulher a ocupar esse cargo, faleceu hoje cedo. A causa foi o câncer" , disse a família no Twitter.

Nascida em 15 de maio de 1937 em Praga, Marie Jana Korbelova imigrou para os EUA com sua família judia quando tinha 11 anos, depois de terem vivido em Londres e na Suíça, quando adotou o nome Madeleine.

Sua influência mundial tornou-se tão grande que foi comparada à da ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher, na década de 1980. Em 2018, ela lançou o livro "Fascismo: um alerta", que se tornou um best-seller em vários países.

O porta-voz do Departamento de Estado, Ned Price, descreveu sua morte como "devastadora":

"Ela foi uma pioneira" , disse. "Como a primeira mulher secretária de Estado, ela literalmente abriu as portas para muitas pessoas em nossa profissão."

Albright, que foi embaixadora dos EUA nas Nações Unidas (1993-1997) e secretária de Estado do presidente Bill Clinton (1997-2001), foi uma diplomata de posições firmes em um governo que hesitou em se envolver em duas das maiores crises externas dos anos 90: os genocídios em Ruanda (1994) e na Bósnia e Herzegovina.

Enquanto estava na ONU, ela pressionou por uma abordagem mais dura contra os sérvios na Bósnia depois que as forças militares sérvio-bósnias cercaram a capital, Sarajevo, em 1993. Mas, durante o primeiro mandato do presidente Bill Clinton (1993-1997), muitos especialistas em política externa do governo se lembravam claramente de como os EUA acabaram no Vietnã (1959-1975) e estavam determinados a não repetir o mesmo erro nos Bálcãs.

Na época, durante uma sessão de crise na Casa Branca, ela travou uma discussão com o general Colin Powell, então chefe do Estado-Maior Conjunto dos EUA, que ficou legendária em Washington. Powell, que era contra a intervenção militar dos EUA para pôr fim ao cerco a Sarajevo, argumentou de foram veemente:

"Nenhuma das posições disponíveis garante uma mudança de comportamento dos sérvios" , disse Powell. "E qual é o objetivo político? Qual é a estratégia de saída?"

Visivelmente frustrada, Albright respondeu:

"Por que ter um Exército excelente, do qual você sempre está se gabando, se não podemos usá-lo?"

Em 1995, os soldados sérvios-bósnios invadiram três enclaves muçulmanos, Srebrenica, Gorazde e Zepa, massacrando mais de oito mil pessoas. Só então os EUA responderam, colaborando com a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) em ataques aéreos que forçaram o fim da guerra, no mesmo ano.

A experiência de Albright como refugiada a levou a pressionar para que os EUA fossem uma superpotência que usasse essa influência. Ela queria um "internacionalismo muscular", como disse James O'Brien, conselheiro sênior de Albright durante a guerra da Bósnia.

No início do governo Clinton, enquanto defendia sem sucesso uma resposta mais rápida e forte na Bósnia, Albright apoiou um tribunal de crimes de guerra das Nações Unidas que eventualmente acabou mandando para a prisão os arquitetos dessa guerra, incluindo o presidente sérvio Slobodan Milosevic e líderes sérvios-bósnios, disse O'Brien.

As lições aprendidas em Ruanda e na Bósnia serviram bem aos EUA em Kosovo, quando Washington viu os sérvios iniciarem um programa de limpeza étnica contra os albaneses. A Otan respondeu com uma campanha de 11 semanas de ataques aéreos em 1999, que se estendeu a Belgrado.

A operação, que não foi autorizada pelo Conselho de Segurança da ONU, provocou estragos em prédios do governo e instalações civis. Em um dos episódios mais violentos, a sede da Rádio e Televisao da Sérvia foi atacada, matando 16 funcionários.

Em Nis, a Otan foi acusada de usar bombas de fragmentação contra áreas civis. Um dos ataques também destruiu a embaixada da China em Belgrado, um incidente que provocou uma crise diplomática entre o Ocidente e Pequim.

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Até hoje, boa parte da população da Sérvia reage de forma negativa à simples menção do nome de Albright.

Durante os esforços para pressionar a Coreia do Norte a encerrar seu programa de armas nucleares, que acabaram sem sucesso, Albright viajou para Pyongyang em 2000 para se encontrar com o então líder norte-coreano, Kim Jong-il, tornando-se a autoridade mais graduada dos EUA a visitar o país comunista.

Ícone pop

Depois do fim dos anos Clinton e da década de 1990, Albright se tornou um ícone para uma geração de mulheres jovens que buscavam inspiração em sua busca por oportunidades e respeito no local de trabalho. Albright gostava de dizer:

"Há um lugar especial no inferno para as mulheres que não ajudam umas às outras."

A Albright de fala simples fez incursões na cultura popular. A personagem da estrela da série "Confusões de Leslie", Amy Poehler, tinha uma foto de Albright em seu escritório.

Em 2005, na série de televisão "Gilmore Girls", a personagem Rory sonhou que Albright, vestindo um terno vermelho e um broche de águia, era sua mãe.

Seu visual também era um contraste marcante com o figurino sisudo de seus antecessores e colegas do sexo masculino. Ela usava roupas e joias para enviar mensagens políticas azedas. Um dos favoritos era um broche de cobra, uma referência ao fato de o líder iraquiano Saddam Hussein tê-la chamado de "serpente incomparável".

Declarações sobre o Iraque, por sinal, marcaram negativamente sua carreira.

Em 1996, em entrevista ao programa "60 Minutes", da CBS, o jornalista Lesley Stahl falou sobre os impactos humanos das sanções internacionais ao Iraque, e sobre um número do Programa Mundial de Alimentos da ONU, de 1995, apontando que as restrições ao país poderiam ter sido responsáveis pela morte de até meio milhão de crianças.

Em seguida, perguntou a Albright se "o preço foi válido" para limitar o poder de Saddam. "Acho que foi uma escolha muito difícil, mas o preço... acho que o preço valeu a pena", respondeu.

Nos anos seguintes, revelou, em algumas ocasiões, ter se arrependido da frase.

"Foi uma declaração estúpida, nunca deveria tê-la feito, e se todos que deram declarações das quais se arrependeram depois tivessem que se levantar, haveria muita gente de pé", afirmou, em 2004, ao site Democracy Now.

Ela escreveu um livro sobre suas joias de assinatura, um dos vários best-sellers, explicando que os broches eram uma ferramenta diplomática. Broches de balões ou de flores indicariam que ela se sentia otimista, enquanto um caranguejo ou tartaruga indicariam frustração.

Albright frequentou o Wellesley College, em Massachusetts, e obteve um doutorado em Columbia University. Ela se tornou fluente em seis idiomas, incluindo tcheco, francês, polonês e russo, além do inglês.

Em 1959, ela se casou com Joseph Medill Patterson Albright, herdeiro do jornal Denver Post, onde trabalhava. Eles tiveram três filhas e se divorciaram em 1982.


* Com informações de agências internacionais

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