Em todo o mundo, cientistas estão correndo contra o tempo para desenvolver e produzir em massa testes de anticorpos que, segundo especialistas, são um elemento crucial para conter a doença. Mas o esforço vem sendo prejudicado pela escassez de amostras de sangue contendo anticorpos contra a Covid-19, necessárias para validar os testes.
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Com isso, algumas empresas estão lucrando com essa escassez, pedindo doações e vendendo as amostras. Documentos, e-mails e tabelas de preços obtidos pelo jornal The New York Times mostram que a Cantor BioConnect é uma das que oferecem a venda de amostras de sangue com anticorpos da Covid-19 a preços elevados. Quanto maior o nível de anticorpos no sangue , maior o preço.
Segundo o levantamento, as megociações com laboratórios e fabricantes de testes variam de US$ 350 (quase R$ 2 mil) até US$ 40 mil (cerca de R$ 223 mil). Questionada, a Cantor BioConnect disse que os preços são compatíveis com os “altos custos” de sua cadeia de suprimentos, que incluem encontrar doadores, testar amostras, custos de segurança e logística de remessas.
Amostras premium
De 31 de março a 22 de abril, os preços das amostras mais baratas vendidas pela empresa aumentaram mais de 40%, chegando a US$ 500 (R$ 2,7 mil). Além da amostra rara de US$ 40 mil, a empresa criou uma nova tabela de preços de US$ 1 mil a US$ 2 mil para outras amostras “ premium ”.
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Para conseguir as amostras, a empresa começou a entrar em contato com pacientes com coronavírus nas mídias sociais para pedir doações de sangue. Em um anúncio on-line, já removido, eles disseram que estavam trabalhando “em conjunto” com a força-tarefa da Casa Branca e ofereceram US$ 100 por doação.
Em poucos dias, de acordo com a reportagem, a empresa enviava frascos com amostras de sangue para clientes em todo o mundo, a maior parte laboratórios e fabricantes de testes dos EUA, mas também no Japão e na Europa. A empresa disse que sua margem de lucro no projeto era de 30% a 40%, o que, segundo ela, estava alinhada às normas do setor.
Em nota, a companhia disse ainda que o processo de coleta de sangue de doadores positivos para a Covid-19 era “complexo” e “extremamente difícil e caro” devido aos protocolos de segurança e ao pequeno número de casos de coronavírus conhecidos quando começou a fornecer doações de sangue.
“Existem formas de fazer as coisas bem e com segurança, e existem outras maneiras de fazê-la, de forma barata”, disse a empresa, acrescentando que vendeu amostras para “um dos maiores fabricantes de testes do mundo”, ajudando-o a “salvar vidas”.
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A Cantor BioConnect conta ainda com uma rede de intermediários, empresas que encontram compradores para em todo o mundo. Documentos mostram que a Advy Chemical , um importante fabricante de biotecnologia em Mumbai, é um dos intermediários. De acordo com e-mails e listas de preços, no espaço de um único dia o preço das amostras de sangue mais baratas dobrou, enquanto o estoque “premium” chegou a US$ 5 mil. A amostra de sangue mais cara passou para US$ 50 mil, um aumento de US$ 10 mil.
Em comunicado, a empresa indiana disse que não vendeu nenhuma das amostra de sangue da Cantor BioConnect , mas ajudou a facilitar transações para outros fabricantes. Questionada sobre o porquê de ter inflado tanto os preços, já que era apenas uma facilitadora, a empresa citou acordos “rígidos” de confidencialidade e disse que não comentaria “especulações e especificações comerciais”.