Leitos vazios no Hospital Federal de Bonsucesso, no Rio de Janeiro
Agência O Globo
Leitos vazios no Hospital Federal de Bonsucesso, no Rio de Janeiro

Um prédio fantasma. Para funcionários do Hospital Federal de Bonsucesso (HFB), foi isso o que virou a unidade após deixar de oferecer 28 serviços especializados de média e alta complexidade para atender exclusivamente casos de Covid-19, por ordem do Ministério da Saúde. De 240 leitos existentes — como consta em uma decisão judicial que pede a destituição da diretoria alegando que a atual gestão está sendo omissa no enfrentamento ao novo coronavírus —, poucos foram realmente liberados. Ontem, havia apenas 18 internados e 17 pacientes na Emergência.

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"Foi um erro estratégico acabar com o HFB. E uma desgraça. Agora ele não é nem referência em tratamento para Covid-19, nem o hospital que era. Atendemos 35 pessoas neste domingo (3)", disse o diretor do corpo clínico do hospital, Julio Noronha.

Os obstáculos na unidade federal passam por defasagem de pessoal, um problema antigo no HFB, até falta de respiradores , já que há apenas 22 disponíveis — mesmo assim, alguns destes equipamentos estão ociosos.

"Temos 30 leitos de CTI prontos que não podem ser liberados, por problema na planta fixa. Vários departamentos são abastecidos por um único ar-condicionado central, e isso não pode ocorrer no caso de tratamento de uma doença contagiosa. Então, foram montados leitos para internação nas enfermarias, com respiradores. Tem até alguns outros disponíveis, mas não há profissionais. Ainda que o hospital tenha mais médicos, não é um dermatologista ou um oftalmologista que pode atender os casos que recebemos. Por isso, o anúncio do Hospital de Bonsucesso como unidade de referência no combate ao coronavírus (feito pelo Ministério da Saúde ) pegou todo mundo de surpresa", contou um enfermeiro, que não quis ser identificado.

Sobre a escassez de pessoal, Noronha faz um alerta: "como não temos concurso há anos, metade da nossa mão de obra é por Contrato Temporário da União, cuja vigência acabará em 31 de maio. E não tomaram providência sobre isso ainda".

A falta de pessoal é um problema antigo no HFB, mas foi acentuado agora, segundo a servidora Tatiane Alves: "para funcionar como hospital geral, já era muita dificuldade. Só conseguíamos com muito apoio dos residentes e esforço das categorias envolvidas. Acontecia que, em muitos dos casos, os médicos faziam duas visitas por dia ao paciente e a enfermagem cuidava durante o dia. Para tratar pacientes com Covid-19 , não dá para ser assim. Precisa de expertise, pois a doença é muito rápida. O acompanhamento precisa ser feito por médicos durante as 24 horas do dia".

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De acordo com Julio Noronha, entre 595 médicos ativos do hospital, cerca de 100 foram afastados por fazerem parte do grupo de risco de Covid-19 — aqueles com mais de 60 anos ou que tenham comorbidades, que são as doenças que podem agravar o quadro de quem é infectado. Vários outros estão sem trabalhar por apresentarem sintomas semelhantes aos da contaminação pelo novo coronavírus. Mas não há testes disponíveis para confirmar se estes profissionais estão infectados.

O diretor calcula que o hospital tem cerca de 5 mil funcionários, muitos deles trabalhando sem equipamentos de proteção individual (EPIs). O problema expõe ainda mais os profissionais ao risco de contaminação pelo novo coronavírus.

"Chegaram 100 capotes impermeáveis recentemente, mas não foram distribuídos ainda e nem são suficientes. Soubemos que chegaram máscaras outro dia, mas não eram para uso hospitalar e tiveram que ser recolhidas. Os médicos acabaram comprando alguns dos seus próprios equipamentos de proteção individual e o sindicato distribuiu “face shields” (protetores faciais reutilizáveis). Mas a maioria dos 5 mil (funcionários) está sem proteção. Do quadro do Hospital Federal de Bonsucesso , já morreram cinco trabalhadores", afirma Julio.

Os respiradores são um problema à parte. Dos 52 que o HFB tinha, segundo Noronha, 30 foram emprestados para outras unidades de saúde. Há ainda cerca de dez carrinhos de atendimento emergencial que cumprem a função.

"Para oferecer 80 leitos de CTI, é preciso ter 80 respiradores mais 10, para o caso de alguns quebrarem", explica Noronha.

A juíza Carmen Silvia Lima Arruda, da 15ª Vara Federal do Rio de Janeiro , determinou, durante audiência realizada na última na quinta-feira (dia 30), que o Ministério da Saúde informe como a administração do hospital deverá proceder em relação aos equipamentos ociosos da unidade, em especial os 30 leitos de CTI prontos e respiradores que estão sem utilização.

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Ela deu ainda um prazo de 10 dias para que a pasta apresente soluções para os seis hospitais federais do Rio : de Bonsucesso, da Lagoa, de Ipanema, dos Servidores Federais, do Andaraí e Cardoso Fontes. O EXTRA procurou o Ministério da Saúde, mas ainda não obteve resposta.

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