O Japão é conhecido por ser um dos países mais avançados no setor da tecnologia, sendo aríete de diversas revoluções ao longo da história e contribuindo para o desenvolvimento da humanidade. Seja nas placas de computadores, componentes de celulares ou em outros itens tecnológicos, as empresas japonesas sempre estiveram presentes nas mudanças que carregam o desenvolvimento e abrem novas oportunidades para o futuro.
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Entretanto, o avanço apresentado em certas áreas se contrapõe com o tradicionalismo de uma cultura antiga e rica. Berço de diversas tradições, o Japão ainda mantém muitas das características que fundamentaram suas bases e fizeram o país ser o que é hoje.
Isso faz com que algumas regras, que um dia fizeram sentido e moldaram a sociedade japonesa , entrem em conflito com o que se entende por correto e direito nos dias de hoje. Um bom exemplo é a composição da dinastia que ainda existe no país e que, mesmo sem ter poder de comando, é tradicional e segue contando com o mesmo prestígio de quando foi iniciada.
O Trono de Crisântemo
A Casa Imperial do Japão remonta a 660 a.C e é considerada a dinastia mais antiga do planeta. Iniciada pelo imperador Jimmu, já teve 126 monarcas ao longo dos anos, todos eles descendentes diretos do primeiro representante da dinastia japonesa.
Mais do que isso, todos descendem, como diz a lenda, da deusa do sol, Amaterasu, uma das divindades da religião xintoísta e extremamente presente nos ritos e tradições da família imperial. Atualmente, quem ocupa o Trono de Crisântemo é Naruhito , que assumiu após o pai abdicar em seu favor.
O Imperador , que em japonês tem significado de 'soberano celestial', atua como um alto sacerdote na tradicional religião japonesa, o Xintoísmo , e é um símbolo do Estado e da unidade do povo, conforme prega a atual Constituição do país.
Por muitos anos, foi considerado uma divinidade e adorado pelo povo, sendo uma das figuras mais importantes de todo o país. Tal alegação só foi renunciada após a Segunda Guerra Mundial, quando o Japão ainda tinha Hirohito , avô do atual imperador, no Trono de Crisântemo.
Mesmo com toda a importância, a figura do imperador é apenas representativa no Japão, não tendo qualquer tipo de ação política. "Ele é o símbolo da nação, representa a união. Inclusive, isso está presente na Constituição japonesa. O imperador não tem poder político nenhum, zero, exerce simplesmente atividades representativas, sendo uma figura da união, cultura e valores do povo japonês", afirma Marco Antônio Garcia Feliciano, estudioso da monarquia japonesa.
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"Até a metade do Século XIX, o imperador não tinha sequer esse poder representativo. Era uma figura, um figura simbólica da sociedade, e quem exercia, quem governava, era o Xógum . Até que houve uma revolução, que abriu o país para outras nações, extinguiu o xogunato e reestabeleceu o poder imperial", finaliza Marco.
As mulheres da família
Ao longo das eras, a dinastia chegou a ser comandada por oito imperadoras ou imperatrizes , mas sempre em caráter de regência e provisório, até que um novo imperador homem pudesse assumir o trono. Segundo a lei imperial japonesa, promulgada pela Agência da Casa Imperial e pelo Conselho Privado em 1947, mulheres são proibidas de assumir o cargo.
Este é exatamente o grande ponto de crítica da dinastia perante o mundo. Enquanto outros países foram ou são comandados por mulheres, como é o caso da Inglaterra com a rainha Elizabeth II, o Japão segue 'parado no tempo' e só aceita a continuidade da linhagem com descendentes homens do imperador Jimmu.
Tal situação, inclusive, gerou um debate no país recentemente. Pressões internas para que o primogênito do imperador, seja ele homem ou mulher, ocupe o Trono de Crisântemo quando chegar o momento da sucessão, vindas de uma minoria que gostaria de modificar tal tradição, deram início às tratativas sobre o tema, principalmente após o atual imperador, Naruhito, e seu irmão, o príncipe Fumihito, terem tido apenas filhas: as princesas Aiko, Mako e Kako .
Assim, em 2005, o tema foi discutido pelo governo japonês. Tudo levava a crer que, caso a lei fosse revogada, a primogênita Aiko seria habilitada a suceder o pai e se tornar a primeira imperadora do Japão em muito anos. Entretanto, as conversas caíram por terra já em 2006, quando a princesa Kiko , mulher de Fumihito , deu à luz ao príncipe Hisahito , o primeiro homem de sua geração e, agora, o segundo na linha de sucessão, após o pai.
Título por dinheiro
Além de não terem direito de participar da linha sucessória, as princesas enfrentam outro problema quando chegam à idade adulta: quando se casar com um plebeu, elas devem abrir mão do status de realeza.
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Funciona da seguinte forma: para consumar o matrimônio, a princesa abre mão de ser uma nobre, passa a morar com o marido e ganha uma quantia por essa mudança, algo em torno de R$ 3,5 milhões.
A última a passar por isso foi a princesa Ayako . Em outubro de 2018, ela se casou com Kei Moriya, de 32 anos, que trabalha em uma empresa de navegação. A cerimônia aconteceu no famoso santuário de Meiji Jingu, depois de três dias de rituais no palácio imperial e de uma celebração de agradecimento ao então imperador Akihito.
Polêmica em discurso
A tradição que mantém as mulheres longe do posto acaba gerando situações inusitadas quando algo 'foge do script'. Uma destas polêmicas envolveu a atual imperatriz, como lembra Marco Antônio, no dia do anúncio do noivado, ainda na década de 90.
"Naruhito e a esposa fizeram discursos durante a cerimônia. Entretanto, a fala de Masako durou cerca de 30 segundos a mais e acabou sendo alvo de críticas da K unaicho , a agência da Casa Imperial", relembra.
Tudo isso porque, historicamente, a imperatriz deve sempre ficar atrás do imperador, seja física ou figurativamente, algo que é compartilhado por outras monarquias e só se inverte quando a soberana é uma mulher, como no caso da Inglaterra.
Relação com o Brasil
Mesmo quem mora longe do Japão faz questão de manter as tradições e a idolatria ao imperador. Os japoneses que escolheram o Brasil como casa seguem acompanhando as novidades sobre a família imperial e prestam homenagens em datas comemorativas. Entretanto, esta é uma prática que vem se perdendo conforme as gerações se sucedem.
Descendente de japoneses, Gustavo Sato de Paula revela que sua família, principalmente os mais velhos, segue o que acontece no Japão e realiza comemorações de datas importantes na vida do imperador, como seu aniversário e outras datas.
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"No dia da entronização , quando todos gritaram três vezes 'banzai', que é um viva ao imperador, os descendentes no Brasil fizeram a mesma coisa, como se estivessem lá. Então, essa ligação com a tradição, toda a comunidade fora do Japão conserva. É isso que mantém a comunidade unida e viva", afirma.
Ainda segundo ele, as instituições japonesas no Brasil têm o retrato do imperador na parede, em sinal de respeito: "ao conservar essas tradições, os mais velhos passam para os mais novos toda essa simbologia da unidade do imperador, unindo toda a nação japonesa".