Sang Chol, de 71 anos, tinha apenas quatro da última vez que viu sua mãe, Lee Keum-seom, hoje com 92 anos. Os dois foram separados pela Guerra da Coreia, que há 68 anos separou famílias ao dividir o então território único em dois. Nesta segunda-feira (20), Sang e Lee tiveram a oportunidade de se reencontrar, assim como dezenas de outras famílias, em um evento na Coreia do Norte organizado pelos dois países.
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Segundo informações da CNN , após um acordo entre o presidente da Coreia do Norte , Kim Jong Un, e o líder da Coreia do Sul, Moon Jae-in, 89 famílias foram selecionadas para participar da reunião de hoje entre as mais de 57 mil que se inscreveram.
As pessoas escolhidas foram levadas até um resort em Monte Kumgang, território norte-coreano, onde se encontraram com os parentes sob a supervisão de agentes do país.
Uma das famílias é a de Sang e Lee. Após a separação, ela ficou na Coreia do Sul com as duas filhas, enquanto o filho Sang cresceu do outro lado da Zona Desmilitarizada da Coreia (DMZ). Na manhã do domingo (19), a idosa embarcou em um ônibus rumo ao encontro e declarou à CNN que "sempre rezou muito para que seu filho tivesse uma vida longa", assim, os dois poderiam voltar a se ver um dia.
“Minha família na Coreia do Norte não viveu muito, então eu rezava pela saúde do meu filho”, explicou. Por mais que estivesse animada, ela também disse estar nervosa com o encontro, porque só se lembrava de Sang como uma criança, e agora, "ele já é um senhor".
“O que eu devo perguntar?”, apontou. “Ah, eu devo questionar sobre o que o pai dele lhe contou sobre mim. Ele deve ter dito sobre como nos separamos [o marido ficou com Sang no Sul] e como nossa casa costumava ser. Vou perguntar sobre isso”, decidiu.
Assim que se viram, os dois choraram e se abraçaram em um emocionante reencontro, durante o qual um não soltou a mão do outro.
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A espera por reuniões entre a Coreia do Norte e a Coreia do Sul
Assim como Lee e Sang, outras 88 famílias também estiveram em reencontros emocionados no começo desta semana. Os sul-coreanos chegaram no domingo no resort Hanwha, na cidade de Sokcho, passaram por uma série de exames médicos e foram orientados sobre como proceder ao cruzar a fronteira com o país vizinho.
Em território norte-coreano, registraram seus nomes e aguardaram ansiosos pelo encontro com a família, tendo em vista que foram os poucos sortudos selecionados para rever os parentes, três anos após o último evento do tipo oganizado pelos governos.
“Eu compartilho a frustração daqueles que não foram selecionados, então estou tentando conversar com parceiros do Norte para encontrar outras soluções”, explicou Park Kyung-seo, presidente da Cruz Vermelha da Coreia do Sul . “Muitos estão esperando, imagine ficar 73 anos sem saber se sua família está viva ou não. Essa raiva e agonia são uma verdadeira tragédia humana”.
Líder sul-coreano, Moon disse nesta segunda que os dois países precisam organizar mais eventos do gênero no futuro. “Expandir e acelerar as reuniões é uma das grandes prioridades dos projetos humanitários que as duas Coreias devem conduzir”, declarou.
“Devemos fazer um esforço ainda maior para resolver o problema de famílias separadas”, declarou. “Como membro de uma família dividida na Guerra , simpatizo muito com essa tristeza e dor, realmente não há tempo”.
Famílias separadas entre a Coreia do Norte e do Sul: um processo delicado
Mais de 60% dos requerentes para as reuniões são pessoas com mais de 80 anos. Sendo assim, o fator da idade é algo que preocupa a Cruz Vermelha, que já conseguiu reunir muitas famílias nas últimas décadas.
Desde que os eventos começaram, mais de 75 mil aplicantes já morreram, algo que foi destacado por Ahn Seung-chun, que foi ao encontro de familiares que nunca havia conhecido. “Eu pedi para ver meu irmão mais velho, mas ele já morreu, então eu nunca mais vou vê-lo”.
Ela se encontrou com a esposa do irmão e o filho dos dois. “Por um lado, estou triste que não verei meu irmão. Mas, por outro, estou feliz por conhecer meu sobrinho. Pelo menos conhecerei um fruto dele”.
Além disso, o drama é ainda maior com as pessoas que não são escolhidas para os eventos, como disse Kim Seong-jin, durante protesto no domingo. “Eu não sei quando meu pai vai morrer. Ele está começando a mostrar sinais de demência. E, antes que perca tudo, ele quer ir também [aos reencontros]. Mas tudo que pode fazer é assistir pela televisão e ficar triste todas as vezes”, lamentou.
“Meu pai está sozinho aqui no Sul. Vocês conseguem imaginar como ele sente falta da família? Ele só quer ouvir notícias de sua cidade natal antes de morrer”, explicou.
Resquício da Guerra entre a Coreia do Norte e a do Sul
A situação enfrentada pelas famílias é uma das consequências da Guerra da Coreia, que, mesmo 68 anos após seu início, ainda não terminou. Os países firmaram um armistício em 1953, contudo, os territórios nunca assinaram um tratado formal de paz.
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Existem possibilidades da guerra ser formalmente encerrada, principalmente após atos que mostraram a unificação dos territórios, por exemplo, durante os Jogos Olímpicos de Inverno deste ano, quando as delegações da Coreia do Norte e do Sul desfilaram juntas durante a abertura do evento.