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Ministério da Educação quer implantar o modelo em 216 escolas até 2023; educador afirma que o ensino pode gerar censura e agressão a professores

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Marcos Corrêa/PR/divulgação
Bolsonaro cumprimenta alunos de escola militar

“Tem que botar na cabeça dessa garotada a importância dos valores cívicos-militares, como tínhamos há pouco no governo militar, sobre educação moral e cívica, sobre respeito à bandeira”. Foi assim que o presidente Jair Bolsonaro defendeu, em setembro, o lançamento do Programa Nacional de Escolas Cívico-Militares , com meta de implantar o ensino em 216 colégios do País até 2023.

No último dia 21, o Ministério da Educação anunciou as 54 primeiras escolas a participar do projeto, localizadas em 23 estados e no Distrito Federal. Essas já vão começar a utilizar o modelo em 2020. Serão investidos, no total, R$ 54 milhões: um por escola. 

Além de reforçar valores como a disciplina, o governo Bolsonaro argumenta que as escolas cívico-militares têm um desempenho acima da média nacional e podem melhorar a educação no País. O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) aponta que o Ensino Fundamental II deste modelo tem uma nota de 6,5, enquanto a das escolas comuns é 4,1. 

“As escolas já existentes mostram um desempenho muito acima da média nacional. Já existem alguns casos espalhados pelo Brasil e é muito bonito de ver as escolas”, afirmou o ministro da Educação, Abraham Weintraub , ao iG .

Fernando Cássio, professor de política educacional da Universidade Federal do ABC (UFABC), no entanto, afirma que os índices de educação dessas escolas melhoram não por conta do ensino cívico-militar, mas porque são na verdade um modelo excludente. “Vão escolher as melhores escolas em termos de infraestrutura para implantar a política, as que já estão em condições melhores e em regiões centrais”, afirma. 

“Os indicadores, como o Indeb, são altos não porque melhorou a escola, mas porque mudou a população de estudantes. Existem mecanismos de seleção da população que lá está. Primeiro a escolha da escola, da localização. Depois a taxa de uniforme, acompanhamento diário, porque é muita demanda de comportamento, a prática cotidiana pedagógica é competitiva”, explica. “Um estudante sem condições socioeconômicas não vai ficar nessa escola, em um ou dois anos as pessoas mais pobres vão saindo. Os estudantes mais vulneráveis, negros e pobres, vão sendo ativamente ‘expulsos’ da escola”, completa. 

O educador faz uma comparação com a tentativa de implantar o ensino integral no estado de São Paulo, iniciativa do governador João Doria (PSDB) em 2019. “É um modelo excludente, pois seleciona as frações da escola pública que tem condições socioeconômicas, que têm dinheiro para uniforme, para comer na escola, pagar o almoço”, argumenta. “No fim, o objetivo do ensino cívico-militar é o mesmo do ensino integral: excluir os pobres e produzir indicadores”, completa.

Weintraub rebate e discorda sobre "elitismo" das escolas cívico-militares. O ministro afirmou que cidades com baixo IDH, periferias e áreas de fronteira também serão priorizadas. “Uruguaiana, na fronteira, recebeu. Corumbá, também na fronteira, recebeu. No estado de São Paulo, o governador não aderiu. Fica um pouco mais difícil, mas Campinas aderiu e preencheu todos os pré-requisitos anteriores”.

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De acordo com o MEC, 650 municípios manifestaram interesse em aderir ao programa. A pasta afirma ainda que terão preferência as escolas com 500 a mil alunos, que tenham estudantes em situação de vulnerabilidade social e Ideb abaixo da média do estado. Além disso, devem estar situadas em regiões metropolitanas e contar com efetivo da reserva das Forças Armadas. 

“Tiveram alguns estados que não quiseram, mas tiveram prefeitos em estados que quiseram, então essas cidades podem receber. Depois, precisa ter uma quantidade grande de militares na reserva na cidade nessa primeira fase do projeto, porque eu vou fazer principalmente com militares da reserva das Forças Armadas. Então, cidades muito pequenas que não tenham reservistas morando, eu não tenho como fazer”, explica Weintraub. 

Gestão compartilhada pode gerar censura 

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Reprodução
escola cívico-militar terá gestão compartilhada

A proposta do MEC é diferente das escolas militares, mantidas pelo Exército e com verbas do Ministério da Defesa. No novo programa do governo, a gestão é compartilhada. De acordo com a pasta, os militares darão aulas de educação moral e cívica, mas não devem atuar como docentes em outras disciplinas. 

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Eles serão responsáveis por três principais áreas: Didático-pedagógica, com atividades de supervisão escolar e psicopedagogia para “melhorar o processo de ensino-aprendizagem”; educacional, para “fortalecer os valores humanos, éticos e morais bem como incentivar a formação integral como cidadão e promover a sensação de pertencimento no ambiente escolar”; e administrativa, “para aprimorar a infraestrutura e a organização da escola e, consequentemente, a utilização de recursos disponíveis na unidade escolar”.

De acordo com Fernando Cássio, porém, este modelo pode causar conflitos e agressões a professores, além de censura a certos assuntos, como o período da ditadura militar no Brasil, o racismo, questões de gênero e homofobia. Para ele, apesar do número de escolas cívico-militares ser pequeno, o programa pode influenciar todo o sistema de ensino do País. 

“O impacto não é mínimo do ponto de vista do que a criação de um modelo de escola militarizada é capaz de fazer numa rede de ensino, é aí que vem os problemas concretos”, afirma. “A escola vai se dissolvendo e se transformando num pequeno quartel, se preocupando mais com o que os meninos e as meninas fazem com o próprio corpo, com os próprios afetos, do que com ser um sistema educacional.”