Quando pensamos em turismo, o Brasil é reconhecido não só pela riqueza da nossa biodiversidade, mas também pela diversidade do nosso povo, que abraça gente das mais variadas culturas e nações. Na teoria, somos um país disposto a acolher a todos, mas na prática será que estamos de fato preparados para receber as diferenças?

Assinado em maio pelo presidente Jair Bolsonaro, o decreto que aprovou o Plano Nacional de Turismo 2018-2022, prevê ações em quatro frentes: gestão e monitoramento, infraestrutura, qualificação de mão de obra e sustentabilidade. No papel, tudo parece muito coerente para esse Brasil que deseja prosperar, no entanto, falta muito para de fato implementar esse plano em nossas cidades - a começar por nosso setor hoteleiro, que ainda despreza o público idoso e com deficiência. Isso porque não associam o gasto com acessibilidade como um investimento, mas um prejuízo. Um erro crasso para quem gere qualquer negócio.

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No Turismo, está na hora de profissionalizar serviços e enaltecer qualidades que já são nossas, diz Mara Gabrilli
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No Turismo, está na hora de profissionalizar serviços e enaltecer qualidades que já são nossas, diz Mara Gabrilli

Na Europa, por exemplo, a diversidade é aposta no setor. Uma pesquisa realizada em 2012 pela Universidade de Surrey revelou que os viajantes idosos e com deficiência realizaram, em apenas um ano, 783 milhões de viagens. Esse segmento sozinho injetou 394 bilhões de euros e gerou 8,7 milhões de postos de trabalho na economia europeia.

No Brasil, onde somamos mais de 45 milhões de pessoas com deficiência , uma pesquisa de 2010, divulgada pela Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, destacou a importância dos clientes com deficiência de aquecerem o setor em baixas temporadas. Trata-se de um público que viaja justamente quando os hotéis costumam ter ociosidade. Além disso, geram efeito multiplicador, pois raramente viajam sozinhos. Isso significa que o volume de negócio referente a esse público se duplica em relação aos outros segmentos. O mesmo vale para os idosos, que hoje representam cerca de 15% dos pacotes turísticos vendidos no Brasil para destinos nacionais e internacionais.

Quanto nossas cidades não deixam de ganhar quando não se preparam para atender a essas pessoas, investindo, por exemplo, em calçadas de boa qualidade, transporte adaptado e comunicação acessível? Aliás, uma das maiores queixas do viajante cego é não conseguir comprar sua própria passagem aérea porque as plataformas dos sites não são acessíveis.

Nosso país ocupa a primeira colocação no quesito recursos naturais, garantindo-nos a 27ª colocação entre 136 países avaliado, segundo dados do Ranking de Competitividade em Turismo do Fórum Econômico Mundial. Por outro lado, ao ser avaliado quanto ao ambiente de negócios, a segurança oferecida ao turista, infraestrutura e priorização do setor, o Brasil fica entre os últimos da lista.

Essa é uma avaliação que o nosso governo deve levar em consideração. Ainda mais agora com a decisão de dispensar vistos para os cidadãos dos Estados Unidos, Canadá, Japão e Austrália . Afinal, se a ideia é alavancar nosso turismo, o que é positivo para nossa economia, precisamos ter estrutura para receber essas pessoas. E receber bem, para que voltem e recomendem nosso país.

Outro ponto que merece ser revisto é o incentivo ao turismo LGBT, segmento excluído pelo governo no Plano Nacional de Turismo. Falamos de um público que sozinho representa 10% dos viajantes no mundo e movimentam 15% do faturamento do setor. O Brasil é a nação da América Latina com maior potencial de crescimento de receitas nesse segmento. Em 2017, o setor registrou alta de 11% no país, enquanto o turismo de modo geral subiu 3,5%.

Vale lembrar que o Brasil tem hoje legislações que asseguram direitos no turismo. No caso do turista com deficiência, as diretrizes são ainda mais claras. A Lei Brasileira de Inclusão (13.146/2015), relatada por mim na Câmara dos Deputados com o apoio da sociedade civil, traz inclusive um artigo específico sobre acessibilidade em hotéis e estabelecimentos similares. A ideia é, além de reforçar o conceito do Desenho Universal nas áreas comuns, estabelecer a obrigatoriedade dos estabelecimentos já existentes disponibilizarem, no mínimo, 10% de seus dormitórios acessíveis.

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Quem visita o Brasil e quem viaja por ele o faz não só em busca de nossa beleza natural, mas também porque somos um destino onde as pessoas são bem recebidas. Fazer dessa característica brasileira uma ferramenta para alavancar nosso turismo é uma estratégia que nosso governo tem em mãos e não pode ser menosprezada. Afinal, emanamos diversidade e cordialidade em nosso povo. Está na hora de profissionalizar serviços e cuidar das nossas cidades para enaltecer qualidades que já são nossas e gigantes por natureza.

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