Pense em um objeto parecido com um disco voador com o tamanho de um estádio moderno de futebol. Esse é o Sirius, um acelerador de elétrons usado para produzir a luz sincrotron, que funciona como um microscópio capaz de enxergar a estrutura molecular de qualquer matéria.
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A máquina foi inaugurada recentemente em Campinas, em SP, e tem mais de 500 metros de circunferência. Cerca de 85% do projeto está sendo contratado dentro do Brasil, incluindo o desenvolvimento e a fabricação das peças mais sofisticadas.
Trata-se da maior e mais complexa estrutura de pesquisa do País e será colocada à disposição de pesquisadores do Brasil e do exterior, que inclusive já querem usar o Sirius para diversos projetos e experiências que nunca puderam ser feitas aqui.
Esse tomógrafo gigante brasileiro estará à disposição de cientistas do mundo todo, que poderão utilizar suas imagens para enxergar a estrutura molecular e estudar as propriedades de células, ossos, plantas...
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Na prática, a utilidade de um acelerador como o Sirius é infinita. Ele pode ser usado para o desenvolvimento de novos medicamentos, aprimoramento de materiais utilizados na construção civil, na exploração de petróleo, na análise de tumores. O cientista brasileiro Steven Rehen, por exemplo, já utilizou um acelerador similar para examinar mini cérebros e entender como certos minerais entram na composição do órgão.
A partir de 2019, o Sirius vai permitir diferentes pesquisas em áreas como saúde, energia e meio ambiente, engenharia de materiais e outras. Enfim, um golaço para a ciência brasileira e que merece destaque.
Aliás, em tempos de crise, precisamos falar também da valorização dos nossos profissionais da área, que deveriam ter tanta atenção do Governo quanto outros temas encarados como mais pungentes, tais como as reformas estruturais que o país precisa realizar.
Países da Europa e até os EUA, que também enfrentaram crises financeiras nas últimas décadas, aumentaram seu investimento em pesquisas para retomar seu desenvolvimento. O Brasil, no entanto, faz o oposto quando reduz os repasses para a ciência, tecnologia e inovação.
Nações de economia forte e com os melhores índices de desenvolvimento humano investem massivamente em pesquisa. Mas a equação, ao contrário do que muita gente pensa, é reativa. Países ricos não investem em pesquisas pelo motivo de serem ricos. Eles são ricos porque investem em pesquisas.
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Por isso vejo com olhar muito otimista o lançamento de máquinas como o Sirius. Mas precisamos de mais, podemos mais. A começar pelo investimento em ciência voltado para a educação. Sabemos que as universidades mais bem conceituadas são reconhecidas por suas pesquisas. E a lógica é a mesma das nações ricas. As melhores universidades do mundo são assim porque fazem pesquisa, e não o contrário.
Ciência não é só o fim, ela é o meio para se chegar ao desenvolvimento que buscamos. Ciência é ferramenta, mas diferente de uma obra, não pode ser paralisada.
Em 1997, pouco tempo após sofrer o acidente que me deixou tetraplégica, passei a procurar cientistas que estudavam a cura para paralisias. Determinada em concentrar toda a minha energia naquelas pesquisas, fundei uma ONG para fomentar tais estudos. Passei a conhecer muitos pesquisadores brasileiros, talentosos e dispostos a alavancar nosso país por meio da ciência. Mas todos esbarravam e esbarram ainda hoje em diversas barreiras. Algumas financeiras, outras tantas burocráticas, políticas... Infelizmente, ainda falta muito para se fazer ciência no Brasil e equacionar nossa produção com o talento de nossos cientistas, que é gigante.
Por isso, Sirius chega a mim como uma luz em um campo que andava meio escuro. Nunca fez tanto sentido a ciência e a esperança caminharem juntas.