Imagens de antes e depois mostram ação de destruição na Ilha Grande
Reprodução - 05.04.2022
Imagens de antes e depois mostram ação de destruição na Ilha Grande

O oceano que faz da Costa Verde um paraíso conspirou para transformá-la num pesadelo feito de água, com a mais volumosa chuva já registrada oficialmente no Brasil . A temperatura do mar acima do normal é apontada como um fator crucial para a frente fria, que atingiu uma larga faixa do Sul e do Sudeste do Brasil, ter sido catastrófica em Paraty, Angra dos Reis e Mangaratiba, municípios do entorno da Baía da Ilha Grande.

Com índices pluviométricos sem precedentes de registro, primeiro em Petrópolis e depois na Ilha Grande, o Estado do Rio de Janeiro se tornou o que o meteorologista Marcelo Seluchi, coordenador-geral de Operações e Modelagem do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), classificou como um laboratório de mudanças climáticas.

Seis meses em quatro dias

Os índices pluviométricos já apurados mostram que os dilúvios fluminenses se encaixam à perfeição nas projeções de modelos de mudanças climáticas, com períodos prolongados de seca e calor interrompidos por chuvas curtas e torrenciais.

"Em 2022, o Estado do Rio bateu todos os recordes de chuva registrados e pode ser considerado um laboratório de mudanças climáticas. Chegou a encostar em 900mm acumulados de chuva: nunca registramos esse valor no país. Não significa que não tenha acontecido antes, mas não havia registro. E temos extremos em sequência num curto período do ano. O Cemaden instalou os pluviômetros há dez anos, e o volume de água impressiona" afirma Seluchi.

O Brasil registrou vários recordes nessa estação chuvosa, todos no Rio de Janeiro. O primeiro foi o máximo em três horas de chuva, em Petrópolis, com 230mm, em 15 de fevereiro. Depois, o máximo em 24 horas, de novo em Petrópolis, com 548mm, no dia 20 de março. Em abril, o Cemaden mediu o máximo em 48 horas, na Praia de Araçatiba (Ilha Grande), com 821mm, em 2 de abril. E o máximo em 96 horas, também na Praia de Araçatiba, com 899mm.

A chuva de quase 900mm representa a metade do esperado para o ano inteiro em Angra dos Reis, onde fica a estação pluviométrica. Ou seja, em quatro dias choveu o total de seis meses. Seluchi destaca que mais impressionante é que 821mm dos 899mm se concentraram em apenas dois dias, 1º e 2 de abril.

Numa região normalmente já vulnerável por estar comprimida entre as íngremes montanhas da Serra do Mar e o Atlântico, o efeito foi avassalador. Principalmente em Angra dos Reis, onde há mais população vivendo em áreas de risco.

Combinação letal

O dilúvio da Costa Verde foi, segundo Seluchi, resultado de uma combinação de fatores. A causa principal foi uma frente fria poderosa, prevista com antecedência de uma semana e que atingiu parte das regiões Sul e Sudeste.

Choveu muito nos estados do Rio e de São Paulo. Os acumulados no município do Rio chegaram a ultrapassar 300mm — acima de 50mm, uma chuva já é classificada como muito forte.

Mas na Costa Verde e na vizinha Ubatuba, em São Paulo, a frente fria teve seus efeitos potencializados pela temperatura do mar muito alta.

"Sem dúvida, a temperatura do mar alta teve grande influência" diz Seluchi.

Nessa época, entre o fim de março e o início de abril, a água está normalmente mais quente. Mas, este ano, o mar está ainda mais quente do que o normal. Na semana passada, a temperatura chegou a ficar entre 27 graus e 30 graus na Baía da Ilha Grande.

O mar quente é combustível de tempestade, uma fonte de umidade muito grande, formadora de chuva, e deu à frente fria mais potência. Outra questão foi a direção do vento, perpendicular à costa na porção entre Ubatuba e Angra dos Reis.

E esse vento estava mais forte do que em outros lugares. Ele empurrou a tempestade para as montanhas da Serra do Mar, que serviram como obstáculo e fizeram com que um volume diluviano de água fosse despejado sobre a Costa Verde.

Seluchi frisa que podem ter ocorrido chuvas até piores no passado, mas não foram medidas. A região da Costa Verde é conhecida pela alta pluviosidade, e imensos blocos de pedra nas praias e nas encostas são marcas de deslizamentos. O que chama a atenção dos cientistas agora é a sequência de extremos. Ele acrescenta que hoje se sabe que a temperatura dos oceanos está aumentando devido às mudanças climáticas globais.

"Tivemos extremos próximos em Petrópolis e agora na Costa Verde. Essa é a pior estação chuvosa que já vi" diz.

1 - Frente fria

Uma frente fria é um do fatores da chuva em Angra dos Reis
Reprodução/O Globo
Uma frente fria é um do fatores da chuva em Angra dos Reis

Uma poderosa frente fria, prevista e alertada, vinda do Sul do país atingiu o litoral do estado do Rio de Janeiro com nuvens carregadas.

2 - Incremento local

A água quente do oeceano foi um do fatores da forte chuva
Reprodução/O Globo
A água quente do oeceano foi um do fatores da forte chuva

A frente ganhou um reforço local, pois o mar estava excepcionalmente quente. Na Baía da Ilha Grande a temperatura da água estava há mais de uma semana na faixa de 27C a 30C, bem acima da normal, por volta de 22C. O mar é uma fonte de umidade poderosa e deu mais combustível à frente fria.

3 - Vento

O vento é um dos fatores da forte chuva na Baía da Ilha Grande
Reprodução/O Globo
O vento é um dos fatores da forte chuva na Baía da Ilha Grande

O vento forte, exatamente perpendicular à costa, contribuiu para empurrar nuvens carregadas para as montanhas.

4 - Muralha natural

A Serra do Mar é um dos fatores da forte chuva na Baía da Ilha Grande
Reprodução/O Globo
A Serra do Mar é um dos fatores da forte chuva na Baía da Ilha Grande

A Serra do Mar, que na Costa Verde literalmente mergulha no Atlântico, funcionou como uma muralha e fez com que um colossal volume de água fosse despejado.

O quanto choveu?

O quanto choveu na Baía da Ilha Grande
Reprodução/O Globo
O quanto choveu na Baía da Ilha Grande

O estado do Rio de Janeiro registrou os maiores recordes de chuva registrados no Brasil, com base nos dados do Cemaden

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