
O Pico dos Marins, onde ocorreu o desaparecimento do escoteiro Marco Aurélio Simon , possui um certo grau de dificuldade para subir. Apesar de estar longe de ser uma trilha impossível (pelo contrário), merece atenção, por exemplo, por causa das baixas temperaturas nessa época do ano e, como qualquer montanha, exige cuidados básicos importantes.
O sumiço completou quatro décadas e ainda mobiliza buscas e teorias sobre o que teria ocorrido na manhã de 8 de junho de 1985, quando o jovem sumiu sem deixar vestígios.
Localizado na divisa entre os estados de São Paulo e Minas Gerais, o Pico dos Marins é uma das montanhas mais imponentes da Serra da Mantiqueira. Com 2.420 metros de altitude, ocupa a 27ª posição entre os picos mais altos do Brasil.
Pouca água
Segundo a Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística de São Paulo, a travessia completa tem cerca de 15 km, percorridos em três dias, com trechos de alta dificuldade.

Pontos de água potável são escassos e, muitas vezes, contaminados, o que exige levar de 5 a 6 litros por pessoa, além de purificadores. E especialistas indicam de abril a agosto, época de estiagem, o período mais indicado para realizar a trilha.
O percurso apresenta trechos íngremes, com pedras e rochas que exigem a chamada escalaminhada, uma espécie de escalada simples, além de áreas com capim-elefante alto, que pode desorientar mesmo os mais experientes.
Durante o inverno, especialmente em julho, as temperaturas à noite podem cair para cerca de 3 °C.
Sensação térmica pode ficar abaixo de zero.
O trajeto mais comum começa em um estacionamento e área de acampamento privada, na Base do Marins, seguindo por trilha sombreada por floresta até o Morro do Careca, em cerca de 45 minutos. Dali, prossegue-se em direção ao Marinzinho.

O geógrafo e guia Pedro Hauck afirma ao Portal iG que o Pico dos Marins é uma das montanhas mais destacadas da Serra da Mantiqueira, tanto pela paisagem quanto pelo clima rigoroso.
Segundo ele, a parte superior é coberta por vegetação aberta, enquanto as áreas mais baixas apresentam mata fechada.
“ É uma montanha que tem um clima muito mais frio que em sua região circundante ”.
Durante as noites a sensação térmica pode ficar abaixo de zero.
Ainda assim, Hauck considera o cume acessível para iniciantes com boa condição física e equipamento adequado para frio, apesar dos pontos íngremes ao longo do percurso.
Trilhas e a hipótese do desaparecimento
Ao comentar as mudanças nas trilhas ao longo das últimas quatro décadas, desde o caso do escoteiro, o guia destaca que a trilha principal dos Marins, como muitos chamam, não foi alterada.
No entanto, caminhos secundários deixaram de ser utilizados e acabaram sumindo, como o trajeto usado por Marco Aurélio na subida.
Ele diz conhecer o caminho usado pelo grupo na descida, pois o vale forma um relevo evidente, mesmo sem trilha marcada. Já o trajeto da subida, reforça, “ não existe mais ”.

Hipotermia: uma hipótese sobre o que aconteceu com Marco Aurélio
Baseando-se na análise do terreno e em um caso semelhante de 2018, Hauck apresenta a hipótese de que Marco Aurélio pode ter seguido reto em um ponto crítico da trilha, uma curva de 90 graus que leva ao Morro do Careca.
Quem não faz essa mudança de direção entra em outro vale, o mesmo onde o francês Eric Walterlin morreu em 2018.
“ Se Eric, que era atleta preparado, não conseguiu vencer essa mata e sair nos pastos na base da montanha, Marco Aurélio muito menos ”, argumenta.
Para ele, o escoteiro morreu de hipotermia nesse local protegido, que nunca foi encontrado, considerando essa hipótese “ muito óbvia ”.
Segurança e outros casos
Quanto às melhorias na segurança desde os anos 1980, Hauck afirma que o ponto de acesso à montanha não foi alterado e não há nenhuma estrutura ao longo do percurso. O que mudou foi o aumento no número de visitantes, o que tornou a trilha mais visível para o restante do país.
Além disso, ele destaca que as equipes de resgate de Minas Gerais e São Paulo estão hoje mais preparadas e equipadas para atender emergências.
Sobre a memória do caso de Marco Aurélio, ele comenta:
"Virou uma história cheia de fantasias que alimenta o imaginário das pessoas".
Riscos e preparo
Hauck compartilha sua visão sobre o risco de incursões solitárias. Para ele, caminhar sozinho pode ser uma experiência introspectiva valiosa, desde que haja planejamento.
“ Os acidentes não acontecem porque as pessoas estão sós. Você pode se perder estando em grupo também ”, afirma.
Ele reforça a importância da prevenção, respeitando a montanha, priorizando a temporada de estiagem, utilizando os equipamentos certos e avisando alguém sobre os planos.
Muitos acidentes, segundo o guia, ocorrem por negligência com cuidados básicos, como não verificar a previsão do tempo antes de subir.
“ Hoje em dia, com a popularização do montanhismo, a maior causa de resgates se dá pelo fato de que as pessoas não se preparam bem fisicamente e tentam realizar ascensões em montanhas difíceis ”.