Lula disse que rivalidade entre STF e Congresso não é boa
Ricardo Stuckert/PR
Lula disse que rivalidade entre STF e Congresso não é boa

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) declarou nesta quarta-feira (26), em entrevista ao portal Uol, que o Supremo Tribunal Federal (STF) deveria ter recusado a votação  sobre a regulamentação do porte de maconha para uso pessoal . De acordo com ele, a Suprema Corte "não deve se meter em tudo". 

"Eu acho que é nobre, necessário, que haja uma diferenciação entre usuário e traficante, para que a gente possa regular [o porte de drogas]. Se um dia um ministro da suprema Corte pedisse um conselho para mim: 'Presidente o que eu faço' [sobre esse tema]? A Suprema Corte não tem que se meter em tudo, ela tem que pegar tudo o que diz respeito à Constituição e ela virar senhora da situação, mas não pode pegar qualquer coisa e ficar discutindo. Porque aí começa a criar uma rivalidade que não é boa nem para a democracia, nem para a Suprema Corte, nem no Congresso Nacional. A rivalidade entre quem é que manda? O Congresso ou a Suprema Corte?", disse.

"Eu acho que essa questão diz respeito à ciência. Porque senão fica uma questão de vaidade entre Legislativo e Judiciário. E se houver uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) no Congresso Nacional, a PEC tende a ser pior. Não é uma coisa de Código Penal, é uma coisa de saúde pública. Vamos ver o que acontece, o mundo inteiro está utilizando derivados da maconha para fazer remédio", completou. 

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu na terça-feira (25) que portar maconha para consumo pessoal não é mais considerado crime , embora a droga continue sendo ilegal no país. Nesta quarta-feira (26), os ministros vão estabelecer a quantidade específica de maconha que define um usuário. 

Com base na decisão, quem for pego com a quantidade estipulada pelo STF será responsabilizado administrativamente por infringir a lei vigente que mantém a maconha como ilegal. Por outro lado, indivíduos encontrados com quantidades acima do limite estabelecido continuarão sujeitos às acusações criminais por tráfico de drogas.

Por outro lado, o Senado e a Câmara dos Deputados pretender debater uma lei para contrapor a decisão do STF. 

Na terça-feira (25), após a sessão do STF, o presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), considerou a decisão uma "invasão à competência do Legislativo" .

"Eu discordo da decisão do Supremo Tribunal Federal [sobre descriminalização]. Eu considero que uma descriminalização só pode se dar através do processo legislativo e não por uma decisão judicial. Há um caminho próprio para se percorrer nessa discussão, que é o processo legislativo", declarou Pacheco.

PL do Aborto

O presidente Lula voltou a criticar o PL do Aborto . Segundo ele, o debate está sendo feito "fora de hora", e a interrupção de uma gravidez deve ser tratada como "questão de saúde pública". 

"O projeto apresentado era uma carnificina contra as mulheres, porque criminalizava a vítima, dando a ela tempo de cadeia maior que o estuprador. Ainda bem que a sociedade se manifestou", afirmou. 

O texto sugeria alterações no Código Penal, estabelecendo que o aborto realizado em fetos com mais de 22 semanas seja considerado como homicídio simples, com uma pena de 6 a 20 anos para o caso de aborto provocado.

Economia

Lula defendeu a política econômica do governo e prometeu fazer uma "pente-fino" nos gastos , criticando o "nervosismo" do mercado financeiro. Além disso, ele garantiu que o país vai "mudar de padrão" quando a reforma tributária for aprovada. 

"O Orçamento da União é um bolo de arrecadação, você tem que distribuí-lo. Nós queremos fazer política de inclusão social que permita o crescimento das pessoas. O que nós estamos fazendo agora é uma análise de onde tem gasto exagerado, sem levar em conta o nervosismo do mercado, e sim uma política de investimento", declarou.

Segundo ele, haverá um debate com a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, e com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para averiguar se há necessidades de cortes orçamentários ou se é caso de necessidade de aumento na arrecadação. 

"Gasto está sendo bem feito? Acho que está. Nós estamos fazendo uma análise de onde tem gasto exagerado, que não deveria ter, onde tem pessoas que não deveriam receber e estão recebendo", disse o presidente.

"O problema não é que tem que cortar, o problema é saber se precisa efetivamente cortar, ou se a gente precisa aumentar a arrecadação. Temos que fazer essa discussão", explicou Lula, que completou: "Problema no Brasil é que a gente diminuiu muito a arrecadação."

Lula também criticou a desoneração da folha de pagamentos de 17 setores da economia: "Se eu desonerar uma empresa, tem que haver uma contrapartida ao trabalhador, senão eu estou beneficiando apenas o empresário. E aqui no Brasil se há um projeto de desoneração por 5 anos, depois aprovam um projeto de mais 5 anos, e assim por diante". 

Questionado sobre a alta na inflação de alimentos, o presidente prometeu debater no âmbito da reforma tributária uma taxação mais eficiente dos produtos da cesta básica, onerando mais os alimentos de alto padrão. 

Taxa de juros

Em meio a críticas ao presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, Lula disse que ainda não pensa no nome que irá substituí-lo . Ele também afirmou que não indicará o próximo comandante da autoridade monetária pensando em um nome que agrade ao mercado financeiro. 

Questionado sobre os nomes de Guido Mântega e Aloísio Mercadante, Lula reafirmou que escolherá o próximo nome de acordo com "os interesses do Brasil", e o "mercado precisa se adaptar a isso". 

Lula elogiou o nome do diretor de Política Monetária do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, com quem se reuniu nesta terça-feira (25), mas não garantiu a indicação do ex-número 2 do ministério da Fazenda para presidência do BC.

"Primeiro, o Galípolo veio em uma reuniao da meta inflacionária. O Galípolo é altamente preparado, conhece muito do sistema financeiro, mas ainda não estou pensando na questão do Banco Central, vai chegar um momento que vou pensar, e não venho puxando merla, como diria o Fernando Henrique Cardoso, o Banco Central tem necessidade de manter a taxa de juro a 10,5% quando a inflação está 4%? O BC está levando em conta que as pessoas estão tendo dificuldade de fazer financiamento?", disse Lula.

Além disso, voltou a questionar a manutenção da taxa básica de juros (Selic) em 10,5%. 

"É preciso que os empresários do setor produtivo, ao invés de reclamar do governo, deveriam fazer passeata contra a taxa de juros, porque são eles que estão sofrendo com isso. Nós precisamos caminhar para uma taxa compatível à necessidade do país crescer, ao mesmo tempo em que mantém a inflação controlada", disse.

O presidente também afirmou que a política de valorização do salário mínimo será mantida e descartou desvincular o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e as pensões do salário mínimo:

"Não é (possível), porque não considero gasto. Salário mínimo é o mínimo que uma pessoa precisa para sobreviver. Se acho que vou resolver o problema da economia brasileira apertando o mínimo do mínimo, estou desgraçado. Não vou para o céu, ficaria no purgatório."

Governabilidade

Lula disse que, apesar de derrotas em sequência no Congresso, a parceria com o União Brasil tem permitido a manutenção da governabilidade. Segundo ele, nenhuma proposta crucial para o Planalto foi derrotada. Como exemplo, citou a aprovação da reforma tributária após 40 anos. 

Já sobre a derrota do veto ao PL da "saidinha" dos presos na Câmara, Lula declarou ser contra o projeto que proíbe que detentos saiam da cadeia em datas esporádicas, mas que a democracia é feita de convivência entre opostos e, portanto, aceitou a derrota. 

Ainda sobre o apoio do partido, Lula foi perguntado sobre o ministro Juscelino Filho, acusado de corrupção. Segundo o mandatário, a partir do momento que a Procuradoria-Geral da República ou o Supremo Tribunal Federal aceitarem o indiciamento do ministro das Comunicações, ele será afastado . "Todo mundo é inocente até que se prove o contrário", disse. 

"O que eu disse para ele: a verdade, só você que sabe. Se o procurador indiciar você, você sabe que tem que mudar de posição. Enquanto não houver indiciamento, ele fica como ministro, se houver indiciamento, ele será afastado (...) Eu quero que ele seja julgado da forma mais honesta possível", afirmou o presidente.

A PF já indiciou o ministro. O presidente se referiu a possibilidade de denúncia, em avaliação pela PGR.

Eleições municipais

Lula reiterou que o Partido dos Trabalhadores (PPT) deve lançar candidaturas em todas as capitais que têm chance de ganhar; nas demais, irá apoiar algum candidato. A postura significa uma mudança na decisão de 2020, quando lançou nomes em todas as capitais e registrou uma derrota acachapante. 

"Um partido é como um time de futebol, tem horas que você tá como o Real Madrid e tem horas que você é o Corinthians. Então, a depender do momento, você lança mais ou menos candidatos", disse.

Argentina

Sobre a extradição de bolsonaristas envolvidos nas manifestações golpistas de 8 de janeiro que estão foragidos na Argentina e no Uruguai, Lula disse ser a favor da prisão dos que já foram condenados.

"Os que estão lá, você tem uma parte já condenada, então que eles sejam presos lá ou extraditados para cá, mas nos estamos tratando da maneira mais diplomática possível", declarou. 

Ele afirmou ainda não ter conversado com Javier Milei, presidente da Argentina, devido às críticas do libertário ao Brasil. 

"Eu não conversei com o presidente da Argentina [Javier Milei], porque ele deve desculpas ao Brasil. Ele falou muita bobagem. Mas a Argentina continua sendo muito importante para nós, e não vai ser um presidente que vai ser maior que o povo brasileiro ou argentino", adicionou. 

Quer ficar por dentro das principais notícias do dia? Clique a qui e faça parte do nosso canal no WhatsApp .

    Mais Recentes

      Comentários

      Clique aqui e deixe seu comentário!