O advogado Nauê Pinheiro de Azevedo, assessor jurídico da ONG Observatório do Clima, se dirigia a uma reunião com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) em Brasília sobre pautas ambientais, nesta terça-feira (29), quando acabou tendo que lidar com uma situação embaraçosa no estacionamento do órgão. Ao parar o carro, onde estava com mais três colegas no carona, que eram brancos, ele, que é negro, foi abordado pelo segurança pátio, que presumiu, de forma preconceituosa, que ele estava prestando serviço como motorista aos demais.
“O segurança não saiu da guarita. Eu estava estacionando e ele ficou me chamando e mostrando que estava tirando o cone. Eu perguntei ‘ué, é para eu ir para a garagem?’, e aí ele respondeu ‘não, é para você deixar o pessoal lá e ir embora’”narra Nauê. “Aí uma das pessoas que estava comigo no carro falou: ‘Mas nós estamos juntos’. Ele repetiu o movimento.”
O advogado conta que, após o episódio de racismo, todos ficaram desconsertados, sem reação.
“Eu parei o carro todo torto, de tão perturbado que eu fiquei. Daí que a gente se tocou o que tinha acontecido e ficou todo mundo tão estarrecido que ninguém disse um ‘A’. Eu era o único negro no carro, estávamos em quatro pessoas. Só aí o segurança pareceu ter percebido que eu não era motorista, eu era advogado”, relata.
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'Racismo estrutural'
Nauê, no entanto, diz não desejar que o rapaz que cometeu o ato racista seja punido "nem de longe".
“Esse tipo de coisa a gente trata com educação. Na reincidência, a gente vê o que faz. Punir por punir vai gerar no mínimo duas vítimas, é uma questão social”, diz. “Não há problema ser motorista, o problema é porque eu, negro, sou confundido com motorista e não visto como advogado, mas um cara branco veste um jaleco e fica semanas no hospital se fingindo de médico sem ser incomodado? É o questionamento que eu faço.”
O Observatório do Clima, por sua vez, publicou uma nota de repúdio após o episódio.
"Para além das necessárias responsabilizações institucionais, o episódio expõe quão estrutural é o racismo no Brasil, e quão racistas são as lentes pelas quais a sociedade de minoria branca enxerga não apenas negros, mas também mulheres e indígenas", diz a instituição. "Nauê Pinheiro é um advogado brilhante, escolhido pelo OC para representar a rede no julgamento histórico de sete ações ambientais nesta quarta-feira pelo STF. Tê-lo na nossa equipe é uma honra, e o papel que ele desempenhará no julgamento de hoje nos enche de orgulho".
O STF foi questionado sobre o ocorrido, mas até a publicação desta reportagem, ainda não havia obtido resposta.
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