Documentos enviados à CPI da Covid mostram que o médico Anthony Wong, conhecido por defender o "tratamento precoce", ineficaz contra a Covid-19, foi submetido às mesmas drogas cujo uso defendia em um hospital da Prevent Senior.
O fato de ter morrido por complicações devido ao coronavírus foi omitido de sua certidão de óbito.
O caso foi antecipado pela revista "Piauí". Procurada, a Prevent Senior diz em nota que, "por limitações éticas e legais", "não pode fornecer ou confirmar informações de pacientes". "Apesar disso, afirma que não houve fraudes ou omissões nos atestados de óbito", afirma a empresa.
Anthony Wong foi internado no Sancta Maggiore, da rede Prevent Senior, em 17 de novembro de 2020. No mesmo dia, assinou um termo autorizando o uso de hidroxicloroquina, comprovadamente ineficaz contra a Covid-19, e também a ozonioterapia, proibida pelo Conselho Federal de Medicina (CFM).
Em agosto do ano passado, Mauro Luiz de Britto Ribeiro, presidente do CFM, afirmou que o uso da ozonioterapia coloca em risco a saúde dos pacientes e não há evidência científica que tenha eficácia contra alguma doença. Ele alertou que médicos que usassem o tratamento poderiam ser punidos.
O receituário, que consta nos prontuários a que o GLOBO teve acesso, mostra que Wong tomou hidroxicloroquina e azitromicina, o chamado "kit Covid", desde os primeiros dias da sua internação, quando o hospital só havia constatado que ele estava com febre, tosse e cansaço.
"Iniciado protocolo Covid", registrou a médica responsável. "Aguardo restante dos exames laboratoriais. Converso com o paciente e sua esposa que compreendem e concordam com a conduta." O teste para Covid-19 teve resultado positivo, afirma posteriormente o prontuário médico.
Nas semanas seguintes, o quadro de Wong piorou. Foi intubado e teve uma hemorragia digestiva. Por fim, teve uma pneumonia bacteriana, cujo risco é maior nos casos de Covid-19. Wong faleceu em 15 de janeiro de 2021 aos 73 anos. A causa da morte não foi divulgada pela família na época.
Wong tinha a especialidade de toxicologista. Quando morreu, ele era médico chefe do Centro de Assistência Toxicológica (Ceatox) do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas e embaixador do Instituto Trata Brasil. Nascido em Nanking, na China, em 1947, Wong se naturalizou brasileiro em 1973.
Nas palavras do relator da CPI, senador Renan Calheiros, Wong foi um dos "maiores propagandistas das fake news envolvendo o tratamento precoce". Durante a pandemia, ele gravou vídeos e deu palestras nos quais defendendia o tratamento precoce, colocava em dúvida a eficácia da vacinação e defendia a estratégia chamada de "intervenção radical", que consitia no isolamento apenas dos idosos e na abertura geral das cidades.