As fake news não são novidade. A velocidade na sua produção, sim. É o que defende o pesquisador da Unesp, Bruno Souza.
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As fake news não são novidade. A velocidade na sua produção, sim. É o que defende o pesquisador da Unesp, Bruno Souza.

A pandemia do novo coronavírus não é a única emergencia global que enfrentamos atualmente. Segundo o Departamento Global de Comunicações das  Organização das Nações Unidas (ONU), desde março de 2020 vivemos um fenômeno que o órgão chama de "infodemia". Ou seja, uma "proliferação de falsas informações" - que não são confiáveis - e lutarão pela atenção do espectador junto com a verdade. 'Vence' a que se propagar com maior velocidade. Tal qual um vírus.

O cientista político e pesquisador do Laboratório de Política e Governo (UNESP), Bruno Souza, ressalta que esta prática não é novidade nos tempos atuais, mas que a velocidade da sua produção, sim, é algo contemporâneo.

"A existência de boatos, de notícias que não guardam relação com a verdade, ela não é nova. Isso sempre existiu. Sempre esteve posto dentro da sociedade. Ocorre que, o que mudou muito nos tempos atuais é a velocidade, esse seria o 'certo perigo'. E por que? Porque sabemos que as industrias de robos, que compartilham informações sobretudo nas redes sociais, é algo gigantesco", argumenta Bruno.

Uma publicação do epidemiologista matemático Adam Kucharski, professor da Escola de Londres de Higiene e Medicina Tropical, chamado "Estudo da Epidemiologia das Fake News" e publicado na revista Nature em dezembro de 2016, traça este paralelo e explica como a disseminação de informações falsas se comporta de maneira semelhante a uma infecção viral.

O documento toma como base as eleições presidenciais norte-americanas de 2016, vencida pelo candidato republicano Donald Trump, e o plebiscito britânico sobre a saída do bloco da União Europeia.

Kucharski analisa que "cepas de doenças podem competir e evoluir em uma determinada população assim como rumores. Infecções e opiniões são ambas moldadas por contatos sociais".

Outro ponto analisado pelo pesquisador é o local que possibilita a "mutação" da opinião pública e se tornou a preferência do público para absorver conhecimento: as redes sociais. Segundo o estudo, quanto mais pessoas se tornam usuárias destas plataformas, transformando-as assim em um ambiente prioritário de acesso à informação, maiores as chances de uma "cepa" alternativa da realidade aparecer.

Segundo Bruno, a possibilidade que a redes sociais trouxeram para o 'cidadão comum' em se tornar um produtor de conteúdo retirou uma etapa fundamental na disseminação de uma informação entre as pessoas.

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"Uma das maiores dificuldades contemporâneas é o fato de que a produção da informação não depende mais das mídias tradicionais - como o rádio, televisão, imprensa escrita - e várias pessoas podem se tornar produtoras de conteúdo. Com isso, a checagem de quem as produz acaba sendo suspensa", explica.

"As pessoas compartilham a informação que aparenta ser verdade, e porque acredita que aquele conteúdo é de confiança. A grande questão, neste momento, é o alcance e a horizontalização da comunicação - antes verticalizada pelos meios de comunicação tradicional", acrescenta.

O pesquisador alerta, também, sobre  os métodos utilizados pelos produtores de notícias falsas, que visam colocar "certa dúvida sobre  o que é dito pelos meios de comunicação profissionais. Desgastar, desconstruir imagens, acabar com reputações ou criar dúvidas sobre assuntos que possuem consenso."

O impacto das fake news afeta, diretamente, inúmeros setores da sociedade. A vacinação contra o novo coronavírus é um ótimo exemplo. Alteração de DNA, câncer ou transformação de répteis são algumas das mentiras veiculadas aos imunizantes. Muitas destas mentiras influenciam comunidades locais que optam por não se vacinarem.

Uma reportagem realizada pelo site El País em março deste ano identificou que comunidades indígenas situadas na região do Rio Negro, na Amazônia, registraram uma alta recusa em se imunizar após receberem mensagens no WhatsApp. O conteúdo dizia que as vacinas instalariam um "chip do diabo" em quem a tomasse. A situação gerou medo nos indígenas e, com isso, determinadas comunidades indígenas registraram pouco mais de 10% de imunizados e um índice de rejeição quase equivalente aos vacinados.

Mas o que torna atraente uma fake news? O Instituto de Tecnologia do Massachusetts (MIT) buscou responder esta pergunta em 2018 e publicou, em seu site, um estudo a respeito da propagação de 126 mil notícias diferentes e chegou a conclusão que as chances de uma informação falsa ser repassada é 70% maior do que uma notícia verdadeira.

David Austin, professor de gestão do MIT e um dos coordenadores desta investigação, defende que a psicologia humana pode estar diretamente associada a probabilidade de nos envolvermos mais com notícias falsas.

"Nós gostamos de coisas novas e notícias falsas, muitas das vezes, são inéditas." O estudo demonstra, também, que notícias falsas e verdadeiras produzem diferentes emoções em quem as compartilha. Enquanto fatos geram ansiedade e tristeza, mentiras causam espantos e surpresas", diz.


O cientista político Bruno Souza finaliza sua argumentação dizendo que, atualmente, a checagem das informações que recebemos é uma "lição de casa" fundamental para não  propagarmos notícias falsas. "É preciso ver quem é o autor daquele texto, qual a fonte, se ela dialoga com alguma referência oficial, se menciona documentos e se isso alcançou outros órgãos de comunicação. Sem não tem um veículo de comunicação reconhecido por trás ou alguém que pratique jornalismo profissional, é preciso desconfiar".

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