Em 2019, o Estado do Rio de Janeiro registrou 6.692 casos de violência sexual, e crianças e adolescentes foram a maioria das vítimas desse tipo de crime. Entre os 85 feminicídios registrados, quase 70% foram cometidos contra mulheres negras, e a maioria delas foi morta por seus companheiros ou ex-companheiros. A cada mês do ano passado, mais de 10 mil mulheres sobreviveram à violência doméstica. Os dados, alarmantes, estão no Dossiê Mulher 2020, divulgado pelo Instituto de Segurança Pública (ISP)nesta quinta-feira (27).
O caso da menina de 10 anos do Espírito Santo, abusada sexualmente durante quatro pelo tio, chocou o Brasil há poucas semanas. Os números do Dossiê Mulher apontam que casos como o dela acontecem também no Rio — e não são poucos.
De acordo com o estudo, a maioria das tentativas de estupro (91,8%) e de estupro (86%) foram cometidas contra mulheres, sobretudo meninas e adolescentes. A cada dez vítimas de estupro, sete tinham até 17 anos. A maior parte dos crimes contra crianças e jovens, 58,9%, aconteceram dentro de casa. Meninas de até 14 anos representam a maior parte desse total: elas são 65,9% das sobreviventes de estupro no estado. Mais de 44% dos crimes de estupro de vulnerável foram praticados por pessoas conhecidas, sendo pais e padrastos responsáveis por 18,5% dos registros.
Adriana Pereira Mendes, diretora do ISP , avalia os números de violência contra menores no estado do Rio como alarmantes:
"Os dados são preocupantes. A maioria dos casos de estupro são praticados dentro de casa, por conhecidos. São crimes intramuros, em que se tem menor visiblidade dessas violências. Nesse sentido, é importante que o adulto denuncie quando identificar mudanças no padrão de comportamento e nos hábitos da criança e do adolescente", diz.
O Dossiê Mulher aponta ainda que, em 2019, houve uma redução de 12% nos casos de homicídio doloso (quando há intenção de matar ou quando o sujeito assume o risco de fazê-lo) de mulheres em relação a 2018. Mais de um terço das mulheres vítimas desse crime foram mortas dentro de uma residência, e 43,8% delas morreram em decorrência do uso de arma de fogo.
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Entre as 85 vítimas de feminicídio no estado em 2019, 58 eram mulheres negras (68,2% do total) e 49 tinham entre 30 e 59 anos. A análise mostra que 82,4% das mortes foram cometidas por companheiros ou ex-companheiros das mulheres, sendo 78,8% dos casos dentro de uma residência. Para 44% das vítimas, a motivação do autor do crime foi o término do relacionamento. A brutalidade é chocante: 32,9% das mulheres foram mortas com facão, faca ou canivete. Em 15 dos feminicídios registrados, o filho ou filha presenciou o crime.
"A redução de homicídios dolosos contra mulheres possui uma realidade positiva desde o ano de 2018, quando foram registrados 350 casos contra 308 neste ano. No entanto, o relatório apontou que a maioria das vítimas de feminicídio são adultas jovens, mulheres de meia-idade e negras. É um alerta para o estado no que tange a resolução de políticas publicas", comenta Adriana.
A pesquisa aponta que os crimes contra a vida, relacionados à violência física, foram registrados por maioria de mulheres negras , enquanto os crimes de natureza patrimonial, moral ou sexual foram registrados por maioria de mulheres brancas.
'Nenhum padrão de violência está dentro da normalidade'
Os números do Dossiê Mulher mostram que mais de 128 mil mulheres sofreram violência no âmbito doméstico e familiar — um número 6% maior do que em 2018. Ou seja, a cada mês de 2019, 10.694 mulheres sofreram esse tipo de violência no estado do Rio. A maioria delas (54, 6%) tinha entre 30 e 59 anos e 75,2% já tinha alguma relação com os seus agressores. Os crimes mais registrados foram lesão corporal dolosa (32,2% do total) e ameaça (32%).
A Lei Maria da Penha especifica cinco formas de violência cometidas contra as mulheres no âmbito doméstico e familiar. De acordo com essa divisão, os números de violência doméstica no Rio se subdividem em: violência física (33% das vítimas), sexual (5,2%), psicológica (32,3%), moral (24,8%) e patrimonial (4,6%).
Adriana Mendes reflete sobre os desafios relacionados ao combate da violência contra a mulher no Rio de Janeiro:
"Para 2020, incluímos tipificações criminais como cenas de sexo sem consentimento da vítima, importunação sexual e descumprimento de medidas protetivas de urgência. Nenhum padrão de violência está dentro da normalidade. O desafio atual é promover a consciência coletiva, não cabendo distinção de gênero, orientação sexual e racial. As mulheres não estão sozinhas. O estado possui uma rede extensa de proteção para a mulher vítima de violência como a Delegacia de Atendimento à Mulher e a Patrulha Maria da Penha".