
Desde a morte do pai, o reitor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Luiz Carlos Cancellier, o professor universitário Mikhail Vieira de Lorenzi Cancellier toma remédios contra depressão e ansiedade. Há dois anos, Cancellier cometeu suicídio enquanto era alvo de um inquérito da Polícia Federal (PF), acusado de obstruir as investigações de desvios de verbas nos cursos de Educação a Distância (EAD) da universidade. Assim como o pai, o filho também foi denunciado na mesma operação, Ouvidos Moucos — Mikhail é suspeito de desviar dinheiro público do programa de ensino.
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"Quando tu recebe um indiciamento e, sobretudo, uma denúncia, por mais que seja a evidência da inocência diante disso, você sempre tem medo do que pode te acontecer. Bom, eu sou inocente, né? Mas é um julgamento, todo processo, que eventualmente tem uma metodologia que é diferente. Então é difícil não sentir medo", disse Mikhail em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo .
Segundo a investigação, Mikhail, que é professor adjunto de Direito da UFSC, recebeu R$ 7.102 em sua conta bancária, em 2013. O dinheiro é oriundo de uma transferência feita
pelo professor Gilberto de Oliveira Moritz; o filho do reitor
, porém, não soube explicar a origem da movimentação. Na época que recebeu a quantia, Mikhail tinha 25 anos e vivia
da mesada do pai em São Paulo.
Em julho deste ano, quando Mikhail foi denunciando pelo Ministério Público Federal (MPF), a defesa do professor questionou o processo da acusação. "Que processo penal é esse? Ele é acusado de, em três meses, ter recebido R$ 7 mil de uma conta de um amigo do pai dele, não era nem da faculdade. E aí ele é denunciado por ter se apropriado de dinheiro público?", disse Edward Carvalho, advogado de Mikhail Cancellier.
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Operação criticada por excessos
A operação Ouvidos Moucos foi realizada pela PF em 14 de setembro de 2017. O objetivo era apurar supostos desvios de verbas nos cursos de educação à distância de Física e Administração, dentro do programa Universidade Aberta do Brasil na UFSC.
O então reitor, Luiz Calor Cancellier de Olivo , pai de Mikhail, e outros seis professores foram presos, mas libertos no dia seguinte. A repercussão do caso se ampliou quando o reitor, acusado de obstruir a investigação, se matou ao se jogar do sétimo andar de um shopping em Florianópolis.
A PF recebeu muitas críticas pelos excessos e pelo tratamento dado aos professores, o que teria levado o reitor a cometer o suicídio. A delegada do caso, Érika Mialik Marena, responsável pelo caso, foi alvo de uma investigação interna, mas a corregedoria concluiu que não houve abusos.
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Pouco antes de sua morte, em outubro de 2017, Cavallier escreveu um artigo para a seção de Opinião do jornal O Globo sobre as condições aos quais foi submetido durante sua prisão — situação a qual chamou de "humilhação e vexame". No texto, o reitor questionou a acusação e a forma em que o inquérito da PF foi levado:
"Para além das incontáveis manifestações de apoio, de amigos e de desconhecidos, e da união indissolúvel de uma equipe absolutamente solidária, conforta-me saber que a fragilidade das acusações que sobre mim pesam não subsiste à mínima capacidade de enxergar o que está por trás do equivocado processo que nos levou ao cárcere. Uma investigação interna que não nos ouviu; um processo baseado em depoimentos que não permitiram o contraditório e a ampla defesa; informações seletivas repassadas à PF; sonegação de informações fundamentais ao pleno entendimento do que se passava; e a atribuição, a uma gestão que recém completou um ano, de denúncias relativas a período anterior."