Avenida utilizada por Crivella está bloqueada desde o fim de maio
AGENCIA O GLOBO/
Avenida utilizada por Crivella está bloqueada desde o fim de maio

Quinta-feira, 8 de agosto, quase 9h30. Quando três carros, escoltados por motociclistas, se aproximam da barreira que impede, em São Conrado, o acesso à Avenida Niemeyer , interditada por ordem judicial desde 29 de maio, os cones são logo retirados para liberar a passagem dos veículos, dois deles com giroscópios azuis. 

No dia seguinte, às 9h40: a cena a se repete. Um carro, acompanhado por outros dois, com seguranças, avança, apesar da barreira, e cruza a Avenida Niemeyer. Ontem, às 10h05, o Toyota Corolla preto placa LTI-9296, o mesmo que circulava sob escolta nos outros dias, faz o trajeto de novo, proibido para todos os cariocas e turistas. Com películas escuríssimas, não deixa à vista quem está a bordo. Mas os guardas municipais, a postos diariamente ali para impedir o trânsito na via, que deixou de ser uma opção ao trânsito no Rio por risco de desabamentos da encosta, respondem sem dúvidas. Trata-se de Marcelo Crivella .

O prefeito, segundo os agentes, tem usado a rota. Sem tráfego, é possível percorrer os 4km da Niemeyer em menos de dez minutos. O Corolla preto é o carro em que Crivella costuma se deslocar pela cidade. O EXTRA, após o primeiro flagrante, voltou no dia seguinte, sexta, para saber se o veículo, de fato, estava passando diariamente na via interditada.

Equipes de reportagem se posicionaram nas duas barreiras da Niemeyer, uma em São Conrado e outra no Leblon. Novamente, no bloqueio para quem vai da Barra, onde mora o prefeito, à Zona Sul, o veículo passou mais ou menos no mesmo horário e, desta vez, foi fotografado. Questionados, os agentes nos dois bloqueios garantiram se tratar de Crivella e sua comitiva. Ontem, em novo plantão, o EXTRA flagrou o veículo e os guardas voltaram a dizer que era o prefeito dentro do carro.

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Para se assegurar de que o prefeito usava o mesmo carro durante esses dias, o EXTRA seguiu para o Palácio da Cidade, em Botafogo. Às 15h27 de ontem, o Toyota deixou o local, escoltado, como de hábito. A segurança informou que Crivella estava no carro, o mesmo Corolla preto LTI-9296. Após ser informada sobre as fotos registradas pelo EXTRA, assessoria de imprensa do prefeito disse que não comentaria o assunto.

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Desde a interdição da Niemeyer por ordem judicial, Crivella mostra-se inconformado, garantindo não haver risco na pista em dias secos, o que foi contestado por técnicos consultados por determinação da Justiça. Na semana passada, o prefeito representou no Conselho Nacional de Justiça contra a juíza Mirela Erbist — que determinou a interdição da via até que houvesse segurança comprovada na via —, com pedido de abertura de procedimento no Tribunal de Justiça do Rio. Para Crivella, houve abuso de autoridade. Após seguidos deslizamentos de terra da encosta do Vidigal, a Geo-Rio realiza obras de cerca de R$ 31 milhões em vários pontos da Niemeyer.

O Ministério Público do estado informou, por nota, que já há requerimento de aplicação de multa ao prefeito pelo descumprimento da decisão judicial — no processo, o valor atribuído para casos semelhantes é de R$ 120 mil. Segundo o órgão, já havia a informação de que o prefeito estaria usando a via e o fato foi comunicado ao juízo. “Já há, nos autos da medida cautelar, requerimento da aplicação de multa pessoal”, diz a nota.

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Presidente da Associação dos Magistrados do Rio (Amaerj), a juíza da 40ª Vara Criminal , Renata Gil, disse que o prefeito estaria cometendo crime de desobediência à ordem judicial, se usasse a Niemeyer.

“A Amaerj considera um completo desrespeito (à decisão da Justiça) e logo por quem deveria dar exemplo. Se isso se comprovar, é crime de desobediência (pena prevista de 15 dias a 6 meses de detenção). Qualquer cidadão que atravesse uma interdição comete um ato ilegal . As pessoas comuns dão a volta, enfrentam desconforto nos congestionamentos. Como pode todos irem por outros caminhos, e o próprio prefeito entrar numa área interditada?”, questiona.

O advogado cível João Tancredo também diz que a interdição vale para todos. “Se descumpriu ordem judicial, pode ser multado. O Código Civil é claro quanto a isso. Pode ser aplicada a ele e à prefeitura. Usar a via que está interditada em benefício próprio é um escárnio”, observa.

Presidente da Comissão de Trânsito da OAB -RJ, Armando de Souza disse que não o Código de Trânsito Brasileiro não trata autoridades como exceções: “O prefeito só poderia usar a via com autorização judicial.”

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