Registro feito no momento em que Falilatou deixou o presídio. Falilatou Sarouna estende a bandeira do Togo ao encontrar amigos, familiares e apoiadores
Foto disponibilizada pela Karina Quintanilha ao iG
Registro feito no momento em que Falilatou deixou o presídio. Falilatou Sarouna estende a bandeira do Togo ao encontrar amigos, familiares e apoiadores


Togolesa presa na operação Anteros, em dezembro de 2020, Falilatou Estelle Sarouna , deixa a Penitenciaria Feminina da Capital – Carandiru, em São Paulo, neste momento, às 15h da tarde desta quarta-feira (16). O juiz titular da 2ª Vara Criminal de Martinópolis, Alessandro Correa Leite, decidiu pela revogação da prisão preventiva, expedindo um alvará de soltura.

Para o advogado de defesa, Vitor Bastos, esse é o primeiro passo para reparar essa injustiça e provar a inocência de Falilatou.

"É só a primeira vitória, primeira reparação dessa grande injustiça, que colocou uma pessoa inocente na prisão por seis meses. A gente conseguiu reverter a prisão preventiva, mas a luta agora vai ser pela absolvição, porque ela, de fato, não só inocente, também é uma vítima de uma organização criminosa", afirmou.

O advogado se refere aos criminosos que eram alvo da operação Anteros e prováveis responsáveis por forjar e assinatura da togolesa. Essa assinatura foi  usada como única evidência e se tornou a causa para a prisão de Falilatou.  

A doutoranda em sociologia (Unicamp), advogada e integrante do Fórum Internacional Fontié Ki Kwaze – Fronteiras Cruzadas USP, Karina Quintanilha, reforçou a necessidade de cuidado com a saúde física e mental de Falilatou.

"Existe uma preocupação muito grande sobre a saúde física e mental após seis meses presa sem provas, sem dominar o idioma, os códigos culturais e jurídicos, sem visitas, sem alimentação adequada", disse a advogada.

Padre Bernardino, ou Mossi Kuami Anoumou, irmão de Falilatou, que não tem contato com ela desde 15 de dezembro de 2020, afirma que a liberdade de Falilatou enaltece a importância da rede de apoio que ela teve, com advogados, movimentos sociais, ativistas e políticos.

"A liberdade dela me ensinou a importância do trabalho dos movimentos(sociais), dos advogados, o trabalho das pessoas que abraçam a causa dos imigrantes, dos mais vulneráveis. E dizer que quando essas vozes ecoam, a justiça é feita".

Para o advogado de defesa  o caso de Falilatou expõe a necessidade de a sociedade "se manter vigilante para cobrar justiça, em casos que o poder judiciário falha".

"As instituições de direito deveriam, mas não operam perfeitamente por si só. A sociedade tem que se manter atenta e vigilante para cobrar que a justiça seja feita em casos que o poder judiciário falha, e reproduz as desigualdades estruturais que nós encontramos no resto da sociedade".

"Eu acho também que de certa forma serve para escancarar o quanto o Judiciário está contaminado por uma ideologia punitivista, completou.

A repercussão na Câmara Municipal - SP

A Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Câmara Municipal de São Paulo, presidida pelo vereador Eduardo Suplicy (PT), contou com a presença do movimento negro, representantes de movimentos de defesa dos direitos humanos, do Conselho Municipal de Imigrantes, Ouvidoria da Polícia do Estado e Poder Executivo, e discutiu o tema “Falilatou Livre: Vidas Negras Imigrantes Importam”.

O vereador Suplicy, vice-presidente do colegiado, iniciou a reunião abordando como a xenofobia se faz presente no Brasil, segundo a nota publicada no site da Câmara Municipal de São Paulo. 

“Não quero aqui afirmar que seja esse o caso que motiva a prisão de Falilatou, já que sou e sempre fui ao longo de minha vida pública, favorável ao cumprimento da lei e da justiça. No entanto, todas as informações apuradas pela minha equipe e propagadas pelos veículos de comunicação relevantes, como UOL, iG, Alma Preta e outros, nos dão margens para pensar que esse caso pode fazer parte da triste estatística de maus-tratos destinados a pessoas estrangeiras, em especial, os não brancos”.

Para Karina Quintanilha, a liberdade de Falilatou representa "uma conquista da luta contra o racismo e a xenofobia".

"Um passo importante na luta contra o racismo e a xenofobia, contra a naturalização dessas prisões injustas e para que as pessoas migrantes sejam tratadas como sujeito de direitos como prevê a Lei de Migração e a Constituição Federal brasileira", avaliou a pesquisadora.

Karina também informou que há o planejamento de um ato solene na Alesp, com a colaboração da deputada Erica Malunguinho, a Deputada Leci Brandão e os integrantes da Campanha para reivindicar ações contra a criminalização da migração, o racismo e xenofobia. 

"A proposta é seguir pautando o Vidas Imigrantes Negras Importam. Além da reunião extraordinária na Câmara, organizamos uma Live sobre o tema  no Instagram do @VistoAfrica e uma série audiovisual lançada pelo Fronteiras Cruzadas no Youtube (dois vídeos inéditos na próxima semana com apoio da Witness – organização internacional pelo direito de filmar)", completou a integrante do Fórum Fronteiras Cruzadas USP.

A decisão

Na decisão proferida na medida cautelar, o juiz concede a liberdade para Falilatou revogando a prisão.

Uma decisão favorável ao habeas corpus para Falilatou já havia sido publicada anteriormente no portal do Superior Tribunal de Justiça (STJ) na última sexta-feira, às 20h30. O ministro Sebastião Reis Júnior atendeu o pedido da defesa da refugiada, entretanto, o Juiz Alessandro Correa Leite não se manifestou sobre a decisão do STJ pela concessão do habeas corpus, apenas revogou a prisão.

Com isso, o juiz poderá voltar atrás da revogação da prisão futuramente. Bastos afirmou que o próximo passo será "assim que ela sair, embargar essa decisão para que o Juiz se manifeste sobre o habeas corpus do STJ".

A atual decisão ainda cerceia algumas liberdades da migrante. Ela não pode sair da cidade, deve comparecer mensalmente ao juízo do município e ficar em casa à noite e nos "dias de folga".

Juiz revoga prisão preventiva da imigrante togolesa presa injustamente na Operação Anteros
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Juiz revoga prisão preventiva da imigrante togolesa presa injustamente na Operação Anteros



O caso

Falilatou é uma imigrante do Togo, detida na operação Anteros, deflagrada pela Polícia Civil de 2020, para desarticular uma quadrilha que aplicava golpes financeiros. 

O Ministério Público de São Paulo teria apresentado um documento de abertura de conta bancária na Caixa Econômica Federal, contendo a assinatura de Falilatou. Entretanto, a assinatura apresentada é diferente da habitualmente usada por ela. Vitor Bastos, disponibilizou os documentos.

Assinaturas anexadas pela defesa ao pedido de habeas corpus impetrado ao STJ
Doc. disponibilizado pela defesa de Falilatou
Assinaturas anexadas pela defesa ao pedido de habeas corpus impetrado ao STJ










A prisão

Durante a Operação Anteros, agentes da Polícia Civil entraram na casa de Falilatou, mas a migrante estava no trabalho; ela é vendedora ambulante no Brás, São Paulo. Ao retornar para casa, sem entender o que havia acontecido, a togolesa foi até a delegacia fazer um boletim de ocorrência sobre a invasão em sua casa. No mesmo momento, ela foi detida e informada da acusação de um crime que não cometeu.

Registros da casa de Falilatou após ação Policial
Disponibilizado pelo advogado de defesa de Falilatou
Registros da casa de Falilatou após ação Policial










A Campanha "Liberdade para Falilatou" também articula uma vakinha para arrecadar recursos que auxiliem no sustento do filho de Falilatou. A proposta é que com o dinheiro arrecadado, a família consiga trazer o menino do Togo para o Brasil, para viver junto da mãe. Acesse a Vakinha neste link .



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