Falilatou Sarouna migrante do Togo presa, irregularmente, no Brasil
Reprodução/Manifesto Liberdade para Falilatou
Falilatou Sarouna migrante do Togo presa, irregularmente, no Brasil



Falilatou Estelle Sarouna , imigrante do Togo, foi detida ao registrar uma ocorrência de invasão de sua residência, na delegacia da Polícia Civil, onde foi informada de suas acusações e detida.

Falilatou, refugiada no Brasil desde 2014, foi alvo da Operação Anteros, deflagrada pela Polícia Civil, em dezembro de 2020, para desarticular uma organização criminosa, que aplicava golpes financeiros. 

Ela está presa desde então na Penitenciária Feminina da Capital – Carandiru, em São Paulo, segundo seu advogado de defesa, Vitor Bastos,  acusada de fazer parte de um esquema de extorsão.

Entretanto, a prova apresentada pelo Ministério Público de São Paulo, que liga a migrante a uma organização criminosa, é uma assinatura, escrita em letra cursiva, em um documento de abertura de conta bancária. Essa assinatura, entretanto, é diferente da habitual de Falilatou, segundo documento enviado pelo advogado de defesa , Vitor Bastos, no pedido de habeas corpus. 

Assinaturas anexadas pela defesa ao pedido de habeas corpus impetrado ao STJ
Doc. disponibilizado pela defesa de Falilatou
Assinaturas anexadas pela defesa ao pedido de habeas corpus impetrado ao STJ


Para a advogada e pesquisadora do Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC), que atua desde 1997 com mulheres migrantes (incluindo estrangeiras) em conflito com a lei, Cátia Kim, a prova se mostra controversa, pois Falilatou Sarouna é anágrafa (pertence a uma cultura que não faz uso da escrita nos moldes ocidentais). 

Ela não sabe escrever de acordo com os padrões ocidentais e a única prova nos autos do processo seria um documento de abertura de conta, em que o nome dela está escrito completo e com grafia perfeita. Isso nos leva a crer, que não foi ela quem abriu essa conta. Ela não teria como escrever daquele jeito”, explica.

Desde sua prisão, seu filho de 12 anos não recebe os recursos que eram enviados mensalmente pela mãe. Em decorrência dessa situação, a criança parou de estudar e o aluguel do quitinete em que a refugiada mora se acumula desde janeiro. A dívida já ultrapassa os R$ 3 mil, de acordo com Bastos. 

A amiga de Falilatou, Chantal Dagan, também migrante, acredita que ela sofreu um golpe, e é vítima no processo. "É óbvio que alguém se aproveitou dela. A única conta que ela tem, desde que chegou ao Brasil, é uma conta no Itaú. Ela não sabe nem ler, nem escrever. Alguém se aproveitou dela", diz Dagan.

Ela não sabe informar quem poderia estar envolvido na abertura da conta. "A gente não sabe quem realmente fez isso. Ela nunca entrou nesses bancos para fazer nada e esses bancos (agora) estão falando que ela abriu (uma conta). É um golpe, que botou uma inocente na cadeia", afirma.

Para a vereadora Luana Alves (PSOL-SP) a prisão da togolesa envolve xenofobia e racismo estrutural. "São vários aspectos enraizados da sociedade brasileira. Primeiro racismo estrutural, que explica esse movimento de punição contra ela. Também a xenofobia  presente nas investigações da Polícia Civil, que deveria ter um caráter de planejamento, de inteligência, mas tem um caráter punitivista e racista", declara.

O Manifesto

Um movimento virtual "Liberdade para Falilatou" foi criado para apoiá-la e já conta com mais de 1700 assinaturas, entre cidadãos, líderes políticos, entidades e movimentos sociais. 

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O movimento repudia a prisão de Falilatou Sarouna, e reivindica um habeas corpus para que ela e as outras pessoas detidas tenham direito a julgamento individual em liberdade, interrompendo o processo realizado contra um grupo indeterminado de pessoas, sendo ao menos 34 mulheres imigrantes.

Na ação, 210 pessoas foram detidas, sendo 89 imigrantes e 70 de origem africana. Muitos acusados estão sem defesa no processo. Devido à ausência de Defensoria Pública na cidade de Martinópolis, onde o processo se desenvolve.

O manifesto está disponível para assinatura neste link

A prisão

Durante a Operação Anteros, agentes da Polícia Civil entraram na casa de Falilatou, mas a migrante estava no trabalho; ela é vendedora ambulante no Brás, São Paulo. Ao retornar para casa, sem entender o que havia acontecido, a togolesa foi até a delegacia fazer um boletim de ocorrência sobre a invasão em sua casa. No mesmo momento, ela foi detida e informada da acusação de um crime que não cometeu.

Registros da casa de Falilatou após ação Policial
Disponibilizado pelo advogado de defesa de Falilatou
Registros da casa de Falilatou após ação Policial


"Como alguém que vai se apresentar na delegacia é levada assim? Para nós, isso tem a ver, absolutamente, com o fato de ela ser uma mulher negra, imigrante, que está numa situação de extrema vulnerabilidade aqui no Brasil", diz a vereadora.

A doutoranda em sociologia (Unicamp), advogada e integrante do Fórum Internacional Fontié Ki Kwaze – Fronteiras Cruzadas USP, Karina Quintanilha, explica esse processo de marginalização dos imigrantes. 

"O processo de marginalização de migrantes tem uma raiz histórica, bastante significativa. Somente em 2017, conseguimos uma nova Lei de Migração , que substituiu o Estatuto do Estrangeiro, uma legislação da ditadura que tratava imigrantes como ameaça à segurança nacional, a partir de perspectiva de criminalização da migração", explica Quintanilha.

Segundo a pesquisadora, esse cenário explica a "forma como imigrantes, principalmente não brancos, foram tratados, juridicamente, como inferiores na legislação brasileira", acrescenta.


Segundo a defesa, todos os pedidos de revogação da prisão preventivas se quer foram analisados. O MPSP, por sua vez, afirmou que “todos os pedidos de revogação de prisão preventiva estão sendo analisados casuisticamente”. 

A Polícia Civil informa que os trabalhos da operação foram coordenados pela Divisão Especializada de Investigações Criminais (DEIC) de Presidente Prudente e pelo Departamento de Polícia Judiciária de São Paulo Interior 8 (Deinter 8) com apoio Departamento de Operações Policiais Estratégicas (DOPE) e demais departamentos da Polícia Civil de São Paulo e outras seis unidades federativas no inquérito policial que investiga os fatos relatados após 10 dias não retornando mais a unidade.


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