A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) será o colegiado encarregado de analisar uma eventual denúncia contra o ex-presidente Jair Bolsonaro , investigado pela Polícia Federal por tentativa de golpe de Estado.
Ao ser analisado pela Primeira Turma, em vez do plenário da Corte , dado o histórico de decisões alinhadas com o ministro Alexandre de Moraes , é esperado que se dê um tratamento rigoroso em ações penais.
O caso, que envolve o indiciamento de Bolsonaro e 36 outros acusados, incluindo militares, por participação em uma trama para desestabilizar o Estado democrático de direito, deverá ser encaminhado para a Procuradoria-Geral da República (PGR) ainda esta semana, de acordo com informações de fontes próximas ao STF ao jornal O Globo.
A Primeira Turma é composta, além de Moraes, pelos ministros Flávio Dino, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Cristiano Zanin, atual presidente da Corte. Nos bastidores, há a avaliação de que o colegiado adota um posicionamento punitivista, o que pode ser decisivo no caso envolvendo Bolsonaro.
Caso o processo seja encaminhado ao plenário, há uma resistência maior, já que o ex-presidente conta com o apoio de ministros como Nunes Marques e André Mendonça, ambos indicados por ele. Já Dino e Zanin foram indicados pelo atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Alinhamento com Alexandre de Moraes
A Primeira Turma tem se destacado nos últimos meses pelo alinhamento com Moraes, especialmente em ações relacionadas a investigações de grande relevância política.
Em junho, por exemplo, o colegiado decidiu, por unanimidade, dar andamento a um processo penal contra os acusados pelo assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. Naquele caso, a denúncia da PGR foi considerada suficientemente robusta para justificar a abertura da ação, com os ministros seguindo a linha de Moraes ao tornar réus os envolvidos no caso.
Outro exemplo do alinhamento ocorreu em setembro, quando a Turma decidiu, também por unanimidade, manter a prisão preventiva de Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro, acusado de envolvimento em crimes.
Na mesma linha, a Primeira Turma também foi responsável pela decisão que manteve a suspensão da rede social X após descumprimentos reiterados de ordens judiciais. A decisão foi respaldada por todos os ministros do colegiado, com Moraes justificando a medida em razão do desrespeito da plataforma às decisões judiciais brasileiras.
O ex-presidente e seus aliados, por sua vez, tentam diminuir o impacto da investigação, com Bolsonaro alegando que os atos que estão sendo investigados não configuram crimes, mas, ao máximo, infrações administrativas.
A denúncia
O processo contra Bolsonaro e outros envolvidos na tentativa de golpe envolve uma investigação que já resultou no indiciamento do ex-presidente e de 36 pessoas, incluindo militares.
A Polícia Federal concluiu que o plano de golpe envolvia, entre outras ações, o assassinato do então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, do vice-presidente Geraldo Alckmin e do ministro do STF Alexandre de Moraes.
O planejamento para esse golpe, que ficou conhecido como "Punhal Verde Amarelo", foi elaborado dentro do próprio Palácio do Planalto, onde o general Mario Fernandes, então secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência, imprimiu o documento com os detalhes do plano.
Segundo a investigação, em 16 de dezembro de 2022, o general Fernandes imprimiu seis cópias do arquivo que detalhava o plano de assassinatos, o que sugeriria que ele teria distribuído essas cópias em reuniões posteriores com outros envolvidos.
O plano visava não apenas a derrubada do governo, mas a permanência de Bolsonaro na presidência, colocando em risco a integridade de diversas autoridades do país. A investigação também revelou que o militar fez essas cópias a partir do Palácio do Planalto, o que reforça a ideia de que o golpe foi planejado de maneira coordenada e com a participação ativa de membros do governo Bolsonaro.
O processo e as defesas
A defesa de Bolsonaro tem reiterado que o ex-presidente não compactuou com qualquer movimento que visasse desestabilizar o Estado democrático de direito. Em declarações públicas, Bolsonaro negou ter discutido qualquer plano de golpe e afirmou que a palavra "golpe" nunca esteve em seu vocabulário, insistindo que sua postura sempre foi dentro dos limites da Constituição.
O ex-presidente também admitiu, em entrevista recente, o risco de ser preso a qualquer momento, mas continuou a se defender, alegando que os atos investigados, embora planejados, não constituem crimes penais.
Em suas redes sociais, Bolsonaro argumentou que as investigações da Polícia Federal poderiam configurar outros tipos de ilícitos, como infrações administrativas, mas que não havia elementos suficientes para tratá-los como crimes. Ele afirmou ainda que, se fosse o caso, os atos seriam considerados como uma tentativa de minar a autoridade do Estado, mas não um crime passível de prisão.
Ontem, o ex-presidente disse que nunca debateu golpe com ninguém:
"Se alguém viesse falar de golpe comigo, eu perguntaria: 'E o day after ? Como a gente fica perante o mundo?'. A palavra golpe nunca esteve no meu dicionário. Jamais faria algo fora das quatro linhas da Constituição. Dá para resolver tudo nas quatro linhas", afirmou o ex-presidente ao desembarcar em Brasília após uma temporada em Alagoas.
Questionado se temia ser preso, o presidente afirmou acreditar que pode ser detido a qualquer momento:
"Eu posso ser preso agora, ao sair daqui (do aeroporto)."
O que falta?
A PGR, após receber o relatório da PF, terá que decidir se apresenta a denúncia contra o ex-presidente e outros acusados. Caso a denúncia seja aceita, será enviada ao STF, onde a Primeira Turma avaliará se aceita a denúncia e coloca os acusados como réus.
A análise do caso será feita com base nos crimes de tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático de direito e organização criminosa, conforme detalhado pela Polícia Federal.