A Polícia Federal relatou ao Supremo Tribunal Federal (STF) que encontrou indícios de que um grupo liderado pelo deputado federal Josimar de Maranhãozinho (PL-MA), com a participação dos deputados Bosco Costa (PL-SE) e Pastor Gil (PL-MA), teria utilizado um grupo armado, extorsões e saques em dinheiro vivo para desviar emendas parlamentares destinadas a prefeituras do Maranhão.
O GLOBO teve acesso a trechos da investigação, mantida sob sigilo na Corte. Para apurar essa suspeita, a PF cumpriu nesta sexta-feira mandados de busca e apreensão nos endereços desses três parlamentares. Os envolvidos negam a acusação.
Segundo as apurações, um agiota de nome Josival Cavalcanti da Silva, conhecido como Pacovan, emprestava recursos aos parlamentares e recebia os pagamentos por meio de saques em dinheiro vivo desviados de emendas parlamentares. "O deputado federal Josimar Maranhãozinho é quem está à frente da estrutura criminosa, capitaneando não somente a destinação dos recursos públicos federais oriundos de emendas (próprias e de outros parlamentares comparsas) para os municípios, mas também orientando a cobrança (utilizando, inclusive, de estrutura operacional armada), ao exigir dos gestores municipais a devolução de parte dessas verbas", afirma a PF.
Os investigadores identificaram ao menos três alvos ligados ao esquema que atuariam como um braço armado na extorsão dos prefeitos. Um deles, Abraão Nunes Martins Neto, que é ex-policial militar, chegou a confirmar em depoimento à PF que atuava na cobrança de dívidas para Pacovan e que o agiota lhe solicitava que fosse "duro" nessa cobrança. O caso foi relatado à PF pelo então prefeito do município de São José de Ribamar (MA), Eudes Sampaio, que contou ter sido alvo de extorsões do grupo. A PF apreendeu documentos e identificou emendas parlamentares no valor de cerca de R$ 5 milhões que teriam sido usados nos desvios.
Chamou atenção dos investigadores, inclusive, que o deputado Bosco Costa, apesar de ser do estado de Sergipe, destinou uma emenda de R$ 4 milhões à prefeitura de São José de Ribamar, no Maranhão. O objetivo era que R$ 1 milhão, o equivalente a 25%, retornasse em dinheiro vivo aos parlamentares.
"Essa atuação causa ainda mais estranheza se levarmos em consideração que o referido parlamentar foi eleito pelo estado de Sergipe, porém encaminha emendas de alto valor para o Maranhão (base da organização criminosa), indicado que este estado pode ter se tornado um paraíso para o desvio de emendas parlamentares", afirmou a PF.
A investigação também obteve trocas de mensagens e conversas entre os integrantes do grupo criminoso. A PF descreve um áudio enviado pelo agiota Pacovan ao deputado Maranhãozinho, em 9 de junho de 2020. Nele, Pacovan se queixa que o "homi lá do Ribamar (prefeitura onde ocorriam os desvios)" só aceitava negociar diretamente com o parlamentar.
— Deixa eu te falar, ontem eu fui atrás do homi lá do Ribamar. Tentei falar com ele, ele disse que só senta se for contigo. Entende? Ele só paga se for pra você. Ele só resolve as com você. (...) Eu não posso perder, entendeu? Que é 6 milhão. Entendeu? Vai dar um milhão e meio. Que ele tem pra me pagar. E aí e eu perder esse dinheiro? (...) Me diz aí. Qual é a minha situação? (...) É seis milhão e pouco. Vai dar quase um 1,6 milhão de devolução --- diz o áudio transcrito pelos investigadores.
Num dado momento, o agiota demonstra sinais de desespero:
— Se eu perder um dinheiro desses eu endoido. Eu fico louco. Eu não passo de jeito nenhum. Com quem eu fiz negócio eu assumi. Entendeu? Eu quero que você me ajude nisso aí. Pra você tomar a frente --- completou.
Em nota, Maranhãozinho afirmou que contribui e colabora com as investigações "sem medo e sem restrição". "Por essa razão, não consigo entender a espetacularização do ocorrido, que parecer ter sido orquestrado para gerarem grande e rápida repercussão na imprensa regional e nacional. Por isso me pergunto se o objetivo é apenas denegrir minha imagem na tentativa de me tirar da disputa eleitoral", afirmou o deputado. Em perfil nas redes sociais, Maranhãozinho negou ter participado de qualquer ato que "ferisse a legislação", e disse confiar no trabalho da Justiça. O deputado Pastor Gil negou que tivesse cometido irregularidades e disse que "a improcedência dos fatos" sob investigação será comprovada.
Caixa de dinheiro
Em dezembro passado, o GLOBO mostrou trechos de vídeos gravados em ação controlada da PF nos quais o deputado entrega uma caixa de dinheiro a um aliado. As imagens foram feitas por meio da Operação Descalabro, dentro de um segundo inquérito em que Maranhãozinho é alvo, também por desvios de recursos públicos. Nessa investigação, a Polícia Federal concluiu que Maranhãozinho desviou recursos de emendas parlamentares destinados a prefeituras do Maranhão, por meio de pagamentos a empresas ligadas a ele.
Os valores eram sacados em dinheiro vivo e devolvidos ao parlamentar, que também os redistribuía a aliados. O relatório final foi enviado na semana passada ao Supremo Tribunal Federal (STF), sob sigilo. Caberá agora à Procuradoria-Geral da República (PGR) avaliar se apresenta denúncia contra Maranhãozinho.
Maranhãozinho é aliado do presidente do PL, Valdemar Costa Neto , e chegou a cita-lo em áudios gravados pela PF, como mostrou O GLOBO. O PL é o partido ao qual o presidente Jair Bolsonaro se filiou para disputar a reeleição no próximo ano, em uma cerimônia em Brasília que contou com a presença de Maranhãozinho.
Conforme mostrou O GLOBO, o deputado registrou um crescimento patrimonial que superou a sua ascensão na política. Em 2008, quando tentou a reeleição a prefeito de Maranhãozinho, no Maranhão, Josimar declarou que os seus bens somavam R$ 463,9 mil. Dez anos depois, quando concorreu ao cargo de deputado federal, o patrimônio informado foi de R$ 14,5 milhões. Ou seja, uma alta de 1.652%, em valores já corrigidos no período.
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