A alta rotatividade no comando da Casa Civil — se confirmada a ida do senador Ciro Nogueira (PP-AL) , será a quarta troca em pouco mais de dois anos e meio — é reflexo do modus operandi que vem caracterizando o governo: o deslocamento de peças do xadrez político a cada crise que atinge o Palácio do Planalto.
Esta última golpeou a base militar, que pode perder um posto-chave com a saída do general Luiz Eduardo Ramos da Casa Civil. Amigo de longa data do presidente, o militar da reserva, ao jornal “O Estado de S. Paulo”, se mostrou surpreso com a mudança.
"Eu não sabia, estou em choque. Fui atropelado por um trem, mas passo bem", disse ele.
Ramos afirmou ainda que não foi comunicado sobre sua eventual ida para a Secretaria-Geral da Presidência, no lugar de Onyx Lorenzoni. Ele também negou que a má relação com o Congresso, motivo citado por parlamentares, seja a razão da troca:
"Isso, não. Por motivos políticos, óbvio. Se eu estivesse sendo trocado por alguém formado em Oxford, ou Harvard, tudo bem, poderiam dizer que falhei. Mas é por um político aliado do presidente, é assim que funciona".
Desde a posse, em janeiro de 2019, o presidente já mexeu em metade dos ministérios e órgãos com status equivalentes, em um total de 24 mudanças — houve postos que passaram por mais de uma troca.
Nome forte na campanha de Bolsonaro, em 2018, Gustavo Bebianno foi o primeiro exonerado após cerca de dois meses à frente da Secretaria-Geral da Presidência. A demissão veio na esteira de uma crise envolvendo denúncias de supostas irregularidades na gestão de Bebianno à frente do caixa eleitoral do PSL, na época partido do presidente. Bolsonaro e os filhos acusaram o ex-coordenador da campanha de vazar informações para a imprensa, e a demissão acabou chancelada depois que o vereador Carlos Bolsonaro chamou o ex-ministro de “mentiroso”.
Trocas repentinas
Outra baixa importante foi a do ex-juiz Sergio Moro, em abril de 2020, do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Aclamado pelo eleitorado bolsonarista após a atuação na Operação Lava-Jato, Moro foi demitido após desgastes envolvendo supostas tentativas de interferências do presidente na pasta. A gota d’água foi a atuação de Bolsonaro por mudanças no comando da Polícia Federal.
"Esse é um governo sem rumo, que não conseguiu realizar as suas principais promessas de campanha. Com uma avaliação extremamente crítica, até mesmo de apoiadores, Bolsonaro faz essas mudanças na tentativa de retomar uma certa consistência da governança, mas sem obter sucesso", avalia o cientista político José Álvaro Moisés, da USP.
No ministério da Educação, três trocas repentinas foram respostas às crises instaladas no governo. Ricardo Vélez, o primeiro titular, deixou a pasta três meses depois de assumir. Seu substituto, Abraham Weintraub, foi exonerado em junho de 2020 após defender a prisão de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). O sucessor, Carlos Decotelli, foi anunciado, mas nem chegou a tomar posse, depois de inconsistências em seu currículo serem descobertas.
Em meio à grave crisa sanitária, o Ministério da Saúde não ficou fora da dança das cadeiras. Após atritos com Bolsonaro, por divergências na forma de lidar com a pandemia de Covid-19, Luiz Henrique Mandetta foi exonerado em abril de 2020. Seu substituto, Nelson Teich, durou menos de um mês. O general da ativa Eduardo Pazuello assumiu a pasta interinamente e foi efetivado logo depois, mas não resistiu ao recrudescimento da crise e aumento no número de mortes pelo novo coronavírus.
A chegada de Ciro Nogueira ao Palácio do Planalto, se confirmada, representará uma alteração de perfil: depois de dois generais, Luiz Eduardo Ramos e Walter Braga Netto, o posto seria ocupado não só por um político, mas por um dos principais líderes do Centrão, que já apoiou diversos outros governos. Segundo Moisés, as mais recentes trocas corroboram para posicionar o grupo como grande avalista da gestão Bolsonaro na tentativa de melhorar a articulação política:
"Quando se deparou com insucessos em diversas votações no Legislativo, Bolsonaro fez inúmeras concessões".