Com 86 votos a favor e nenhum contra, a Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) aprovou o afastamento por 180 dias do deputado Fernando Cury (Cidadania), punido por assédio sexual contra Isa Penna (PSOL). A pena, inicialmente uma suspensão de 119 dias, foi ampliada após acordo costurado de última hora com as lideranças partidárias.
Cury, flagrado apalpando o seio de Isa Penna no plenário da Alesp em 16 de dezembro, ficará sem salário por seis meses e seu gabinete, sem verba. A partir de agora, a Assembleia deve convocar o suplente do deputado, Padre Lobato (PV).
O rigor da punição a Fernando Cury foi motivo de confusão desde a última quarta-feira, quando o plenário se preparou para a votação, e travou a definição do caso. O projeto de resolução proposto pelo Conselho de Ética foi considerado brando por alguns parlamentares, mas o presidente Carlão Pignatari (PSDB), baseado num parecer da Procuradoria da Casa, afirmou que não seria possível modificá-lo.
Mesmo assim, Pignatari foi pressionado durante as sessões da última quarta e decidiu convocar uma reunião com o Colégio de Líderes para esta manhã, onde uma alternativa mais rigorosa começou a ser construída.
A nova opção teve apoio do PSOL. Isa Penna disse não estar satisfeita com o afastamento de 180 dias, mas declarou ser uma pequena vitória não aprovar o texto proposto pelo Conselho de Ética, formulado por cinco homens.
"É lamentável que o possível desta Casa seja (um afastamento de) seis meses. Isso não quer dizer que me convenceram de que o Cury não mereça ser cassado. Mas eu não faço política no parlamento que eu quero, faço política no parlamento que existe", declarou Penna.
Ainda que 20 parlamentares tenham se manifestado a favor cassação no último fim de semana, o afastamento foi comemorado principalmente pelas mulheres da Casa.
"Hoje estamos dando uam resposta à sociedade. A Alesp está punindo uma transgressão. A primeira condenação para que nunca mais atos desse tipo possam ferir a ética e o decoro parlamentar da Assembleia", afirmou Maria Lúcia Amary (PSDB).
Pignatari chamou o episódio de "um dos momentos mais sensíveis da história desta Casa" e disse que ele "não deixa dúvidas da reprovação da conduta (de Cury) e da solidariedade ao outro".
"Espero, do fundo do coração, que nunca mais tenhamos nenhum tipo de ato como esse", declarou o presidente.
Penna teve apoio de colegas mulheres de diferentes espectros ideológicos. A sessão da quarta-feira foi marcada por declarações firmes de deputadas contra a atitude de Cury, com destaque para Márcia Lia (PT), Professora Bebel (PT), Patrícia Bezerra (PSDB), Delegada Graciela (PL), Janaina Paschoal (PSL) e Valéria Bolsonaro (PSL).
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Nesta quinta, desafetos de Isa Penna se posicionaram em prol de Cury. O bolsonarista Douglas Garcia (PTB) usou seu tempo de debate para criticar o movimento feminista, a que chamou de "demoníaco".
"O movimento feminista existe única e exclusivamente para trazer às mulheres uma espécie de doença mental e, graças a Deus, não tem se proliferado sobre a maioria delas. Quer agir com uma verdadeira agenda nefasta demoníaca de destruição", afirmou Douglas.
Frederico d'Avila (PSL) defendeu Cury, chamou o assédio cometido pelo colega de "deslize".
"Está se fazendo uma carnificina, um massacre por conta de um deslize. Nós não podemos tomar uma atitude totalmente desproporcional por aquilo que aconteceu. A gente sabe muito bem que a deputada Isa Penna e o PSOL vão usar esse tema ad aeternum pra explorar essa situação a seu favor", disse d'Avila.
Isa Penna afirmou que a punição a Cury, aprovada por unanimidade, é um "momento histórico" da Alesp. Foi a primeira vez que um deputado teve o mandato suspenso por importunação sexual.
"Deixamos um recado para a sociedade: a Alesp não aceitará assédio, nós, mulheres, não iremos aceitar assédio, seja ele moral, sexual ou psicológico. Estaremos lado a lado com todas as mulheres."
Em 16 de dezembro, durante uma votação do orçamento estadual no plenário da Alesp, Fernando Cury abraçou Isa Penna por trás, enquanto ela conversava com a Mesa Diretora, e apalpou seu seio, sem consentimento . A deputada então denunciou o colega ao Conselho de Ética por importunação sexual.
Ao colegiado, Cury negou ter tido a intenção de assediá-la e descreveu a abordagem como "um abraço rápido e superficial" e "um gesto de gentileza". Por cinco votos a quatro, a comissão aprovou uma punição de 119 dias de afastamento ao acusado no lugar da sugestão do relator, Emídio de Souza (PT), de uma suspensão de seis meses.
A deputada, por sua vez, declarou que a decisão do conselho havia sido um "tapa na cara de todas as mulheres". Desde então, milhares de ativistas passaram a cobrar os deputados a votar a cassação de Fernando Cury e lançaram a campanha #CuryCassado. O movimento feminista tem tratado o caso como um marco da luta feminista no estado.