A forte pressão de integrantes da Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos e da ala mais ideológica do governo e a reação àsprovocações do prefeito de Nova York levaram o governo a repensar a viagem de Jair Bolsonaro aos Estados Unidos, onde ele seria homenageado no dia 14. Mas, desta vez, o evento — origem de uma série de polêmicas — pode ser transferido para outra cidade, em um estado mais "neutro" ou "republicano", o que poderia reduzir a intensidade dos protestos que estavam marcados para a visita do presidente brasileiro.
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Dois dias depois de anunciar que havia desistido da viagem a Nova York, alegando que sofrera "ataques deliberados da prefeitura" nova-iorquina e de grupos que "ideologizaram" a premiação de "Personalidade do ano", que receberia em jantar de gala da Câmara, Bolsonaro afirmou, neste domingo (6), que vai viajar ao país. "Eu vou para os Estados Unidos. Eu vou para os Estados Unidos", disse ele e repórter presente na entrada do Palácio da Alvorada.
A decisão da retomada da viagem pode ser anunciada nesta segunda-feira (7). Desde que foi confirmado o cancelamento da participação de Bolsonaro na premiação, na noite de sexta-feira, iniciou-se uma forte mobilização para encontrar uma saída ao impasse — principalmente pelo fato de, até agora, o Planalto não ter anunciado o nome que substituiria o presidente na premiação, deixando espaço para manobras.
A forma como o prefeito de Nova York reagiu ao cancelamento, escrevendo no Twitter que Bolsonaro "fugiu" e que "valentões em geral não conseguem 'dar um soco'", mexeu com brios de parte do governo. Em especial, de quem já estava contra o cancelamento da viagem de Bolsonaro, como o assessor especial de assuntos internacionais da Presidência, Filipe Martins, que achou a decisão de sexta-feira um excesso de zelo. Protestos ocorrem a toda hora em Nova York, sempre com segurança.
Por outro lado, a Câmara nunca cancelou a premiação, tradicional e mais importante evento da instituição. Em nota na própria sexta-feira, afirmou que o jantar de gala estava mantido, bem como outros eventos em paralelo, como encontros de investidores com o ministro da Economia, Paulo Guedes.
Desde que se tornou pública a decisão de Bolsonaro de não ir a Nova York, a Câmara iniciou a argumentação para tentar demover o líder brasileiro desta ideia. A solução mais próxima de ser anunciada é manter a premiação, mas realizá-la em outro local. Desta vez, ela — que já foicancelada do Museu de História Natural e foi rejeitada pelo Cipriani Hall — poderia ocorrer em outra cidade. Fontes próximas da organização informam, sob sigilo, que uma das possibilidades é ocorrer em outro estado.
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A organização chegou a tentar realizar o jantar de gala, que também homenageará Mike Pompeo, secretário de Estado americano, no Trump Hotel de Nova York — local permanentemente vigiado pela polícia e com um esquema especial para protestos. Mas o estabelecimento não comporta o evento. Como Bolsonaro já teria uma agenda em Miami, a premiação da Câmara poderia ocorrer na Flórida, estado mais dividido ideologicamente, onde Trump, por exemplo, venceu as eleições em 2016 e, em novembro, elegeu governador e senadores republicanos.
Temor de 'agenda negativa'
A escolha de Bolsonaro como personalidade do ano gerou polêmicas desde o início. Algumas empresas integrantes da Câmara apontaram ser uma decisão muito política e que não se justificava em um governo tão embrionário. O fato de Bolsonaro ser o primeiro presidente em exercício a ser agraciado com a honraria também foi visto como algo exagerado.
Logo que ativistas ambientais, do movimento LGBT e de defesa das minorias começaram a protestar, levando ao sucessivo cancelamento de sedes do evento, a situação ficou ainda pior. Ao menos três empresas desistiram de patrocinar o evento. Alguns participantes acreditam, inclusive, que todo este episódio vai gerar um forte dano à imagem da Câmara, com possível fuga de sócios. Para tentar evitar uma debandada, a melhor maneira seria manter o evento e contar com a participação de Bolsonaro.
Nos bastidores, os que defenderam o cancelamento da viagem temem por uma agenda negativa. Bolsonaro estreou de maneira ruim no cenário internacional, com a viagem ao Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça, onde, segundo até apoiadores do presidente, ele perdeu a oportunidade de mostrar sua proposta ao mundo na inédita palestra de abertura de um presidente da América Latina no concorrido evento.
As seguintes viagens, aos EUA
, Israel e Chile, foram consideradas boas — apesar de Bolsonaro não ter cumprido sua promessa de transferir a embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém e ter conseguido desagradar judeus com uma fala sobre o Holocausto. Para muitos, esta viagem aos EUA, cercada de protestos, pressão e agenda negativa, poderia ser o pior fiasco internacional do governo até o momento.
Bolsonaro, contudo, tem um novo encontro marcado com Nova York: tradicionalmente cabe ao presidente brasileiro abrir os discursos na Assembleia Geral da ONU, em setembro, na sede da entidade na cidade. Como no evento não é raro irem mais de cem chefes de Estado, incluindo ditadores que são proibidos de entrar nos EUA, mas com licença diplomática para estar na cidade devido à sede do organismo, por exemplo, há estrutura anti-protestos, que ocorrem de forma simultânea contra quase todos os presidentes e líderes que participam da assembleia.
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Antes disso, Bolsonaro tem viagens marcadas para a Argentina — país que tem criticado e que, segundo ele, "preocupa mais que a Venezuela" — e para o Japão. Na nação asiática, ele participará da cúpula do G20, grupo dos vinte maiores países do planeta, que foi justamente criado sob forte influência de Luiz Inácio Lula da Silva, o principal antagonista do presidente na política brasileira.