A descoberta do esquema de candidaturas femininas de fachada – ou "laranjas" – apenas para que os partidos atingissem o percentual mínimo de mulheres definido pela lei trouxe de volta a discussão sobre a validade da cota para candidatas nas eleições. Só no primeiro mês de trabalho do Legislativo foram apresentados dois projetos que visam combater o desvio de recursos a partir de candidaturas de fachada. As informações são do jornal Folha de S. Paulo
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O primeiro deles, de autoria do senador Major Olimpio (PSL), propõe o fim do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, também chamado de fundo eleitoral. Hoje, os candidatos recebem recursos desse fundo, do fundo partidário e de doações voluntárias de pessoas físicas. Desde 2015, são vetadas as doações de empresas a partidos e postulantes a cargos políticos.
O fim do fundo eleitoral impacta direta e negativamente na candidatura de mulheres porque, desde o ano passado, as legendas são obrigadas pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) a reservar pelo menos 30% dos recursos desse fundo para financiar as campanhas femininas. Esse mesmo percentual também passou a ser considerado para o tempo de propaganda eleitoral no rádio e na TV.
Já a proposta que acaba de vez com a cota para mulheres foi apresentada pelo senador Angelo Coronel (PSD). Na justificativa, o parlamentar argumenta que a participação feminina nas últimas eleições não mudou muito em relação ao patamar histórico. "Parto do princípio de que as mulheres querem ter igualdade com os homens. Se querem igualdade, não precisa ter cota", diz Coronel.
No Congresso, há mulheres que concordam com ele. "Sou contra qualquer tipo de estipulação de cotas, seja para questões de raça, de 'opção' sexual, de gênero. Penso que as cotas, antes de incluir, excluem. São preconceituosas", afirma a senadora Selma Arruda (PSL). "Se não temos mulheres suficientes porque elas não se interessam ainda, por questão cultural, não será impondo cotas que nós vamos conseguir", completa.
Outros parlamentares – de ambos os gêneros – acreditam ser absurdo usar as candidaturas laranjas como pretexto para acabar com as cotas para mulheres. "O problema é o crime, não o princípio. A reserva de vagas é um princípio para garantir a paridade da participação feminina nas eleições", afirma o líder da Rede no Senado, Randolfe Rodrigues.
Para a senadora Eliziane Gama, do PPS, o fim das cotas é uma "desculpa" para o retrocesso daqueles que nunca admitiram a participação de mulheres na política. "[É] A nossa exclusão do cenário", argumenta. A opinião é compartilhada por Daniella Ribeiro, líder do PP no Senado: "O que falta é fiscalização, investigação, punição para quem faz. E não retirar um direito conquistado, que foi muito difícil conseguir", defende.
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Hoje, apenas 12 dos 81 senadores – ou 15% – são mulheres. É o mesmo percentual encontrado na Câmara, onde 77 dos 436 deputados são mulheres. Se os projetos apresentados por Olimpio e Coronel forem aprovados até outubro, as novas regras serão válidas já para as eleições municipais de 2020.
Escândalo das laranjas
No mês passado, uma reportagem publicada pela Folha revelou que diversos partidos usaram mulheres como candidatas laranjas nas últimas eleições a fim de atingirem a cota mínima imposta pela lei. Uma das legendas que adotou a prática foi o PSL, do presidente Jair Bolsonaro.
Segundo o jornal, o deputado federal Marcelo Álvaro Antônio, o mais votado em Minas Gerais, patrocinou um esquema de quatro candidaturas de fachada, todas financiadas com verba pública do PSL. À Folha , o parlamentar negou "a suposição com base em premissas falsas de que houve simulação de campanha com laranjas no partido”. O caso está sendo investigado pela Polícia Federal e pelo Ministério Público mineiro.
As denúncias levaram à demissão de Gustavo Bebianno , antigo ministro da Secretaria Geral da Presidência e presidente do PSL na época das eleições, mas o cargo de Marcelo Álvaro Antônio como ministro do Turismo foi mantido. Integrantes do PSL questionaram sua continuidade no governo.