Com uma polêmica atrás da outra, os áudios das conversas entre o empresário Joesley Batista, um dos donos do grupo J&F, e o diretor de Relações Institucionais da empresa, Ricardo Saud, divulgados nesta quarta-feira (6), pelo Supremo Tribunal Federal (STF) , revelam os planos de Joesley para atingir ministros da Corte, membros da PGR e evitar sua prisão.
Uma das gravações entre os delatores indicam que eles planejavam usar o ex-ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para atingir ministros da Suprema Corte. A ideia era gravar uma conversa com Cardozo na tentativa de identificar os ministros sobre os quais ele poderia ter influência. “Depois vamos botar tudo na conta do Zé", diz Joesley no áudio divulgado pelo STF .
Após afirmar que entregaria o presidente da República, Michel Temer, o empresário – um dos donos da JBS – informa que caberia a Saud entregar o ex-ministro, o que ocorreria depois do contato a ser feito pelo próprio Joesley com Cardozo. "Eu vou entregar o [chefe do] Executivo, e você vai entregar o Zé. Vou ligar para o Zé e chamar ele para trabalhar conosco. Vou dizer que a gente precisa organizar o Supremo e vou perguntar quem ele tem e qual influência que tem neles [ministros]. Ele vai entregar tudo”, afirma Joesley.
"Vou chamar o Zé e dizer a ele que a casa caiu e que preciso dele; que vamos ter de montar nossa tática de guerra. Depois vamos botar tudo na conta do Zé", reforça o dono da JBS. “E se a gente pegar o Zé, a gente pega o STF”, acrescenta Saud.
Em outro trecho da gravação, os dois empresários insinuam que uma advogada da equipe que defende a JBS [supostamente Fernanda Tórtima] teve um relacionamento amoroso com o ex-ministro da Justiça. “[Ela] surtou por causa do Zé, porque sabia que, se a gente entregar o Zé, ele entrega o Supremo”, diz Joesley.
Em outra parte da conversa, o empresário diz que Fernanda ficou preocupada com a possibilidade de a delação atingir ministros do Supremo. “E aí até a Fernanda perdeu o controle. Ela falou: ‘Nossa Senhora, peraí, calma, o Supremo, não, peraí, calma, vai f* meus amigos”, acrescenta Joesley.
Os delatores planejam, em outra parte do áudio, estratégias para se aproximar também de integrantes da Procuradoria-Geral da República (PGR), em especial do procurador-geral, Rodrigo Janot. Para tanto, usariam uma pessoa chamada Marcelo – que seria o ex-procurador Marcelo Miller. “Nós somos do serviço. Nós vamos virar amigo e funcionário do Ministério Público e desse Janot. Vamos falar a língua deles. Quer conquistar o Marcelo? Você já achou o jeito. É só chamar esse povo de bandido, e eles vão dizer; 'agora vocês estão do nosso lado'”, afirma Joesley.
"Ele [Marcelo] já contou para o Janot que a gente tem muito mais para contar. Marcelo é do MPF. Ele tem linha direta com o Janot e com outros de lá. Nós somos a joia da coroa deles. O Marcelo já descobriu e falou para o Janot: 'Janot, nós já temos o pessoal que vai dar todas as provas que precisamos", afirma Joesley.
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Em nota à imprensa, divulgada na terça-feira (5), o ex-procurador Marcello Miller disse que "tem convicção de que não cometeu qualquer crime ou ato de improbidade administrativa".
Confiança
Durante a conversa, Joesley demonstra confiança e diz que o esquema planejado não prejudicará o grupo empresarial. Ele diz a Ricardo Saud que entende o que o Ministério Público está fazendo e que tem certeza de que não corre risco de ser preso. “Nós não vamos ser presos, ponto”. Saud reage com um pouco mais de dúvida, mas o dono da JBS o contesta reafirmando que está calmo porque sabe exatamente o que está se passando nas investigações.
“Eu posso estar completamente enganado, eu acho que eles não estão fazendo isso orquestradamente. Agora, eu acho que eles estão fazendo isso achando que nós não estamos entendendo, mas eu estou entendendo. Quem não está entendendo está em pânico. Como eu estou entendendo, não estou em pânico”, ressalta Joesley .
O empresário diz acreditar que será pressionado por Janot para falar tudo o que sabe, mas que também seria protegido por este. “Seria a reação natural. Pensa você no lugar do Janot; senta na cadeira do Janot. Ele sabe tudo. Aí, o Janot espertão bota para f*, põe pressão [na gente] para entregar tudo. Mas [diz também] 'não mexe com eles'. Ele diz 'pode f*, dá pânico neles, mas não mexe com eles [delatores da JBS]'.”
“Ricardo, diante do contexto de quem nós somos, do que a gente tem pra falar, o que a gente representa, tudo, dentro do jogo, do MP com não sei o quê... É um carteado, né? Uma aposta. Eu posso tá completamente enganado, sabe? Eu duvido que esse Janot não queira nossa delação, eu aposto 100 pra um, não é 10 pra um, é 100 pra um. Pensa o que eles fizeram hoje, uma operação idiota enfiando nós, isso é de dar risada... O que eles fizeram hoje é de dar risada. Eu queria estar em frente ao Janot e dizer 'para, isso é coisa de menino, para, uma operação idiota dessa? Você bota 1100 homens na rua em troca de nada achando que vai me amedrontar? Para, você tá louco?'”.
O dono da JBS desafia o procurador e minimiza o impacto das operações. “Ele não sabe com quem ele tá lidando, ele tá achando que ele tá lidando com um menino amarelo. Aí eu vou chegar lá e dizer assim: 'Janot, nessa escola sua eu sou professor, você tá tendo aula, eu fui professor. Para, o que que é isso? Que brincadeira, eu tô achando até engraçado isso, é ridículo, para'. Ricardinho, na escola que eles estudam a gente é professor”, ironizou Joesley.
Saud , então, afirma que a confiança de Joesley é parecida com a de Marcelo, que, segundo ele, teria dito que as operações seriam positivas para o grupo. Joesley afirma que concorda com então procurador e que a pressão das investigações deve continuar “para a opinião pública”, e pode justificar a ação dos empresários em delatar para se livrarem das penas.
“Ricardinho, confia em mim, é o seguinte, vamos conversando tudo, nós vamos tocar esse negócio, nós vamos sair lá na frente, nós vamos sair amigo de todo mundo, e não vamos ser presos e vamos salvar a empresa”, declarou Joesley.
Nova investigação
O conteúdo das gravações levou Janot a abrir uma investigação para avaliar a omissão de informações nas negociações das delações de executivos da JBS. Se comprovada a omissão, os benefícios concedidos aos delatores poderão ser anulados. Com o acordo de delação, Joesley e os demais executivos não foram presos e puderam deixar o País.
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A possibilidade de revisão ocorre diante das suspeitas dos investigadores do Ministério Público Federal (MPF) de que o empresário Joesley Batista e outros delatores esconderam informações da Procuradoria-Geral da República. A PGR também suspeita que Miller atuou como “agente duplo” durante o processo de delação. Ele estava na procuradoria durante o período das negociações e deixou o cargo para atuar em um escritório de advocacia em favor da JBS.
No entendimento do procurador-geral, mesmo se os benefícios dos delatores forem cancelados, as provas contra as pessoas citadas deverão ser mantidas, dando sequência às investigações. No entanto, a decisão final cabe ao STF.
* Com informações da Agência Brasil