“A todo momento ele pergunta pelo pai. O meu filho de seis anos acha que o pai vai voltar. Ele pergunta se o pai vai voltar ou foi morar com Deus”. A fala é de uma universitária de educação física de 25 anos, esposa de Jhonathan Klando Pacheco, de 26, um dos mortos pela Polícia Militar. A estudante de Educação Física conta que o marido estava desaparecido desde a tarde do último sábado. Só mais de 24 horas depois o corpo do homem foi encontrado. A mulher alega que Jhonathan “estava dentro de casa quando foi retirado e executado”.
Após reconhecer o corpo do marido no Complexo do Salgueiro, a jovem seguiu para a Delegacia de Homicídios de Niterói, São Gonçalo e Itaboraí (DHNSGI) onde presta depoimento nesta tarde.
"Foi um dia normal. Ele estava deitado com o meu filho de 6 anos. Eles iam arrumando de casa em casa. Eles fizeram uma varredura e levaram todos os homens que suspeitavam que era bandido. Ele estava em casa e fizeram essa arruaça. Eles estão lá já dois dias. Vivemos momentos guerra e a todo tempo a gente estávamos se jogava no chão", disse.
O casal e o filho moravam na comunidade já dois anos.
"A gente era casados há 9 anos. Ele era uma pessoa boa, sorridente, ajudava os moradores com cesta básica quando podia. Eles vão falar que ali era pai de família? O Estado só entra para matar", destacou a universitária que após o depoimento seguiu para o IML de Tribobó para recolher o corpo do companheiro.
Polícia Civil vai investigar PMs por não ter acionado delegacia
O delegado que apura os responsáveis pelas dez mortes na localidade da Palmeira, no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, Bruno Cleuder, afirmou que vai investigar o motivo de a Polícia Militar não ter comunicado o fato à Delegacia de Homicídios de Niterói, São Gonçalo, Itaboraí e Maricá (DHNSGI). O delegado não quis dar entrevista, assim como o promotor da 2ª Promotoria de Investigação Criminal de São Gonçalo.
Pelo menos dez pessoas foram mortas no último fim de semana no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo. Um dos mortos foi sargento da PM Leandro Rumbelsperger da Silva, de 40 anos, do 7º BPM (São Gonçalo), ainda na manhã de sábado.
Outras oito vítimas foram encontradas na manhã desta segunda-feira em numa área de mangue. Os próprios moradores fizeram a retirada dos corpos, já que a Polícia Civil só chegou ao local 15 horas após o crime.
A informação de dez mortes havia sido passada pela Polícia Militar, que, ainda na tarde desta segunda-feira, informou que o número englobava os mortos de todo o fim de semana. Entre os mortos está Kauã Brener Gonçalves Miranda, de 17 anos. Segundo familiares, o jovem era o mais velho de cinco irmãos e estava com amigos.
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"Todo mundo gostava dele. Era um irmão bom. Não entendemos o que aconteceu. Minha mãe está a base de remédios com essa tragédia", disse a estudante Kailane Jully Gonçalves, de 15 . "É o mais velho de cinco irmãos irmãos", completou.
A desempregada Milena Menezes Damasceno, de 35 anos, é irmã do ajudante de pedreiro Rafael Menezes Alves, 26 anos, conhecido como Bob. Segundo a mulher, o irmão está entre os mortos. Desde as primeiras horas do dia, ela vela o corpo do irmão caçula de cinco filhos:
"Meu irmão era nascido e criado aqui. Ele era ajudante de pedreiro e estava na rua quando tudo aconteceu. Ele estava bebendo com os amigos quando os policiais arrastaram ele e fizeram isso."
A funcionária pública Cleonice da Silva Araujo, de 56, veio de Maricá, para acompanhar a retirada do corpo do irmão Hélio da Silva Araujo, de 53. Ela afirma que o irmão foi morto.
"Aqui ninguém tinha nada contra ele. Se fosse um tiro eu até aceitava. Mas eles degolaram o meu irmão. Infelizmente, a justiça funciona assim. Ele morava aqui há 10 anos. Enquanto continuarem assim, muitas vítimas serão mortas desse jeito", denunciou.
Idosa baleada
Uma idosa foi baleada no fim da manhã deste domingo no Complexo do Salgueiro. Em nota, a Polícia Militar informou que o 7º BPM foi verificar uma ocorrência envolvendo a entrada de uma pessoa ferida no Hospital Estadual Alberto Torres (HEAT), em São Gonçalo. O órgão afirmou que a situação foi constatada na unidade de saúde e que não havia informações sobre as circunstâncias da ocorrência, que foi encaminhada para a 72ª DP (São Gonçalo).
- Os confrontos se iniciaram na manhã do sábado, quando o sargento Leandro Rumbelsperger da Silva, de 40 anos, morreu após ser atacado por criminosos durante um patrulhamento no Complexo do Salgueiro.
- Logo após a morte do sargento, o Batalhão de Operações especiais foi acionado para realizar uma ação no local.
- Durante dois dias houve intensos tiroteios na região, entre criminosos e o Bope
- Na manhã de domingo, uma idosa moradora da região foi baleada. Ela teve ferimentos nos braços e teve alta ainda no domingo.
- Por volta de 15h de domingo, uma equipe do SAMU foi acionada ao Salgueiro por conta de um indivíduo ferido e criminosos armados obrigaram a retirada deste do local. O homem foi a óbito e reconhecido por policiais do 7ºBPM como um dos envolvidos no ataque criminoso à guarnição no sábado
- Por volta das 18h do domingo o Bope deixa o Complexo do Salgueiro e, segundo a polícia militar, faz um registro na 72{ DP (São Gonçalo) sobre o material apreendido e também comunica a ocorrência do óbito.
- Na manhã desta segunda-feira, circula as imagens de moradores retirando oito corpos do mangue e os colocando em um terrenos baldio próximo ao local do confronto.
- A Polícia Civil é acionada para realizar a perícia no local, 12 horas depois da saída do Bope. A Delegacia de Homicídios de Niterói, São Gonçalo e Itaboraí (DHNSG) diz que chegou ao local em menos de três horas depois de acionada
A PM disse ainda que, na tarde deste domingo, agentes do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) atuaram no Complexo do Salgueiro, após informação de que um dos indivíduos que atacaram a equipe do 7º BPM, no último sábado, estaria ferido ainda no interior desta região.
As equipes foram atacadas nas proximidades de uma área de mangue com mata, ocorrendo um intenso confronto. Na ação, foram apreendidos duas pistolas, munição calibre 9 mm, 56 munições de fuzil calibre 762, cinco carregadores (02 para fuzil e 03 para pistola), um uniforme camuflado, 813 tabletes de maconha, 3.734 sacolés de pó branco e 3.760 sacolés de material assemelhado ao crack. A ocorrência foi registrada na 72ª DP.