Sob efeito de um violento surto psicótico, causado pelo uso contínuo de crack e cocaína por quatro dias seguidos, o traficante e ex-presidiário ameaça jogar seu filho, de 11 meses de idade, da sacada de um balcão a 10 metros de altura da rua. O neném já apresenta claros sinais de hipotermia. A situação atinge seu limite quanto o individuo pega um longo caco de vidro, ameaça cortar a criança e na sequencia passa uma perna por cima da mureta do balcão com a clara intenção de se jogar com o filho. Policiais Militares do GATE, Grupo de Ações Táticas Especiais, entram em ação.
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Cerca de 8 horas antes, no dia 27 de janeiro às 8:00hs da manhã, PMs do 26º Batalhão, que estavam em patrulhamento regular, notaram uma movimentação estranha no terceiro andar de uma casa e pararam para investigar. Vizinhos disseram que um homem ameaçava se suicidar por causa de uma briga com sua esposa. Os Policiais isolaram a área e solicitaram apoio dos Bombeiros, que possuem treinamento adequado para lidar come esse tipo de ocorrência. Em pouco tempo a ameaça de suicídio escalou para sequestro e ameaça de homicídio, quando o homem fez seu filho de refém, ameaçando arremessar a criança da sacada. Nesse momento essa ocorrência adquiriu outra dimensão e o GATE foi acionado.
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“Chegamos no local às 9:40hs com uma equipe de 23 PMs e encontramos o perímetro e a segurança do local estabelecidos. O Capitão Diógenes dos Bombeiros e o Tenente PM Nogueira do 26º passaram os detalhes e a partir deste ponto assumimos a ocorrência. Após uma avaliação tática inicial, dei a ordem para os Atiradores de Elite se posicionarem e para que a Equipe de Invasão Tática e os Negociadores subissem até a cômodo que dava acesso à sacada onde estava o agressor”, conta o Major PM Racorti, Comandante do GATE.
Opções de negociação e resgate
Em ocorrências como esta, que envolvem reféns, o procedimento inicial do GATE é o uso do time de Negociadores com objetivo de resolver a situação sem que os criminosos recorram ao uso de violência física contra o refém e contra os próprios Policiais. Uma das principais dificuldades do processo de negociação é lidar com sequestradores barricados em locais de difícil acesso e que estejam sob efeito de drogas, já que sua capacidade de raciocínio é drasticamente diminuída, e na maioria das vezes ficam altamente agressivos. Foi exatamente o que aconteceu nesse caso.
“Já posicionados, meus homens me passaram os detalhes táticos de todo cenário e percebi que teríamos problemas. A sacada onde o traficante segurava o bebê possuía apenas 30cm de largura, fazendo com que a criança ficasse continuamente exposta ao risco real de queda de 10 metros de altura. Para piorar, o acesso para essa sacada não era por uma porta e sim por uma janela, e isso limitava muito as minhas opções. Naquele momento teríamos como principal alternativa o uso da equipe de Negociadores, para preservar a vida da criança e do agressor”, relata o Major.
A opção de usar o time de Invasão Tática para pular a janela, acessar o balcão, imobilizar fisicamente o agressor e garantir a segurança da criança era muito arriscada. Esse tipo de ação exige surpresa, rapidez e uso de vários Policias ao mesmo tempo. O acesso pela janela e o pequeno espaço do balcão impediam a conjugação desses três elementos, aumentando muito a chance do traficante perceber a ação dos PMs e arremessar a criança ou pular.
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O uso da arma de choque também foi descartado. Além da descarga elétrica poder ser transmitida para a criança, o pai iria perder o controle muscular e largar a criança, criando um risco inaceitável dela cair da sacada para a rua. O disparo do Atirador de Elite também foi desconsiderado pelo mesmo motivo: a neutralização do traficante implicaria na possibilidade real da queda da criança.
Para cobrir todas os possíveis cenários os Bombeiros montaram uma estrutura de proteção com colchões e redes logo abaixo de um pequeno telhado que ficava entre o balcão e a rua. Esse seria o último recurso, caso o pai jogasse a criança ou decidisse pular.
Momento crítico
Apéos 6 horas de negociação, os médicos alertam o GATE que o neném apresentava sinais visíveis de hipotermia, em função do longo tempo de exposição à chuva, e que a criança também precisava ser alimentado com urgência. Nesse momento o traficante, cada mais agressivo e violento, ameaçou cortar a criança com um caco de vidro e na sequencia subiu na mureta para pular. O Major Racorti resolve alterar o curso de ação e iniciar o procedimento operacional de negociação tática.
“Naquele momento tive que reavaliar a situação e rever minhas opções. Decidi que o melhor curso para terminar essa ocorrência, preservando a integridade física de todos envolvidos, seria o uso do time de Invasão Tática. Para isso posicionei esses PMs no cômodo que dava acesso ao balcão, atrás da parede e nas laterais da janela que dava acesso ao balcão. A ideia era atrair o agressor para bem perto da janela e nesse momento meus homens dariam o bote, resgatando a criança e imobilizando o pai. Usei um familiar para atrair o traficante e quando ele se aproximou, meus homens entraram em ação e conseguiram imobiliza-lo”, diz o Comandante do GATE.
Sem o disparo de nenhum tiro e sem ninguém se ferir, a ocorrência terminou. A criança foi encaminhada para um hospital e o traficante foi indiciado por tentativa de homicídio, cárcere privado e resistência. “Ontem entramos em contato com a família e soubemos que o neném está 100% recuperado, passando bem”, finaliza o Major PM Racorti, Comandante do GATE.
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Aparentemente essa poderia ser considerada uma ocorrência simples, mas as aparências enganam. As chances de um final com mortes eram grandes e reais, seja pelo estado mental alterado do traficante, como pelas condições locais que impediam uma ação rápida e segura da Polícia Militar.
Treinamento, experiência, coragem e iniciativa para se adaptar a situações fluidas e imprevisíveis são a marca registrada dos homens do GATE, que mais uma vez salvam vidas e devolvem um bebê saudável para sua família.