Invasão ao Capitólio nos EUA, em 2021
Foto: Greenpeace USA - 06.01.2021
Invasão ao Capitólio nos EUA, em 2021

Na comissão da Câmara dos EUA que investiga o ataque ao Capitólio, no dia 6 de janeiro, e que tenta estabelecer até que ponto o ex-presidente Donald Trump é responsável pela invasão, os deputados mostraram como a falsa narrativa de uma fraude nas eleições de 2020 serviu de combustível para os atos de violência. Após o fim dos depoimentos, a comissão vai preparar um relatório sobre os meses de investigações e depoimentos, a ser apresentado em setembro, mas não há qualquer garantia de que o ex-presidente será processado.

A comissão não tem o poder de acusar criminalmente Trump — essa tarefa cabe ao Departamento de Justiça, que pode, ou não, aceitar as evidências produzidas pelos deputados, e incorporá-las em eventual processo.

Até o momento, o secretário de Justiça, Merrick Garland, evitou comentar as audiências, e prefere se referir aos mais de 800 processos abertos contra pessoas que participaram da invasão. Especialistas afirmam que alguns dos potenciais crimes cometidos por Trump — conspiração sediciosa e obstrução de um procedimento do Congresso, uma vez que a sessão interrompida pelos invasores teve objetivo de certificar a vitória de Joe Biden — são difíceis de provar porque dependem de provas incontestáveis de que o acusado tinha a intenção de cometê-los.

Há ainda o fator político: um processo contra um ex-presidente, ainda mais em um país dividido, pode inflamar ainda mais os ânimos e abrir um precedente para que processos semelhantes, até por motivos menos graves, ocorram no futuro. O próprio Trump pode questionar as provas apresentadas ao afirmar que a comissão não foi “justa”, uma vez que ele não teria tido o direito de se defender publicamente — em junho, em uma carta de 12 páginas, afirmou que a comissão foi constituída ilegalmente, e voltou a declarar que houve fraude nas eleições de 2020. Novamente, sem provas.

Veja quais foram as principais acusações contra Trump na comissão.

Tentativa de golpe de Estado

A primeira audiência serviu para mostrar que nem mesmo o círculo próximo de Trump acreditava em fraude nas eleições de 2020. Esse discurso, segundo a comissão, serviu de combustível para as cenas de violência no Capitólio, lideradas por milícias de extrema direita, como os Proud Boys, que se viam representadas pelo ex-presidente. Durante a sessão, o deputado democrata Bennie Thompson, presidente da comissão, disse que o comportamento de Trump era um sinal claro de que ele queria realizar um golpe de Estado.

Trump estava ‘desconectado da realidade’

A segunda sessão serviu para mostrar que o ex-presidente ignorou conselhos de assessores de que as acusações de fraude nas eleições não tinham qualquer base. O então secretário de Justiça, William Barr, detalhou em vídeo conversas com Trump, e depois desabafou: “Ele [Trump] está mesmo desconectado da realidade se acredita nessas coisas". Deputados sugeriram que uma das razões por trás da narrativa era dinheiro: segundo dados da campanha do republicano, foram levantados cerca de US$ 250 milhões nas semanas após as eleições.

Mike Pence como alvo principal

O terceiro dia de depoimentos mostrou como Trump usou todos os meios necessários para pressionar seu vice, Mike Pence, a aceitar a falsa narrativa de fraude eleitoral. Mas, com as negativas, passou a elevar o tom das declarações contra ele, e os deputados acreditam que o discurso agressivo contribuiu para o ataque ao Capitólio. Os relatos destacaram como Pence, que presidia a sessão do Congresso, estava vulnerável no 6 de janeiro — segundo a comissão, os invasores ficaram a pouco mais de 10 metros dele.

Fraudando o Colégio Eleitoral

Uma das estratégias de Trump para se manter no poder, como destacou a comissão no quarto dia de depoimentos, foi tentar fraudar os registros de eleitores do Colégio Eleitoral, lhe dando a vitória mesmo em estados onde foi derrotado nas urnas. Deputados estaduais relataram pressão da Casa Branca e de trumpistas nas ruas, mas se recusaram a aceitar a manobra, vista por muitos como inconstitucional. Pessoas que trabalharam nas eleições, como mesários e fiscais, também afirmaram terem sido agredidas e discriminadas.

‘Apenas diga que foi corrompida’

O quinto dia de audiências revelou a ofensiva de Trump para usar o Departamento de Justiça para legitimar suas denúncias de fraude na eleição. O então secretário de Justiça, Jeffrey Rosen, disse que o presidente exigiu que explorasse novas formas de questionar os resultados, mas, ao ser confrontado, pediu a Rosen que “apenas diga que [a eleição] foi corrompida”, e que deixasse o resto com ele. O secretário se negou, assim como outros integrantes do Departamento de Justiça.

‘Eles não estão aqui para me ferir’

A sexta sessão trouxe o bombástico depoimento de Cassidy Hutchinson, ex-assessora do chefe de Gabinete de Trump, Mark Meadows, que forneceu detalhes sobre as ações do republicano no dia 6 de janeiro. Segundo ela, o ex-presidente sabia que muitos de seus apoiadores em Washington estavam armados, mas teria dito que “eles não estão aqui para me ferir”. Ela afirmou que Trump queria se juntar aos manifestantes no Capitólio, e teria tentado tomar o controle do veículo presidencial e dirigir até lá — ele ainda teria relutado em pedir que os invasores voltassem para casa.

Protesto espontâneo, mas nem tanto

Na sétima sessão, a comissão afirmou que uma publicação de Trump no Twitter, chamando para um protesto em Washington no dia 6 de janeiro, serviu para que grupos de extrema direita se organizassem para atos violentos, e apontou para os laços entre essas milícias e integrantes do governo. Em uma revelação que pode complicar o ex-presidente criminalmente, Liz Cheney, vice-presidente da comissão, alegou que ele tentou entrar em contato com uma testemunha que ainda não foi revelada pela comissão.

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