O premier regional da Saxônia, Michael Kretschmer
Reprodução/Flickr/Stephan Röhl
O premier regional da Saxônia, Michael Kretschmer

A polícia alemã realizou buscas nesta quarta-feira após desmantelar um plano de extremistas antivacina para assassinar o premier regional da Saxônia (equivalente a governador no Brasil), Michael Kretschmer, acentuando preocupações com o radicalismo do movimento.

Segundo o recém-empossado chanceler, Olaf Scholz, o país não irá tolerar uma “minoria de extremistas desinibidos” que protesta contra as doses anti-Covid e atrapalha o combate à pandemia.

De acordo com a polícia estadual da Saxônia, buscas foram realizadas em cinco pontos na cidade de Dresden e em outra propriedade no município vizinho de Heidenau. Via Twitter, os policiais disseram que integrantes do grupo de Telegram Dresden Offlinevernetzung (rede off-line de Dresden) indicaram em conversas que teriam armas e arcos e flechas que poderiam ser usados para atos violentos — suspeitas confirmadas após a operação desta quarta.

As autoridades haviam anunciado há uma semana que investigavam “ameaças críveis” da extrema direita contra Kretschmer, cuja região tem a menor taxa de vacinação do país e um dos maiores índices de infecção. O plano, desvendado em uma reportagem da emissora pública ZDF, é diretamente relacionado às políticas públicas de combate à pandemia e a defesa que o governante faz da vacinação.

Os jornalistas do programa de televisão Frontal se infiltraram no grupo de Telegram em que os 103 integrantes compartilhavam teorias da conspiração sobre a pandemia e se organizarem contra as vacinas, o estado e as políticas públicas para conter a crise sanitária. Em mensagens de voz, alguns deles instavam as pessoas a “usarem armas, se necessário” contra Kretschmer e outros membros do seu governo.

As ameaças foram consideradas suficientemente críveis para que a unidade antiterror da polícia da Saxônia especializada em extrema direita investigasse mais a fundo. As autoridades ainda não detalharam o que foi encontrado na operação desta quarta-feira, realizada em conjunto com forças especiais, ou se houve presos.

Telegram na mira

Há apelos também para que o  Telegram seja removido das lojas de aplicativo da Apple e da Google caso continue a ignorar as solicitações para ajudar a rastrear conteúdos extremistas. A plataforma, que se apresenta como alternativa às redes sociais mais populares, diz que não se curva à "censura governamental”,  mas ainda não comentou especificamente o caso alemão.

Popular entre a oposição de países com regimes autoritários, o aplicativo vem se tornando mais popular na Alemanha conforme redes como o Facebook e o Twitter acirram seu pulso contra conteúdos violentos:

"O que está acontecendo nos grupos e canais no Telegram viola as regras da Apple e da Google", disse Boris Pistorius, ministro do Interior da Baixa Saxônia. "Nós devemos urgentemente falar com eles e persuadi-los a parar de distribuir o Telegram", completa. 

Até o momento, 69,06% dos alemães tomaram as duas doses da vacina anti-Covid, e 72,06% receberam ao menos um inoculante. Enquanto na região de Bremen mais de 85,1% da população já completou seu ciclo vacinal, na Saxônia os totalmente vacinados são apenas 59,1% — a única região que não chegou a 60%.

A operação desta quarta vem em meio à quarta onda de Covid-19 no país, que antecede a nova variante Ômicron. O pico foi no final de novembro, quando em média 58 mil alemães eram diagnosticados diariamente com a doença. Desde então, os casos caíram para 45,9 mil, número ainda assim superior aos dos surtos anteriores. A média móvel de mortes é hoje 376, e também dá sinais de queda.

A necessidade de controlar os casos, associada com as incertezas ao redor da Ômicron — que deverá ser dominante no continente europeu até o meio de janeiro, segundo estimativas da União Europeia — fez o governo anunciar no último dia 2 medidas de restrição para quem recusa as vacinas. As regras, na prática, são similares às de uma quarentena.

Violência

Quem não tomar as doses poderá apenas ter acesso ao comércio essencial, sendo barrados de bares, restaurantes ou espaços de culto e lazer, por exemplo. Também foi anunciado que o governo anunciará um projeto de lei para que a vacinação seja obrigatória para funcionários da saúde e de asilos, por exemplo, a partir de 16 de março.

Desde então, os protestos antivacina no país acirraram seu tom, com ameaças e ataques contra médicos, políticos e jornalistas. Na terça, o canal ARD relatou que mais de dez políticos, instituições públicas e veículos da imprensa receberam cartas ameaçando uma “resistência sangrenta” contra as medidas, acompanhada de um pedaço sangrento de carne.

Em setembro, um centro de vacinação da Saxônia foi incendiado, um mês depois de um grupo de ativistas antivacina protestar com tochas em frente à casa da ministra do Interior da Saxônia.

Em seu primeiro discurso ao Bundestag, o Parlamento alemão, após sua posse, o chanceler Olaf Scholz disse que há atualmente no país ”a negação da realidade, teorias de conspiração absurdas, desinformação deliberada e  extremismo violento”:

"Sejamos claros: uma pequena minoria em nosso país se separou da nossa sociedade, da nossa democracia, da nossa comunidade e do nosso Estado. Não só da ciência, mas também da racionalidade e da razão", disse o social-democrata, que tomou posse no último dia 8. "Não vamos tolerar uma minoria pequena de extremistas desinibidos que tentam forçar sua vontade ao resto da sociedade", finalizou. 

A Alemanha tem um movimento antivacina notoriamente forte: em uma entrevista ao Bild, Sebastian Fiedler, especialista em segurança do Partido Social-Democrata (SPD), estima-se que haja entre 15 mil e 20 mil opositores da vacina dispostos à violência no país. A resistência é mais forte em regiões afluentes do Sul, como a Baviera, e áreas que integravam a antiga Alemanha Oriental, como a Saxônia.

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