Os principais conselheiros do líder espiritual tibetano, o Dalai Lama , estão entre os nomes listados para serem alvo de espionagem do sistema Pegasus, revelaram nesta quinta-feira jornais do consórcio de 17 veículos globais que está liderando as investigações sobre o sofisticado equipamento desenvolvido por uma empresa de Israel.
Nesta quinta-feira, líderes europeus reagiram à possível espionagem realizada pelo sistema, que incluiu entre seus alvos jornalistas, ativistas de direitos humanos e chefes de Estado.
De acordo com reportagens publicadas no Guardian e no Le Monde, entre outros veículos, até 20 várias autoridades tibetanas no exílio, incluindo políticos e religiosos, podem ter sido espionadas por autoridades indianas.
O próprio Dalai Lama não usa telefone celular, e, portanto, não poderia figurar na lista de alvos. Ainda assim, lá estão vários oficiais tibetanos, ativistas e monges, como o terceiro monge mais graduado do budismo tibetano, Urgyen Trinley Dorji, que vive fora da Índia desde o início de 2017.
Os primeiros pedidos das autoridades da Índia foram feitos no final de 2017, quando houve em Nova Délhi um encontro entre o Dalai Lama e o ex-presidente dos Estados Unidos Barack Obama, que vinha da China. Outras inclusões na lista de alvos foram feitas em 2018, como a de Lobsang Sangay, presidente do governo tibetano no exílio, estendendo-se até maio de 2019.
Tempa Tsering, um enviado de longa data do Dalai Lama na Índia, e Tenzin Taklha e Chimmey Rigzen, assessores sêniores do líder espiritual, também estão entre os alvos.
A presença de um número na lista não indica que ele necessariamente esteve sob monitoramento, mas apenas que são pessoas marcadas para potencial vigilância, informam os veículos responsáveis pelo Projeto Pegasus. Não há como ter certeza se um número foi invadido, nem se houve tentativas de invasão, exceto se houver uma perícia forense no dispositivo móvel e em registros telefônicos.
A espionagem em potencial se relaciona às tensões periódicas entre a China e a Índia, duas potências nucleares que têm disputas fronteiriças no Himalaia. Nova Délhi dá crescente importância ao Tibet na disputa entre os países, e receava que o Dalai Lama pudesse assinar algum tipo de acordo com Pequim.
O NSO Group, dono da Pegasus, negou qualquer ligação entre esses números e as tentativas de vigilância. O grupo diz que as denúncias são distorcidas, e diz que não tem acesso aos números espionados por seus clientes. A empresa afirma que seu sistema foi desenvolvido para monitorar apenas o crime organizado e o terrorismo, e que, no caso de abusos, inspeciona retroativamente os usos feitos pelos clientes, podendo vir a suspendê-los.
Preocupação na Europa
As denúncias envolvendo abusos do sistema Pegasus — sobre o qual pairavam suspeitas há muitos anos, sem que fosse conhecida a escala de seu alcance — despertaram reações de preocupação na Europa nesta quinta-feira.
O presidente francês, Emmanuel Macron, convocou um conselho extraordinário de Defesa para discutir cibersegurança, após informações sobre seu uso na França, anunciou o porta-voz do governo Gabriel Attal. O próprio número de Macron está na lista, assim como o do ex-ministro do Meio Ambiente François de Rugy.
"O presidente acompanha de perto o tema e leva muito a sério", declarou Attal à rádio France Inter.
A chanceler da Alemanha, Angela Merkel, fez um chamado para que haja mais restrições na venda de programas de espionagem, de modo que “não terminem nas mãos das pessoas erradas”.
"[Esses sistemas] Não deveriam ser vendidos para países onde talvez não esteja garantido que a Justiça monitora as operações", declarou Merkel em entrevista coletiva.
Na Hungria, onde o governo de Viktor Orbán é acusado de espionar jornalistas e opositores, procuradores lançaram uma investigação para apurar possíveis usos ilegais do método de vigilância.
Também nesta quinta-feira, um parlamentar de Israel disse que um painel interministerial anunciado pelo governo pode buscar mudanças na política de exportação de Defesa do país.
"Certamente temos que olhar de novo para todo esse assunto das licenças concedidas pela Deca", disse Ram Ben-Barak, chefe do Comitê de Relações Exteriores e Defesa do Knesset, à Rádio do Exército de Israel, referindo-se à Agência de Controle de Exportações de Defesa (Deca), administrada pelo governo.
Não se sabe o grau de profundidade com que o governo de ex-premier Benjamin Netanyahu conhecia as atividades comerciais da Pegasus, mas vários analistas apontam que a empresa jamais poderia operar sem sua autorização.
Ben-Barak disse que a equipe do governo israelense "conduzirá suas verificações e teremos certeza de analisar as descobertas e ver se precisamos consertar as coisas aqui", disse Ben-Barak. Ex-subchefe do Mossad, ele disse que o uso adequado de Pegasus "ajudou muitas pessoas".