Argentina tem 10 vezes menos mortes por Covid-19 do que o Brasil; veja o porquê
País mostrou sucesso no controle da pandemia com quarentena rígida e investimento governamental
Por iG Último Segundo | Carlos Eduardo Vasconcellos |
Com 8,7 mortes por milhão de habitantes em decorrência da Covid-19, a Argentina mostra números quase dez vezes (9,8) menores que o Brasil, que registra 85,8 óbitos a cada um milhão de pessoas.
Até o último boletim epidemiológico divulgado pela secretaria da saúde, a Argentina contabilizava 8.809 casos confirmados e 393 mortes, Já o Brasil, conta com 271.885 infectados e 17.983 óbitos. O que explica essa diferença?
A diferença no controle da pandemia é tão notável que o país comandado por Alberto Fernández pôde flexibilizar no último dia 11, ainda que timidamente, as medidas de isolamento social praticadas no país desde 20 de março. O Brasil, enquanto isso, vive um cabo de guerra entre manter a população em casa e dar prioridade à economia. E acaba no limbo entre os dois.
É provável que um dos maiores trunfos argentinos no enfrentamento à pandemia tenha sido a ação rápida. Com apenas 128 casos confirmados e 3 mortes, foi decretada uma rígida quarentena no país.
Aulas foram suspensas; restaurantes, lojas e bares foram fechados e o acesso ao transporte público foi restrito. Para sair às ruas - exceto para ida à farmácias e mercados - só com autorização ou documentos que comprovem emergência. O país também fechou suas fronteiras e proibiu voos comerciais internos e internacionais até 1º de setembro.
Apesar da pressão de alguns setores da economia, não houve embate político
; pelo contrário, uma não-usual união entre o governo federal e a oposição contribuiu para que e a quarentena seguisse com alta adesão populacional.
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O presidente Alberto Fernández chegou a dizer que “aqueles que propõem o dilema entre economia e saúde estão dizendo algo falso”. E o dilema é justamente um dos fatores que faz o Brasil tropeçar no enfrentamento à pandemia.
Por aqui, o presidente Jair Bolsonaro vem pedindo a reabertura econômica e travando conflitos com os governadores que adotam medidas de isolamento social para evitar um alastramento no número de casos e, por consequência, superlotação do sistema de saúde e um índice ainda maior de mortes.
Para o professor e médico epidemiologista José Geraldo Leite Ribeiro, esse desalinhamento entre as autoridades desnorteia a população. "Uma das principais diretrizes do programa nacional de imunizações diz que, diante de uma crise, a população deve ser orientada por um porta-voz; ou seja, é necessário um líder , não pode haver desencontro de informações", afirma.
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"Na medida em que a população escuta orientações opostas, a tendência é que se ela se perca. A politizaçã o
é um absurdo neste momento de crise. A única vacina que temos, até o momento, é reduzir as chances de contágio. E isso significa ficar em casa, até para para evitar a crise do sistema de saúde que, se ruir, aumentará ainda mais o número de óbitos", acrescenta Ribeiro.
Economicamente, ambos os países vivem uma situação complicada. Em abril, o governo de Fernández proibiu demissões sem justa causa durante 60 dias e criou auxílios governamentais tanto para trabalhadores, quanto para empregadores. O país já gastou 700 bilhões de pesos (cerca de 60 bilhões de reais) no combate ao vírus, boa parte com suporte a pequenas e médias empresas.
Já o Brasil, disponibilizou um auxílio emergencial de R$ 600,00 a trabalhadores informais, microempreendedores individuais (MEI), autônomos e desempregados.
Embora o programa apresente falhas, como problemas no aplicativo de cadastro e atraso no pagamento, mais de 46 milhões de brasileiro já receberam a primeira parcela do benefício, segundo a Caixa Econômica Federal.
Esses aportes contribuem para a manutenção dos serviços e, por consequência, para a adesão ao isolamento social. Mesmo assim, não é possível dizer quando o Brasil poderá, com segurança, flexibilizar as restrições e fazer voltar a girar a roda da economia.
Para a viabilização, é necessário um achatamento da curva e um desafogamento do sistema de saúde, e isso só será possível com a contribuição da população, na avaliação de Ribeiro.
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"Diante da baixa adesão à quarentena, corremos o risco de ter alta incidência de infectados e óbitos por bastante tempo, o que impossibilita o desafogamento do sistema de saúde, que já está, em algumas cidades, perto do colapso", diz Ribeiro. "Um declínio significativo da curva costuma aparecer em cerca de 60 dias, como foi na Argentina. No Brasil, como sem a adesão necessária, talvez seja necessário adotar lockdown nas regiões mais críticas", finalizou o médico.