MADRI e ROMA – A crise envolvendo o navio de resgate humanitário “Open Arms” está provocando um conflito entre Itália, Espanha e a ONG responsável pela operação, de mesmo nome da embarcação. Ancorado há 18 dias ao largo da ilha italiana deLampedusa , o navio com 107imigrantes salvos enquanto tentavam cruzar o Mediterrâneo da África rumo à Europa está impedida de desembarcá-los por ordem de Matteo Salvini , ministro do Interior da Itália e líder do partido de extrema direita Liga .


No fim de semana, o governo espanhol ofereceu à Open Arms levar os imigrantes ao porto da Ilha de Maiorca, a cerca de mil quilômetros de distância. A ONG, no entanto, recusou a oferta, argumentando que as condições a bordo são precárias demais para a viagem de aproximadamente três dias, enquanto o porto de Lampedusa está a apenas 800 metros de distância.

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“Depois de 18 dias de impasse, Itália e Espanha parecem haver chegado a um acordo, identificando Maiorca como possível porto de desembarque, uma decisão que nos parece completamente incompreensível”, informou a ONG em um comunica. “Com nosso barco a 800 metros da costa de Lampedusa, os Estados europeus estão pedindo a uma pequena ONG como a nossa que enfrente três dias de navegação em condições climáticas adversas. É urgente terminar já com experiência desumana e inaceitável que estão vivendo as pessoas que resgatamos no mar”, acrescenta o texto, destacando já haver uma “grave crise psicológica a bordo”.

O governo espanhol, por sua vez, destacou que só fez a oferta diante do agravamento da crise com a “inconcebível” recusa da Itália em permitir o desembarque dos imigrantes, decisão que acusa estar em “violação da lei”.

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"(A Itália) fechou seus portos de uma maneira totalmente ilegal e incompreensível", afirmou a número dois do governo da Espanha, Carmen Calvo, que também não poupou a ONG de críticas.  "Oferecemos absolutamente tudo porque queremos que estas vidas não corram já mais risco nem mais sofrimento, mas o que nos resta (a fazer)?"

Em entrevista ao jornal espanhol El País, no entanto, um porta-voz da Open Arms insistiu que a deterioração da situação a bordo após mais de duas semanas de impasse torna muito arriscada a viagem até o porto de Maiorca.

"Não aceitamos a Espanha. Não podemos pôr em perigo a segurança e a integridade física dos imigrantes e da tripulação", disse o representante da organização ao El País. "Necessitamos desembarcar já. Estamos vivendo uma situação de ansiedade muito forte e com brigas, e isso influi negativamente na segurança, com o que a situação se tornou difícil, porque não podemos nos afastar da costa em condições de segurança com estas pessoas a bordo."

Na semana passada, o primeiro-ministro da Itália, Giuseppe Conte, anunciou ter chegado a acordo com seis países europeus - França, Alemanha, Espanha, Romênia, Croácia e Luxemburgo – para receber os imigrantes e acusou Salvini de provocar o impasse com fins eleitorais . O líder de extrema direita italiano insiste em manter a política de “portos fechados” de olho em uma eventual nova eleição no país após, animado com alta nas pesquisas de opinião, praticamente implodir a atual coalizão de governo com os populistas do Movimento Cinco Estrelas (M5S).

Nesta segunda, Salvini voltou a defender sua ordem de proibir o desembarque.

"Por que a Open Arms não vai para a Espanha? Em 18 dias poderiam ter ido e voltado três vezes de Ibiza e Formentera (outras duas ilhas do arquipélago mediterrâneo das Baleares, do qual Maiorca é a maior delas). Estão abrindo uma batalha política", afirmou Salvini, que no sábado autorizou o desembarque de 27 menores desacompanhados que estavam no navio.

Como uma tortura

Enquanto isso, a situação da bordo do navio “Open Arms” está cada vez mais crítica. No domingo, o fundador da ONG, Óscar Camps, publicou na internet um vídeo de quatro imigrantes que saltaram do navio para tentar chegar a nado em Lampedusa antes de serem capturados e devolvidos à embarcação. Carmelo La Magra, padre em Lampedusa que trabalha com imigrantes na ilha, diz que cada dia que eles passam presos a bordo “é como estender uma tortura”.

"São jogos políticos, talvez uma demonstração de poder (de Salvini), mas o que é pior é que isso é feito às custas de pessoas pobres e vulneráveis", sentenciou o clérigo.

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