Completados 10 dias do plebiscito separatista que garantiu a vitória do "sim" pela independência da Catalunha – com 90% dos votos, segundo o governo da região –, foi chegada a 'hora da verdade' (ou não).
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Isso porque, em pronunciamento oficial feito perto das 14h desta terça-feira (10), o presidente da comunidade autônoma da Catalunha , Carles Puigdemont, falou sobre a independência da região, mas não a declarou de fato. O que ele fez foi apresentar os resultados do plebiscito e pediu pelo diálogo.
"Neste momento, apresento os resultados do referendo e assumo o mandato das pessoas para que a Catalunha se torne um Estado independente sob a forma de uma República", falou.
Puigdemont deixou claro que seu anúncio não se trataria de uma decisão pessoal, mas do resultado da vontade do governo que preside. Pediu também que a tensão na região seja reduzida.
"Vivemos um momento excepcional. Longe de ser um assunto doméstico, este é um assunto europeu. De minha parte, não esperem insultos ou chantagens. O momento é muito sério e há uma necessidade imperiosa de reduzirmos a tensão", afirmou.
No total, 2.262.424 de pessoas conseguiram participar do plebiscito que ocorreu com forte pressão policial, no dia 1º de outubro. De acordo com o porta-voz do governo catalão, Jordi Turull, 90% dos eleitores votaram "sim" pela independência
da região e 7,8% votaram "não".
Tal independência ainda é uniteral. Isso porque o governo espanhol se nega a aceitar o resultado do plebiscito realizado na ragião no início do mês de outubro. Para a Espanha, a votação foi inconstitucional.
"Estou bem ciente de que muitas pessoas estão angustiadas e assustadas pelo que aconteceu e pode acontecer. A violência gratuita e a decisão de algumas empresas de deixar a Catalunha, algo que não tem efeitos reais sobre nossa economia, são fatos que eu admito que existem. Estou enviando uma mensagem de tranquilidade para você que tem medo", disse o líder.
Puigdemont disse que quer o diálogo e que está convicto de que se nos próximos dias, se todos cumprirem com suas obrigações, o conflito entre a Catalunha e o governo espanhol pode ser resolvido sem violência.
Expectativa
Preparados para o pronunciamento, os Mossos d'Esquadra – nome da força policial catalã – reforçaram a segurança em torno do edifício legislativo, onde os partidos independentistas convocaram uma grande concentração no momento do discurso de Puigdemont .
Apesar dos dias de tensão, o líder catalão fez um discurso bastante apaziguador. Disse que haverá consequências que vão melhorar e mudar a dinâmica interna e doméstica da região e que é importante reduzir as tensões causadas pela crise separatista. Por sua parte, Puigdemont defendeu a legalidade do referendo de independência: "havia urnas, cédulas e bom-senso".
O primeiro-ministro do país, Mariano Rajoy, já prometeu tomar "todas as medidas necessárias" para barrar a secessão. Uma das alternativas de Madri é aplicar o artigo 155 da Constituição, que prevê a suspensão da autonomia catalã, a dissolução do Parlamento regional e a convocação de eleições antecipadas. Além disso, Puigdemont e outros dirigentes poderiam até ser presos por "rebelião".
Muito mais que dois lados
O discurso do líder catalão ressalta ainda que, se até o plebiscito de 1º de outubro os nacionalistas catalães se mantiveram unidos, agora há divergências entre eles.
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A prefeita de Barcelona, Ada Colau, se manifestou contra a declaração unilateral de independência, enquanto os partidos separatistas de extrema-esquerda que apoiam Puigdemont prometeram reagir caso o presidente fizesse um discurso "moderado', como o que fez.
De acordo com a Lei do Plebiscito aprovada no início de setembro, o resultado da consulta popular, quando 90% dos eleitores votaram pelo "sim", obriga o governo regional a declarar sua independência e iniciar o processo constituinte.
Oposição
Após o presidente da Catalunha, a líder da oposição, Inés Arrimadas tomou a palavra no Parlamento para atacar o plebiscito e a ideia de independência.
"É uma crônica de um golpe anunciado. Ninguém reconhece o resultado do referendo. Ninguém da Europa reconhece os resultados. Isso não é algo sobre urnas, é sobre fronteiras. Vocês são o pior do nacionalismo. São a antítese do projeto europeu", defende.
A oposicionista convidou os ouvintes a escutar Juncker e Macron, a fim de indicar que não há apoio para tal independência.
"Vocês estão sozinhos. Nenhum líder europeu os apoia. Vocês acabaram com a convivência da Catalunha. Evitam dizer que o povo catalão está unido, e não está por causa de vocês", disse. "Vocês fizeram com que as empresas saiam da Catalunha. Empobreceram os catalães", acusou.
"A maioria dos catalães acredita que a Catalunha é sua terra e a Espanha é seu país", concluiu Inés Arrimadas.
Especulações acertivas
A saída diplomática de Puigdemont pode ser uma surpresa para os mais práticos, mas estavam no radar da imprensa espanhola. O jornal La Vanguardia , publicou mais cedo que uma possibilidade seria ele anunciar a secessão, mas suspendê-la por algum tempo, enquanto busca reconhecimento internacional.
Em outro cenário, aconteceria exatamente o que se passou: o líder catalão se limitaria a comunicar oficialmente os resultados do plebiscito, o que faria Barcelona ganhar tempo, mas também aumentaria o sentimento de incerteza que já levou muitas empresas a anunciarem sua saída da região.
Se for confirmada a declaração unilateral, não resta a Rajoy, líder de um governo de minoria e impopular, outra coisa que não acionar o artigo 155 da Constituição, uma decisão que necessita do aval do Senado, onde o primeiro-ministro tem os números necessários para aprová-la.
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Contudo, uma intervenção de Madri pode fomentar o sentimento nacionalista naqueles que ainda estão em dúvida quanto ao separatismo na Catalunha.
* Com informações da Agência Ansa.