Um vídeo institucional divulgado pelo Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Rio de Janeiro (Sinepe-Rio) virou centro de uma polêmica no setor educacional nesta segunda-feira (27). No material, a entidade representante das escolas particulares da capital defende a volta às aulas e questiona a eficácia do distanciamento social, recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e pela comunidade científica internacional e adotado em todo mundo.
Com quase um minuto, o vídeo mescla imagens de adultos e crianças, em salas de aula e ao ar livre. A narradora começa falando sobre o cumprimento de protocolos e afirma que as escolas privadas estão prontas para reiniciar. O texto segue, então, com as afirmações que deram origem à polêmica: “Vimos que ciência é a vacina. Estudos só confundiram. Trancar todos em casa não é ciência. Confinar é desconhecer, é ignorar, subtrair vida, é fragilizar, debilitar, mexer com o emocional”.
O material divulgado pelo Sinepe-Rio repercutiu mal na internet, e o tom foi considerado negacionista da pandemia. A reação negativa levou a entidade a remover o vídeo das redes.
Médico e pesquisador do Instituto de Medicina Social da Uerj, Mario Robeto Dal Poz repudiou o vídeo do Sinepe-Rio. Para o especialista, o conteúdo, que nega a importância do isolamento, é mentiroso e envergonha os educadores:
"Eles ignoraram os esforços que todo o mundo está fazendo para conter a pandemia. Esse vídeo é equivalente a fake news , porque ele parte da inverdade, transmite informação falsa. Merece repulsa das comunidades científica e acadêmica".
Para o presidente do Sindicato dos Professores do Município do Rio de Janeiro e Região (Sinpro-Rio), Oswaldo Teles, o conteúdo do vídeo é grave e coloca os empresários da educação em situação delicada: "Muitos pais reclamaram, além de diretores e donos de escola que não apoiam esse posicionamento".
Segundo o biofísico e presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro ( Faperj ) Jerson Lima Silva, uma entidade que representa escolas negar a ciência é um fato surpreendente e lamentável:
"Claro que a gente sabe de toda a situação econômica, e, quando a gente fala da educação, há problemas que têm que ser enfrentados. Mas pela ciência, e não pela anticiência. Muito menos negando o que já é mais do que sabido. Todos os países que fizeram isolamento estão em uma curva descendente. O sindicato deve pedir desculpas à sociedade".
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O Sinepe-Rio não se posicionou sobre polêmica do vídeo até o fechamento desta reportagem.
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Oswaldo Teles destaca ainda que o texto do vídeo, que coloca a ciência em xeque, é incompatível com o que se espera de uma entidade que representa instituições de ensino.
A opinião é compartilhada por Claudia Costin, Diretora Geral do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), que também vê na divulgação do vídeo do Sinepe-Rio um grande erro.
"No momento em que uma instituição educacional questiona a ciência, isso é muito complicado", afirma ela.
No mesmo dia em que o vídeo viralizou, o Estado do Rio chegou à marca de 12.876 vítimas do novo coronavírus e 157.834 diagnósticos positivos desde o início da pandemia. Em 24 horas, entre domingo e segunda-feira, foram registrados 41 óbitos e 1.509 casos de Covid-19.
A capital segue liderando o ranking negativo da doença: ontem à noite, já somava 8.053 mortes e 70.370 infectados.
Os óbitos somados ao balanço da Secretaria estadual de Saúde nesta segunda-feira foram distribuídos entre Rio (30), Volta Redonda (9) e Itaboraí (2). Na Região Norte do estado e na Baixada — onde, de acordo com o pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz e do Instituto D’or Fernando Bozza, houve progressão no número de casos —, há tendência de crescimento no número de internações, com o registro de 215 novos diagnósticos entre domingo e segunda-feira.
Os nove municípios da Região Norte somaram em 24 horas 144 novos casos, liderados por Macaé (114). Entre as 14 cidades da Baixada, foram computados 71 novos casos, com destaque negativo para Mangaratiba (23) e Duque de Caxias (22).