No retorno de Game of Thrones, não se fala em mais nada na internet; assunto chegou às universidades e virou acadêmico
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No retorno de Game of Thrones, não se fala em mais nada na internet; assunto chegou às universidades e virou acadêmico

Você e seus amigos não se aguentam de ansiedade para cada episódio da sétima temporada de Game of Thrones ? Embora essa etapa da série tenha data para terminar – dia 27 de agosto —, há quem leve o fanatismo tão a sério que já o transformou em tema de pesquisa e promete dedicar semestres ou anos a estudos relacionados à série.

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Esse assunto foi abordado por uma matéria publicada na revista Time , neste mês. Afinal, por trás de toda a loucura que a série Game of Thrones (GOT) inspira, há o interesse acadêmico. Afinal, você já ouviu falar em medievalismo?

Um medievalista não é cosplayer. Ele, na realidade, é um estudioso da Idade Média. Há grupos de estudos e até mesmo cursos de graduação e pós-graduação referentes ao assunto. Hoje, com o advento da série da HBO, essas pessoas e esse campo de pesquisa estão ganhando maior relevância.

A Universidade de Harvard, inclusive, já anunciou que vai disponibilizar na sua grade curricular o curso "The Real GOT: From Modern Myths to Medieval Models" (em português, "O verdadeiro GOT: dos mitos modernos aos modelos medievais"), em que pretende explorar o mundo de ficção criado por George R.R. Martin e como ele "ecoa e adapta, assim como distorce a história e a cultura do 'mundo medieval' da Eurásia, de 400 a.C. a 1500 d.C", como indica a descrição do curso.

Além de Harvard, a Universidade de Boston, a Universidade da Califórnia e a Universidade Estadual da Virgínia também criaram cursos relacionados à Idade Média inspirados pela série.

Para a revista Times , especialistas afirmaram que GOT é a melhor ferramenta para estudos medievais e das humanidades desde o sucesso de O Senhor dos Anéis .

Além disso, tal boom não poderia acontecer em época melhor: afinal, o número de estudantes formados em humanidades caiu 8,7% entre 2012 e 2014, nos Estados Unidos. Se tal índice caiu nas Ciências Humanas, despencou no estudo específico sobre a Idade Média.

Só que nem tudo é aço valiriano

O que os medievalistas mais gostam de analisar em GOT, porém, é a diferença entre o que diz a série da HBO e o que diz a história sobre a Idade Média.

"A questão é que GOT não é medieval. É fantasia. Pode explorar alguns elementos – como os dragões –, mas a disputa pelo poder é uma coisa completamente diferente da estrutura medieval", afirmou ao iG Fábio Ulanin, mestre em literatura e crítica literária pela PUC-SP.

De acordo com o professor, a série traz uma visão distorcida da Idade Média, com valores modernos. "A obra foi escrita no século XXI. É fruto do seu tempo, dos seus valores e da sua moral", disse.

Para especialista, Game of Thrones está mais para o período do Renascimento do que para a Idade Média
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Para especialista, Game of Thrones está mais para o período do Renascimento do que para a Idade Média

"O que percebi é que Martin cria uma quase caricatura do período", explica. "Martin parte da ideia de um poder antigo, centralizado, que deve ser reconquistado. No entanto, no período medieval não havia poder centralizado, político pelo menos", alerta.

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Ou seja, na Idade Média – para a infelicidade dos fãs menos conhecedores da história real – não havia qualquer "guerra dos tronos" em busca de poder.

"Gosto mais da definição de 'fantasia' para o GOT. A mim me parece que está mais para o Renascimento do que para a Idade Média", avalia Ulanin.

A questão é que Game of Thrones não é medieval. É fantasia.

Andressa Furlan Ferreira, idealizadora do site Idade Média Brasil e pesquisadora do Núcleo de Estudos Vikings e Escandinavos (NEVE) da Universidade Federal da Paraiba (UFPB), concorda com o professor pesquisador e ressalta que não se pode tomar nada do que diz a série como verdade histórica.

"Deve-se lembrar que a série – tanto literária quanto televisiva – é fictícia, do gênero fantasia. Apesar da 'estética medieval', não se pode tomar nada do que ela passa como verdade histórica, pois nunca foi o objetivo da obra", explica.

"O que se pode fazer, no entanto, é pesquisar referências históricas e medievais no conteúdo, mas nunca alegar que a série retratou algo mal ou de forma errônea", pondera.

Uma coisa é a mão do rei, outra coisa é a mão de Jaime

Segundo pesquisadora, na Idade Média, as mulheres tinham mais poder do que sugere a série – mesmo sem nenhum dragão
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Segundo pesquisadora, na Idade Média, as mulheres tinham mais poder do que sugere a série – mesmo sem nenhum dragão

Kavita Mudan Finn, que editou uma antologia de ensaios sobre a influência da série, apontou, por exemplo, que as roupas descritas nos livros da série se assemelham muito mais às vitorianas que às da Idade Média.

Ela afirma ainda que a Europa medieval era muito mais diversificada do que Westeros, e, na época, por incrível que pareça, as mulheres tinham mais poder do que a série sugere – mesmo as que não tinham dragões.

"No período em que Martin se baseia – principalmente nos séculos XIV e XV – havia tantas mulheres fazendo coisas incríveis!", acrescenta Finn. "Essas mulheres foram pouco pesquisadas por muito anos, mas, recentemente, esse trabalho tem sido feito".

Se eu disser a alguém que sou uma medievalista, a primeira coisa que as pessoas perguntam é sobre a série

Em entrevista à Time , Paul Freedman, da Universidade de Yale, afirmou que gosta ainda de lembrar os seus alunos que a religião desempenhou, na Idade Média, um papel muito maior que o retratado em GOT.

"Se eu disser a alguém que sou uma medievalista, a primeira coisa que as pessoas perguntam é sobre a série GOT", diz Marta Cobb, Diretora de Congresso Sênior no Congresso Medieval Internacional da Universidade de Leeds. Mas a comparação não lhe causa qualquer tipo de frustração, pelo contrário: "pelo menos, isso me dá um contexto para falar sobre o que eu sei e ensinar cada vez mais", afirma.

Em outras palavras, o sucesso de Game of Thrones trouxe à tona diversas pesquisas e fez muita gente olhar com carinho e interesse para a Idade Média. No entanto, os fãs mais dedicados e os estudiosos que realmente se debruçarem sobre o medievalismo poderão notar que o passado histórico pode ser tão ou mais fascinante que a história narrada no universo de Jon Snow e Tyrion Lannister. Que tal estudar a respeito disso antes do próximo inverno chegar?

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