Série Especial sobre a Evolução do Sistema Democratico
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Série Especial sobre a Evolução do Sistema Democratico


Quem nunca ouviu uma criança dizer: "Isso é injusto!" Mas, afinal, de que justiça estamos falando? É justo que alguém receba uma enorme herança sem qualquer esforço? Que outra pessoa tenha um QI excepcionalmente alto? Ou que tenha nascido em uma região de rápido crescimento econômico, sem violência ou desastres naturais, com acesso a uma educação e saúde de qualidade? 

E quanto àqueles que, por acaso, são amigos de infância de uma pessoa que se torna poderosa? Que possuem um DNA mais adaptado ao clima local? Ou que vêm de uma família estruturada, com pais amorosos que oferecem orientação e apoio? Será justo que alguns vivam em um país com uma moeda forte e juros baixos, com fácil acesso ao oceano, rios ou terras férteis, enquanto outros enfrentam as adversidades de um deserto ou de regiões montanhosas? Então, por que nossa sociedade é tão obsessiva em relação a um tema tão utópico?

O conceito de justiça começou a se formar com o código de Hamurabi na Mesopotâmia, uma das primeiras tentativas de codificar leis e estabelecer princípios legais. No antigo Egito, foi com a deusa Maat que personificava a verdade, justiça e ordem. Na Grécia Antiga, filósofos como Platão e Aristóteles refletiram profundamente sobre o tema. Na China Antiga, o conceito também era central. O Confucionismo, por exemplo, enfatizava a importância de um comportamento justo e ético na sociedade.

Historicamente criado para organizar a sociedade por meio de processos e procedimentos, o conceito de justiça muitas vezes se confunde com a expectativa de que tais sistemas sejam inerentemente ”corretos”. A noção de uma "ordem baseada em regras" visava fornecer previsibilidade e segurança, reduzindo a volatilidade, a incerteza, a complexidade e a ambiguidade da vida cotidiana. 

No entanto, a palavra "justiça" pode ser enganosa, pois sugere uma ideia de algo determinístico e dicotômico, onde uma única verdade absoluta pode ser alcançada. Esta expectativa de uma “justiça” ímpar e verdadeira pode ser ilusória, uma vez que o objetivo principal desses sistemas é, na verdade, a criação de um ambiente de ordem e progresso, e não necessariamente a realização de uma isonomia com moral perfeita.

Como exemplo, podemos observar a justiça do trabalho. Quando juízes defendem de forma sistêmica trabalhadores como se fossem coitados contra empregadores exploradores, eles também estão dando um sinal para investidores locais e estrangeiros referente a forma que as leis são interpretadas. 

Se o resultado é evasão de capital e menores investimentos, esses mesmos funcionários perdem. Seus salários são inferiores porque a demanda por emprego é menor, a baixa entrada de capital estrangeiro reduz o poder de compra da moeda tornando todos nós mais pobres, aumentando o custo de importação, e a pressão inflacionária, prejudicando os mais vulneráveis. Novas vagas de emprego deixam de ser criadas,  menos capital está disponível para treinamento o que reduz a qualidade futura do empregado e sua receita total em vida. 

O conceito de justiça é falho pois ele lida com o desejo, mas não com o resultado. Não há dúvida que as intenções dos juízes trabalhistas são positivas e vem corrigir uma assimetria de poder entre as empresas e seus empregados, mas não seria o resultado o que realmente importa? Leis trabalhistas fortes no México não trazem americanos e também não evitam a imigração para os EUA. Então, o que verdadeiramente precisamos é de fato, ‘injustiça para todos’? É claro que não é qualquer tipo de injustiça, apenas aquela que consegue obter os melhores resultados sociais.

Em um novo judiciário em ambiente democrático e capitalista o que deve prevalecer são as evidências sobre ideologia, decisões e suas interpretações das leis. O resultado deve ser norteado pelo plano de metas nacional definido pelo conselho e o presidente nacional (veja artigos anteriores da série); esta pequena adequação dos princípios que norteiam o judiciário são uma completa reengenharia e não uma mera evolução. 

Estudantes de direito, advogados ou juízes raramente possuem conhecimento econômico, estatístico ou em sistemas dinâmicos para entender o resultado empírico de suas ações uma vez que elas se propagam na sociedade, ou seja, a médio e longo prazo. 

O que é justo em um micro-cosmos individual pode e frequentemente se torna prejudicial a nível de uma sociedade como um todo. O que é em um micro-cosmos injusto a nível individual pode e frequentemente traz melhores condições a nível global. 

Resumido pelo laureado nobel, Milton Friedman “Uma sociedade que coloca a igualdade antes da liberdade não obterá nenhuma das duas. Uma sociedade que coloca a liberdade antes da igualdade obterá mais de ambas.”

Atualmente, os sistemas judiciais sofrem com intervenções externas que comprometem a objetividade de suas decisões, além de uma falta de conhecimento específico em casos complexos. O sistema é marcado por ineficiências, e a ausência de padronização, dificultando sua transparência, interpretação e portanto seu aprimoramento. Além disso, os mecanismos para avaliar a qualidade do trabalho dos juízes são falhos, enquanto a corrupção e a desigualdade de tratamento dos litigantes permanecem desafios constantes.

Da mesma forma que sugeri mudanças na estrutura de poder para o executivo e para o legislativo, é fundamental repensar o sistema judiciário para lidar com estas gamas de desafios que estão atrasando os países democráticos e capitalistas a atingirem seu total potencial. 

Além de um novo mecanismo é fundamental saber comunicar o paradoxo oculto de nossos próprios desejos. Todos nós queremos justiça, é natural. Porém, ainda mais que justiça queremos uma vida melhor para nós, para nossos familiares, amigos e a sociedade. Quando a implantação de uma justiça cósmica leva a piora da qualidade de nossas vidas e a perspectiva futura, entendemos na pele a diferença entre teoria e prática. Ela pode até ser  importante, mas é  bem menos do que a ideia original que nos venderam.

Para acompanhar a série especial sobre a evolução do sistema democrático, leia os textos:  À Beira do ColapsoA Nova Arquitetura do Poder.

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