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"Tenho certeza que após tudo isso, faremos muito mais encontros de equipe porque a saudade nos coloca nesse lugar, de sermos mais unidos, mais empáticos", escreve Mara Gabrilli

Em tempos de isolamento social, incertezas e perdas, tenho percebido o quanto as pessoas têm encontrado maneiras diferentes para driblar a indigesta saudade.

Fiquei pensando no quanto o saudosismo pode nos colocar numa posição mais útil que somente a da saudade , aquela que nos deixa meio inertes e melancólicos. Será que não conseguimos aproveitar a pandemia para ressignificar a falta que temos de alguém ou de algo? Será que a saudade só serve para nos deixar tristes?

Em uma matéria na TV, vi que teve até um médico que se vestiu de dinossauro para conseguir ver o filho e manter as medidas de proteção , já que mascarado ele não corria riscos de infectar o pequeno. Quer gesto mais bonito e criativo para contornar a falta de um filho?

Na minha equipe mesmo chegamos a fazer reunião extrapauta só para juntar todo mundo na mesma sala virtual e matar a saudade. Tenho certeza que após tudo isso, faremos muito mais encontros de equipe porque a saudade nos coloca nesse lugar, de sermos mais unidos, mais empáticos. A saudade nos faz ter falta do melhor do outro. E isso é tão mais construtivo. É tão melhor lembrarmos-nos do melhor das pessoas e da nossa rotina. Muitas vezes não valorizamos nosso dia a dia. Agora percebemos o quão bom pode ser o barulho da cidade. E o quão bom é também o silêncio.

Você viu?

Eu, por exemplo, estou com muita saudade de andar na Lokomat. Quando voltar à minha rotina de reabilitação, ao invés de andar na máquina é capaz de terem que me segurar, para não querer voar.

Depois que perdi os movimentos, sempre tenho alguém ao meu lado para garantir que eu consiga fazer tudo. Do básico, ao mais complexo. Encaro isso como um privilégio, pois muitas pessoas com deficiência nesse país não podem ter um cuidador.

Nessa pandemia , no entanto, precisei reorganizar a agenda das pessoas que trabalham em minha casa. Isso para garantir a minha segurança e de todos os funcionários. Por ter sido diretamente atingida pela Covid-19, a casa ficou mais vazia, menos habitada e mais silenciosa, o que me permitiu pensar mais em mim por outros ângulos. A saudade desperta o autocuidado e esse é um exercício que todo mundo deveria fazer hoje e no pós-pandemia. A saudade ensina.

Quando me lembro do meu pai, por exemplo, que se foi e deixou um bocado de saudade , sigo seus exemplos: olho para o céu, aprecio o sol, as flores, alguma cor diferente na paisagem. Ele era um homem bem humorado, que encarava a vida com leveza. Para matar a saudade dele, exercito tudo isso em mim. Olho para a vida sempre esperando o melhor. Para mim e para o outro. Encontro mesmo na ausência dele o conforto para achar graça de mim mesma, rir, agradecer e aprender. Esse texto é um exemplo de tudo que extraí da saudade e do meu pai.

Espero que de alguma forma ele também te inspire.

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