Ricardo Nunes (MDB), prefeito de São Paulo
Wilson Dias/Agência Brasil - 17.03.2022
Ricardo Nunes (MDB), prefeito de São Paulo

O Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCM) investiga uma suposta pedalada fiscal cometida pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB) para cumprir o gasto mínimo com a educação em 2021. Segundo o TCM, a prefeitura assinou contratos na véspera de ano novo para conseguir atingir o mínimo de gastos com a pasta.

Para 2021, Nunes tinha R$ 13,8 bilhões do orçamento para gastar com a Secretaria da Educação. Entretanto, a prefeitura tinha gastado R$ 12,3 bilhões até dezembro do mesmo ano.

O valor corresponde a 22,7% do orçamento previsto e não atingiria o mínimo exigido pela Constituição Federal. De acordo com a Carta Magna, prefeituras e estados devem distribuir 25,2% de seus orçamentos para a Educação.

O iG obteve acesso ao relatório do TCM que aponta a assinatura de contratos que somam R$ 1,5 bilhão para atingir esse índice. Todos os acordos foram chancelados nos dias 29 e 30 de dezembro de 2021.

Nas vésperas do ano novo, a prefeitura paulistana assinou dois contratos com a SP Obras, responsável por construção de creches e obras em escolas, no valor de R$ 94 milhões. Os acordos, porém, receberam 30 notas de empenho, que elevaram o valor para R$ 1,042 bilhão em gastos.

Para contabilizar a dívida na dotação de 2021, a prefeitura classificou os contratos como "restos a pagar", o que prorroga o pagamento dos valores para os próximos anos. Entretanto, segundo aponta o TCM, nenhuma das ações foram iniciadas no ano corrente, o que não justificaria o uso da verba de 2021 para os acordos.

“Inicialmente foi identificado, conforme já constava em relatório anterior, que as ordens de início dos contratos são datadas de 04.01.22. O fato, por si só, já evidencia a impossibilidade de ter havido prestação de serviço em 2021, o que em respeito ao Regime de Competência e à luz de todos os outros conceitos já detalhados, já não justificaria o empenho por valores totais e a respectiva inscrição em Restos a Pagar”, aponta o relatório.

Segundo os técnicos do tribunal, até agosto de 2022, a prefeitura pagou apenas R$ 31,8 milhões do contrato. Outros R$ 1,010 bilhão ainda constavam como “saldo a utilizar”.

Também no dia 30 de dezembro, a gestão Nunes teria assinado outro contrato, dessa vez com uma editora, para o fornecimento do “Jornal Joca”, distribuído para estudantes do ensino fundamental da rede pública. O contrato, com vigência de 12 meses, estava avaliado em R$ 40,5 milhões.

A análise do TCM ainda aponta que a prestação do serviço aconteceu em 19 de janeiro de 2022, ou seja, o contrato não tinha validade para o orçamento do ano anterior.

“O primeiro ponto a se destacar é que, mesmo sendo um contrato com vigência de 12 meses, com cláusula condicional que torna expressa a necessidade de aferição mensal do serviço prestado, foi emitida, em 30.12.21, ou seja, para apenas dois dias de vigência, nota de empenho pelo valor total do contrato (R$ 40.594.752,00) em flagrante afronta ao Regime de Competência, ao Princípio da Anualidade e aos critérios para inscrição em Restos a Pagar”

“Infere-se, pelo apostilamento do contrato, que não houve qualquer prestação de serviço em 2021, não justificando a inscrição de despesa em Restos a Pagar”, diz o documento.

A gestão Ricardo Nunes ainda emitiu oito notas de empenho para contratos destinados ao programa de distribuição de materiais e uniformes escolares para o ano de 2022. Os valores somam R$ 411,5 milhões.

Para os técnicos do tribunal, não houve registro de despesas com o programa em 2021, por isso os valores deveriam ser pagos com a dotação prevista para o ano seguinte. Até agosto do ano passado, do valor previsto com o programa, foram pagos R$ 296,6 milhões, sendo R$ 114,9 milhões classificados em “saldo a utilizar”.

“Inicialmente, considerando que as aquisições de materiais e uniforme serão realizadas diretamente pelos responsáveis e, portanto, não houve em 2021 qualquer despesa de aquisição de materiais e uniformes pela PMSP [Prefeitura Municipal de São Paulo] para o ano de 2022, o fato, por si só, já não tornaria justificável o empenho de despesas em 2021 e, por conseguinte, restaria irregular sua respectiva inscrição em Restos a Pagar”, concluiu.

Em nota, o TCM se limitou a dizer que o caso ainda está em processo de estudos e que irá a julgamento. O tribunal lembrou que o período citado na reportagem era execepcional devido ao aperto nas contas durante a crise provocada pela Covid-19.

"Os auditores e conselheiros do TCM estão estudando e avaliando a questão dos restos a pagar na área da Educação. O tema é complexo e trata de um período onde a pandemia afetou significativamente as contas de governos no mundo todo. O processo ainda está em julgamento e o relatório da auditoria vai contribuir para a tomada de decisão dos conselheiros sobre o tema, o que só deve acontecer no ano que vem", aponta a nota.

O iG entrou em contato com a Prefeitura de São Paulo para saber detalhes dos contratos e um posicionamento de Ricardo Nunes em meio às investigações do TCM. Entretanto, o Executivo paulistano não retornou até o fechamento desta reportagem.

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