Uma mulher de 90 anos recebeu a notificação da Justiça para deixar a sua casa, onde mora há mais de três décadas, na região rural de Paraibuna (SP). A ação por reintegração de posse é movida pela CESP (Companhia Energética do Estado de São Paulo). A senhora Maria Benedicta Gaspar tem até o dia 28 para deixar a residência.
Em 1989, Maria Benedicta adquiriu um terreno pagando 400,00 cruzados novos por um alqueire (equivalente a 26.847 m²) a uma pessoa já falecida, possuindo um recibo de compra e venda. No entanto, descobriu-se que a área havia sido desapropriada nos anos 1970 e pertencia à Eletrobras na época da compra, passando para a CESP em 1991. Isso sugere que Maria pode ter sido vítima de um golpe. O terreno está situado próximo à Usina Hidrelétrica de Paraibuna.
A operadora da usina iniciou um processo judicial de reintegração de posse contra Maria, movido pela CESP em 2014. Em 2015, a Justiça ordenou uma perícia que confirmou que a propriedade estava dentro da área da empresa, reconhecendo a invasão. Em 2017, foram emitidos os primeiros mandados de reintegração. No início de julho, um oficial de justiça visitou o local e deu a Maria Benedicta um prazo de 20 dias para desocupação, sem possibilidade de recurso.
Aposentada, Maria ganha um salário mínimo por mês. Prestes a completar 91 anos em setembro, ela diz que sempre trabalhou na zona rural. Foi casada duas vezes. Ela ficou viúva em 2010 e é mãe de 11 filhos.
Dona Maria Benedicta vive hoje sozinha, mas diz que os filhos revezam para acompanhá-la na casa por conta da diabetes e pressão alta.
"Hoje a minha mãe não dorme mais. A tristeza tomou conta dela, tanto que ela não quer nem comer. Ela diz que não tem mais razão de viver. A gente diz que quer levá-la embora para a casa dos filhos, mas ela quer ficar na casa dela. Ela se sente muito mal quando as pessoas falam que ela invadiu. Ela não fala que não invadiu, que não pegou do outro, que comprou com muito sacrifício", disse Margarete Gaspar ao UOL, filha de Maria.
A família diz que determinação da Justiça é desumana e pede acordo com a CESP.
"Essa casa foi a primeira a surgir naquele lugar, onde só tinha mato. O que a família quer é que a minha mãe permaneça na terra que é dela, que comprou e pagou. Há gente construindo mansão naquela região, e eles lutando para tirar a minha mãe que mora em casa de pau a pique?! O que eles estão fazendo é desumano", protesta Margarete.
"O que a gente queria é que [a CESP] deixasse ela permanecer no local até o fim da vida dela. Já vai fazer 91 anos. Ali é uma casinha de madeira e barro, que ela mesma construiu com as próprias mãos. É um apego emocional", diz Cláudia Alves Marco, de 40 anos, neta da aposentada.
CESP não fala em acordo
A companhia diz que preza pela reintegração pacífica, mas não se manifestou sobre um possível acordo com a família da aposentada.
"A CESP, Companhia Energética de São Paulo, operadora temporária da Usina Hidrelétrica Paraibuna, informa que a reintegração de posse foi determinada pela Justiça, em trâmite na Vara Única da comarca de Paraibuna desde 2014. A CESP preza pela reintegração pacífica, com respeito aos direitos e garantias de todos os envolvidos, reafirmando seu compromisso com a responsabilidade social e ambiental, priorizando a segurança e o cumprimento das normas. O imóvel em questão foi desapropriado pela União na década de 70, para formação do reservatório da Usina Hidrelétrica Paraibuna. Portanto, está vedado o uso da propriedade pública para habitação domiciliar", diz a companhia.
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