PEC proíbe militares na ativa de participarem de eleições
Valter Campanato/Agência Brasil
PEC proíbe militares na ativa de participarem de eleições

A Polícia Federal identificou os nomes de dois militares que supostamente colaboraram na redação de uma carta redigida por oficiais da ativa, a qual pressionava o então comandante do Exército em 2022, general Marco Antônio Freire Gomes, a adotar uma postura radical frente a pedidos de golpe para manter Jair Bolsonaro (PL) na Presidência. Os documentos foram obtidos pela Folha.

Essa identificação dos militares foi realizada por meio da análise dos metadados do documento, recebido pelo tenente-coronel Mauro Cid na noite de 28 de novembro de 2022, véspera da publicação do texto.

O autor do documento foi identificado pela Polícia Federal como sendo o coronel Giovani Pasini. Alexandre Bitencourt, por sua vez, teria sido o último a fazer modificações no texto. Os investigadores afirmam tratar-se do coronel Alexandre Castilho Bitencourt da Silva.

Essas informações constam em um relatório da Polícia Federal que embasou pedidos de prisão e buscas em 8 de fevereiro, contra ex-ministros e militares suspeitos de conspirarem para um golpe de Estado, visando manter o ex-presidente no poder após a derrota para Lula (PT). 

Procurado pela Folha, Pasini não comentou sobre a autoria do manifesto. "Não quero falar sobre esse assunto", disse antes de desligar o telefone.

Pasini é um oficial de artilharia da turma formada na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) em 1997. Colegas do coronel, que preferem não se identificar, afirmam que ele passou a se dedicar ao ensino da língua portuguesa e, aos poucos, foi abandonando o caminho tradicional da artilharia para se tornar professor em colégios militares e escritor de livros.

Em 2022, ele solicitou licença do Exército para concorrer a uma vaga como deputado estadual do Rio Grande do Sul pelo partido Patriota. No entanto, não foi eleito. Após retornar à Força, optou por solicitar sua transferência para a reserva, o que foi concretizado em fevereiro de 2023, após a divulgação da carta.

Alexandre Bitencourt é também um oficial formado em 1997, pertencente à arma de infantaria. Em fevereiro de 2023, ele foi agraciado com a medalha militar de ouro com passador de ouro, uma honraria concedida aos oficiais que completam 30 anos de bons serviços prestados.

Durante aproximadamente seis meses em 2022, o coronel viveu no Chile para cursar uma pós-graduação em condução de políticas estratégicas de defesa. Após retornar ao Brasil, foi designado para uma função no Departamento-Geral de Pessoal.

Em comunicado, o Exército informou que não poderia comentar sobre o assunto devido ao inquérito estar em sigilo judicial.

"Cabe ressaltar que as informações acerca do tema serão prestadas, quando solicitadas, às autoridades competentes", completou.

Militares são proibidos por leis e regulamentos de se manifestar coletivamente, seja sobre atos de superiores ou em caráter reivindicatório ou político. 

Durante o período em que a carta circulou entre os oficiais, o Alto Comando do Exército optou por informar aos militares que haveria repercussões para aqueles que se alinhassem ao manifesto.

"Srs bom dia Alertem aos seus subordinados que a adesão a esse tipo de iniciativa é inconcebível. Eventuais adesões de militares da ativa serão tratadas, no âmbito do CMS (Comando Militar do Sul), na forma da lei, sem contemporizações", escreveu o general Fernando Soares para chefes de organizações militares.

A carta de oficiais superiores da ativa foi redigida enquanto apoiadores radicais de Bolsonaro permaneciam acampados em frente a quartéis do Exército, solicitando a intervenção das Forças Armadas contra a eleição de Lula, durante quase um mês. A Polícia Federal também indica que Bolsonaro e seus aliados estavam discutindo planos para um golpe de Estado naquela época. Tanto bolsonaristas quanto militares incentivavam o comando do Exército a adotar uma postura golpista, com ataques nas redes sociais contra generais que se opunham à ruptura democrática.

"Consideramos importante, portanto, que os Poderes e Instituições da União assumam os seus papéis constitucionais previstos em lei e em prol da pacificação política, econômica e social, especialmente para a manutenção da Garantia da Lei e da Ordem e da preservação dos poderes constitucionais, respeitando o pacto federativo previsto na regra basilar de fundação da República", dizia trecho da carta dos oficiais.

O texto ainda afirmava que os militares estão "sempre prontos para cumprir suas missões constitucionais" e que os soldados "colocam os objetivos nacionais sempre em primeiro plano, desprezando quaisquer interesses pessoais".

"Covardia, injustiça e fraqueza são os atributos mais abominados para um Soldado. Nossa nação, aquela que entrega os maiores índices de confiança às Forças Armadas, sabe que seus militares não a abandonarão."

A carta foi distribuída sem a identificação do autor, e o método de obtenção de assinaturas não permite determinar quantos oficiais da ativa endossaram o documento. Participar de manifestações conjuntas é considerado uma violação e pode resultar em sanções no Exército. Em novembro de 2022, coronéis relataram à Folha que foram abordados por colegas de farda solicitando apoio à carta.

A divulgação do texto foi uma resposta de militares após oficiais da reserva terem publicado, no fim de semana anterior, uma carta aberta aos comandantes das Forças Armadas expressando preocupação com a integridade das eleições.

"É natural e justificável que o povo brasileiro esteja se sentindo indefeso, intimidado, de mãos atadas e busque nas FFAA [Forças Armadas], os ‘reais guardiões’ de nossa Constituição, o amparo para suas preocupações e solução para suas angústias", diz trecho.

O texto ainda pede que os comandantes apoiassem ações para o "imediato restabelecimento da lei e da ordem, preservando qualquer cidadão brasileiro a liberdade individual de expressar ideias e opiniões".

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