
Estudantes autistas do curso de psicologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) foram vítimas de capacitismo no Centro de Filosofia de Ciências Humanas (CFCH), onde o curso é ofertado.
Banheiros femininos foram vandalizados com frases discriminatórias que atentam contra o direito de pessoas com autismo estudarem e exercerem a psicologia.
“Autista Psicólogo é ridículo!”, “Autista nesse curso é ridículo”, “fora autista” e “Ninguém quer ser atendido por um autista” (sic), diziam as mensagens em letras garrafais nas portas dos toaletes.

O capacitismo é o preconceito contra pessoas com deficiência (como é o caso das pessoas que têm autismo, um transtorno do neurodesenvolvimento). A ideia de que pessoas com deficiência são incapazes e inferiores àquelas sem deficiência é definida como crime punível com até cinco anos de reclusão pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência .
Quando o caso foi denunciado, a UFPE repudiou à atitude preconceituosa ocorrida em suas dependências , atestando repudiar “toda e qualquer forma de preconceito, assumindo o compromisso de uma instituição anticapacitista, antirracista e anti-homofóbica”.
“Foram encaminhadas a pintura e a limpeza dos espaços; averiguação de evidências para identificação dos responsáveis e a disponibilização do Núcleo de Acessibilidade (Nace) para atendimento e acolhimento a todos os membros da comunidade” , diz um trecho da nota.
O Diretório Acadêmico (DA) do curso de psicologia e o Coletivo de Estudantes Neurodivergentes da UFPE também emitiram uma nota oficial de repúdio às frases de cunho capacitista escritas nas portas dos banheiros.
“Gostaríamos de reforçar, que a discriminação das pessoas com deficiência, ou seja, o capacitismo, é, inclusive punida por lei. A Lei Brasileira de Inclusão, instituída em 2016, define no art. 4 que ‘toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades com as demais pessoas e não sofrerá nenhuma espécie de discriminação’. Reforçamos também, que a falta de conscientização e conhecimento a respeito do TEA [Transtorno do Espectro Autista] e outras neuroatipicidades deixa es estudantes a mercê de estigmas e preconceitos em relação ao assunto. Por isso, iremos insistir na luta para que sensibilizações sejam feitas.”
Repercussão política
O caso não ficou restrito aos muros da universidade. Após as denúncias se tornarem públicas, políticos da cidade do Recife também se manifestaram contra a discriminação às pessoas autistas. Um deles foi o vereador Marco Aurélio Filho (PRTB), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Câmara Municipal do Recife, que pediu que a reitoria da UFPE investigue o caso.
“Um curso que deveria acolher pessoas autistas, de profissionais que fazem parte do acompanhamento delas, as pessoas estão sendo capacitistas, e capacitismo é crime. Precisamos trazer isso à tona para que essa Casa tome a devida providência. A Comissão de Direitos Humanos e Cidadania [da qual ele é presidente] jamais poderia ficar omissa diante de uma denúncia nesse sentido. E eu me pergunto que tipo de profissionais são esses que estão sendo formados? Psicólogo é um dos profissionais primordiais para o acompanhamento de pessoas autistas.”
A vereadora Liana Cirne (PT), que também é advogada e foi professora do curso de direito da UFPE, declarou ter recebido a denúncia de capacitismo com “nojo e indignação”.
“Estamos tomando as medidas necessárias. Vamos fazer uma representação criminal, estamos solicitando uma audiência com o reitor da universidade e precisamos lembrar: capacitismo é crime! Não há problema algum em uma pessoa autista ser psicóloga, mas há muito problema em uma pessoa criminosa ser psicóloga ou psicólogo. É importante dizer que nós temos indícios da autoria do crime. Ele foi cometido no banheiro feminino, logo é uma autora. Temos o registro escrito, é possível identificar a letra, e vamos pedir identificação para que se encontre a pessoa responsável.”
A co-vereadora Elaine Cristina (PSOL), que é uma mãe atípica (como chamamos as mães de filhos neurodivergentes) e tem uma atuação política voltada à defesa dos direitos de pessoas com deficiência, usou suas redes sociais para exigir a identificação da(s) pessoa(s) responsável(is) pelo crime em questão.
“A universidade é um espaço de produção de conhecimentos, de saberes, de trocas e aprendizados. Infelizmente, muitas pessoas não compreendem essa importante missão e o utilizam para destilar veneno e preconceito. Foi o que aconteceu na UFPE (...) Vejam que contradição! É inconcebível que os espaços que deveriam ser acolhedores e produzir conhecimento inclusivo sejam sinônimos de capacitismo. Mensagens como essas matam sonhos e vidas todos os dias.”