Durante uma entrevista coletiva concedida na tarde desta sexta-feira (29), o ministro e novo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, negou que haja uma crise institucional entre a corte e o Congresso Nacional.
Recentemente as votações acerca do Marco Temporal para demarcação de terras indígenas , da descriminalização do porte de maconha para uso pessoal e da ADPF 442, que prevê a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação irritaram congressistas.
O Parlamento tem buscado reagir acelerando a proposição e votação de projetos que vão na contramão dos entendimentos do STF. "Pretendo dialogar com o Congresso de uma forma respeitosa e institucional, como deve ser. Sinceramente, eu diria que não há crise. O que existe, como em qualquer democracia, é a necessidade de relações institucionais fundadas no diálogo", afirmou.
O novo presidente também defendeu a nomeação de mulheres para cargos no Judiciário, parabenizando a articulação da ministra Rosa Weber, que conseguiu aprovar a medida quando estava na presidência do Supremo.
Contudo, Barroso se absteve de qualquer comentário com juízo de valor sobre a indicação que o presidente da República fará para a vaga deixada pela aposentadoria de Rosa no dia 2 de outubro.
"Eu defendo a feminilização dos tribunais de uma maneira geral. Mas, essa é uma prerrogativa do presidente [Lula]", disse Barroso. Vale destacar que Lula está sendo muito pressionado para indicar uma mulher negra, mas já afirmou que raça e gênero não estão entre seus critérios de decisão para a Suprema Corte.
Questionado sobre a “PEC do Equilíbrio” - apelido dado ao projeto que prevê a derrubada de decisões do STF pelo Legislativo - e sobre o marco temporal, Barroso disse que o Congresso pode ter a última palavra sobre a questões que não envolvam cláusulas pétreas da Constituição.
"Em não se tratando de decisão sobre cláusula pétrea, o Congresso, no fundo, é quem tem a última palavra, porque ele sempre pode produzir uma emenda constitucional, revertendo uma interpretação do STF. Se for cláusula pétrea, não pode."
Aborto
Barroso também foi perguntado sobre as críticas feitas ao STF no âmbito da votação da ação que pretende descriminalizar o aborto até a 12ª semana de gestação, questão que chegou à Corte por meio de uma ação movida pelo PSOL.
“No Direito constitucional brasileiro, não existe a possibilidade do Supremo dizer 'eu não quero julgar essa matéria porque ela é muito difícil’. Portanto, tudo que chega aqui precisa em algum momento ser julgado”, disse o ministro.
Barroso também destacou que embora haja a necessidade de responder ao questionamento, cabe ao presidente do STF - ele mesmo - decidir o momento em que a ação será apreciada.
“Esse é um assunto que talvez não esteja maduro o debate. (…) É preciso um debate mais aprofundado, é uma questão delicada, porque envolve sentimentos religiosos respeitáveis das pessoas. Na democracia, todo mundo merece respeito, mesmo quem pensa diferente da gente”, disse o ministro.
Forças Armadas
Barroso também comentou a recente decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que retirou as Forças Armadas do grupo de fiscalização das eleições. Os militares entraram na comissão de transparência em 2021, quando o ministro era presidente do TSE.
"As Forças Armadas eram fiscalizadoras das eleições desde antes da minha gestão no TSE. O que eu criei, diante das acusações injustas e falsas de fraude, foi uma comissão de transparência. Lamentavelmente, as coisas não se passaram bem ali, porque o desejo era para que contribuíssem para a transparência e para a segurança, e trabalharam para levantar desconfianças", concluiu.
Decisões monocráticas e liberdade de expressão
Barroso foi indagado sobre a apreciação de decisões monocráticas pelo Plenário do STF, com ênfase nas decisões do ministro Alexandre de Moraes que mexem no âmbito da liberdade de expressão nas redes sociais.
Em resposta, o presidente do Supremo afirmou que todas as decisões monocráticas em ações diretas são imediatamente encaminhadas ao plenário virtual para apreciação dos demais magistrados.
Contudo, Barroso enfatizou que tanto o regimento interno quanto a legislação determinam que na condução de inquéritos, as decisões são monocráticas e cabem ao relator. Essa norma, segundo o ministro, não está em debate para uma possível alteração.
Em outros termos, a legislação ampara o fato do ministro Alexandre de Moraes tomar uma série de decisões monocráticas no âmbito dos inquéritos sob sua relatoria - o que inclui investigações sobre os atos golpistas de 8 de janeiro e o inquérito das milícias digitais, por exemplo.