Os três réus acusados de assassinar e ocultar os corpos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips ficaram em silêncio perante o juiz federal que presidiu a audiência de instrução realizada na manhã desta quinta-feira (27) , em Tabatinga (AM).
Amarildo da Costa de Oliveira (Pelado); seu irmão, Oseney da Costa de Oliveira (Dos Santos), e Jefferson da Silva Lima, o Pelado da Dinha, participaram da audiência por videoconferência, já que estão presos preventivamente em penitenciárias federais de Campo Grande (MT) e Catanduvas (PR).
Antes de começar a interrogar os réus, o juiz federal Wendelson Pereira Pessoa se debruçou sobre questões processuais pendentes, como o pedido feito pela defesa para que documentos e informações reunidas em outro inquérito, que resultou no indiciamento de Ruben Dario da Silva Villar, o Colômbia, como um dos mandantes do duplo assassinato, fossem anexados ao processo a que Amarildo, Oseney e Jefferson estão respondendo.
Na ata da audiência, o juiz federal justificou sua decisão de não aceitar a “juntada” dos inquéritos afirmando que isso “apenas tumultuaria o trâmite processual”. Villar já é réu em outros dois processos judiciais.
Porte de arma
Encerrada a tentativa de ouvir os réus, o magistrado determinou que Exército e Polícia Federal (PF) sejam oficiadas para informar, em até dez dias após serem notificadas, se o indigenista Bruno Pereira tinha autorização para possuir e portar uma arma de fogo e, em caso afirmativo, de que tipo.
“Tendo em vista o depoimento de todas as testemunhas de acusação, defesa e réus do processo que afirmaram o uso de arma de fogo e possível porte por Bruno Pereira, [determino que também] seja encaminhado ofício ao Exército e à Polícia Federal para que informem se Bruno Pereira realizou a requisição para posse ou porte de arma de fogo de calibre mais potente do que a anterior […] Oficie-se para cumprimento no prazo de dez dias”, fez constar, na ata, o juiz federal.
Pessoa também concedeu prazos para que as partes apresentem suas alegações finais por escrito: dez dias para o Ministério Público Federal (MPF), cindo dias para os assistentes de acusação e dez dias para a defesa de Amarildo, Oseney e Jefferson.
Segundo o MPF, após a apresentação das alegações finais, caberá à Justiça Federal decidir se os acusados irão ou não a júri popular. Em nota, o MPF garantiu que os procuradores que cuidam do caso “cumprirão o prazo estabelecido, manifestando-se conclusivamente com a maior brevidade possível”.
Histórico
Bruno e Phillips foram mortos no dia 5 de junho de 2022, vítimas de uma emboscada, enquanto viajavam de barco pela região do Vale do Javari, no Amazonas. Localizada próxima à fronteira brasileira com o Peru e a Colômbia, a região abriga a Terra Indígena Vale do Javari, a segunda maior do país, com mais de 8,5 milhões de hectares (cada hectare corresponde, aproximadamente, às medidas de um campo de futebol oficial). A área também abriga o maior número de indígenas isolados ou de contato recente do mundo.
A dupla foi vista pela última vez enquanto se deslocava da comunidade São Rafael para a cidade de Atalaia do Norte (AM), onde se reuniria com lideranças indígenas e de comunidades ribeirinhas. Seus corpos foram resgatados dez dias depois. Eles estavam enterrados em uma área de mata fechada, a cerca de 3 quilômetros da calha do Rio Itacoaí.
Colaborador do jornal britânico The Guardian, Dom se dedicava a cobertura jornalística ambiental – incluindo os conflitos fundiários e a situação dos povos indígenas – e preparava um livro sobre a Amazônia. Pereira já tinha ocupado a Coordenação-Geral de Índios Isolados e Recém Contatados da Fundação Nacional do Índio (Funai) antes de se licenciar da fundação, sem vencimentos, e passar a trabalhar para a União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja). Por sua atuação em defesa das comunidades indígenas e da preservação do meio ambiente, recebeu diversas ameaças de morte.
Identificados e detidos, Amarildo, Jefferson e Oseney foram denunciados por assassinar e ocultar os cadáveres das vítimas. Na denúncia, feita em julho de 2022, o MPF aponta que, inicialmente, Amarildo e Jefferson admitiram os crimes, embora, posteriormente, tenham mudado os depoimentos. Ainda assim, para os procuradores, “os elementos colhidos no curso das apurações apontam que o homicídio de Bruno teria correlação com suas atividades em defesa da coletividade indígena. Dom, por sua vez, foi executado para garantir a ocultação e impunidade do crime cometido contra Bruno”.